Entendendo Deus
Aqueles que concordam conosco podem não estar certos, mas admiramos a sua astúcia.
- Cullen Hightower
A compreensão judaica de Deus é relativamente concreta, apesar das grandes diferenças entre o Judaísmo ortodoxo, conservador, reformista e hassídico noutros assuntos. Em todo o Judaísmo, a Unicidade de Deus continua a ser o principal atributo do Criador, seguido por muitos outros, incluindo a justiça, o amor, a misericórdia,
a omnisciência,
a omnipresença,
a omnipotência,
a soberania,
a verdade,
a sabedoria,
a auto-existência,
a bondade, a santidade, a eternidade e um conceito ainda mais complicado do infinito. Além disso, os judeus consideram Deus como incompreensível, pois os atributos de Deus transcendem os da Sua criação.
Os atributos de Deus judaicos transitam para definições
cristãs também, embora a Unicidade de Deus tenha sofrido na transformação do monoteísmo estrito da era apostólica ao misticismo da Trindade. Saindo de um canto está o entendimento trinitário de três entidades n‟Uma só
– um conceito repudiado por desafios unitários. Na verdade, como poderiam substâncias com polaridades opostas
(ou seja, a mortalidade/imortalidade; com início/sem princípio; mutável/imutável, etc.) possivelmente existir numa entidade?
Por que é queJesus Cristo atribuiu as suas obras milagrosas exclusivamente a Deus e não a qualquer divindade própria, se ele era, de fato, um parceiro na divindade?
E por que é que ele testemunhou ter recebido os seus dons de Deus se ele e o Criador são coiguais?
(Para versículos relevantes, veja João 3:35, 5:19-23, 5:26-27, 10:25, 13:3, 14:10, Atos 2:33, 2 Pedro 1:17, Apo.2:26 -27.) A doutrina de Deus ser três, no entanto, Um, isto é, três-em-Um, faz jus ao seu rótulo de mistério religioso. Embora muitos professem crença, ninguém consegue explicar em termos que um cético saudável possa entender.
A luta para explicar como “a criatura” pode possivelmente comparar-se ao Criador é deveras antiga, assim como os outros mistérios da fé trinitária. Deixando tais questões de lado, a imagem cristã mais comum de Deus é o “homem grande no céu”, muito parecida com a representação de idoso, de barba branca e vestes fluídas
preservada no afresco de Michelangelo no teto da Capela Sistina. O fato de que esta imagem não é nada diferente da antiga representação grega de Zeus não passou despercebido, e muitos se opõem, e não apenas com base no segundo mandamento (que proíbe “nada que se assemelhe ao que existe lá em cima, nos céus, ou embaixo na terra, ou mesmo nas águas que estão debaixo da terra.” Êxodo 20: 4-5) Então, se não com base no segundo mandamento, porque é que mais alguém se deveria opor?
Bem, será que a passagem bíblica afirmando que Deus criou o homem “à Nossa imagem, conforme a Nossa semelhança” significa que Deus criou o homem para se parecer com Ele, ou para ter domínio sobre a criação mundana, semelhante à forma como Deus tem domínio sobre toda a criação, nós incluídos?
O último é o contexto em que este versículo foi revelado, pois o versículo completo lê: “Então Deus determinou: „Façamos o ser humano à Nossa imagem, de acordo com a Nossa semelhança. Dominem eles sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os grandes animais e todas as feras da terra, e sobre todos os pequenos seres viventes que se movem rente ao chão!‟”
(Gênesis 1:26).
Este versículo não lê, “à Nossa imagem, conforme a nossa semelhança; deixe-o ter olhos e um nariz, uma boca e orelhas...
” Não, ele fala do domínio, não da aparência física. Não uma, mas duas vezes, pois nos versículos
seguintes Deus disse à humanidade, “Sede férteis e multiplicai-vos! Povoai e sujeitai toda a terra; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todo o animal que rasteja sobre a terra!”
