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1 – PARA A LUA


A noção, muito difundida em nossos dias, é que, satélite da Terra, ela


gira em torno desta com uma periodicidade de vinte e nove dias. É preciso,


no entanto, propor uma correção à circularidade absoluta da órbita, porque a


astronomia moderna lhe dá uma certa excentricidade, de forma que a distância


Terra-Lua, avaliada em 384.000 km, não é senão uma distância média.


Vimos mais acima que o Alcorão punha em relevo, pata