(Génesis 1:28). Então, como devemos retratar Deus? De acordo com ambos o segundo mandamento e os versículos acima, não o devemos fazer de todo. Pois, não só Deus nos ordena a não o fazer, mas não fazemos qualquer ideia de como Ele se parece em primeiro lugar. Da mesma forma, a afirmação cristã de que o Deus do Antigo Testamento se arrependeu e mudou de um Deus severo e irado para o Deus amoroso e de perdão do Novo Testamento não é universalmente aceita. Na verdade, muitos consideram este conceito desmentido tanto pela escritura
– “Deus não é homem, para que minta; nem filho do homem, para que se arrependa. Porventura, tendo ele dito, não o fará? ou, havendo falado, não o cumprirá?” (Números 23:19) – como pelo senso comum. O entendimento islâmico de Deus é mais simples, e é semelhante à compreensão judaica em muitos aspetos. Os elementos críticos do credo islâmico descansam sobre a palavra Tawhid, que define a Unicidade de Deus, afirma os Seus muitos nomes e atributos exclusivos, e orienta as pessoas a falar e a agir de uma maneira agradável a Deus.
De acordo com a religião islâmica, Deus é Um em essência, eterno e absoluto. Ele vive, é autossuficiente, omnisciente, todo-poderoso. Ele não tem necessidade de nada, mas todos têm necessidade d‟Ele. Ele não gera, e não é gerado. Ele é “o Primeiro”, sem começo, “o Último”, sem fim, e Ele não tem parceiros ou compartícipes na divindade. Allah é “o Predominante”, acima de Quem não há ninguém. Ele é “o Omnisciente”, perfeito em conhecimento, compreendendo todas as coisas grandes e pequenas, aparentes e ocultas, e “o infinitamente Sábio”, livre de erros de julgamento. Ele é “o Compassivo”, “o Misericordioso”, cuja misericórdia abrange toda a criação. No entanto, enquanto Deus ama e recompensa a crença e piedade, Ele odeia a impiedade e pune a transgressão.
Sendo “o Onipotente”, o Seu poder é absoluto, e ninguém pode frustrar o Seu decreto. Muitos outros nomes característicos são dados no Alcorão Sagrado, como Allah sendo o Senhor e Mestre da criação: a humanidade ter sido criada por meio da Sua vontade e viver, morrer, e voltar para Ele no Dia do Juízo de acordo com o Seu decreto. Os muçulmanos reconhecem ainda que Allah está para além da compreensão completa humana, pois não há nada na criação comparável a Ele. Talvez na vida após a morte seremos dotados de maior compreensão, mas nesta vida, a compreensão quanto ao nosso Criador está dentro dos
limites da revelação. Semelhante ao Judaísmo, mas ao contrário do Cristianismo, não há representações físicas de Allah no Islam. Consequentemente, as mentes dos crentes não estão confusas com imagens antropomórficas do “homem grande no céu”. Além disso, a religião islâmica não atribui género a Deus, porque Deus é entendido como sendo transcendentalmente acima de todas essas características.
A atribuição de características sexuais é considerada especialmente ofensiva, blasfema até, para os muçulmanos. Assim, enquanto Ele é referido com o pronome masculino no Alcorão, isso nada mais é do que uma necessidade linguística, pois não há pronome neutro em termos de género na língua árabe. Embora Senhor, Deus, Criador e Mestre Ele seja, em nenhum lugar no Islam é Allah referido como “Pai”. O entendimento islâmico de Deus encontra uma série de acusações no Ocidente predominantemente cristão. A primeira é que o Islam reconhece Jesus como um profeta, mas não como um “filho de Deus”, e especialmente não num sentido “gerado, não feito”. A segunda é que o Islam ensina a Unicidade de Deus e condena o conceito da Trindade. A terceira objeção é que os muçulmanos não acreditam que a humanidade herdou o peso do pecado original, pois este conceito não é compatível com a justiça e misericórdia de Deus.
A última é que os muçulmanos acreditam que Jesus foi ressuscitado e salvo da crucificação, o que invalida as doutrinas da expiação e ressurreição. Estas diferenças de crença são significativas, pois elas constituem as principais linhas de falhas, onde as plataformas continentais do Cristianismo e do Islam colidem.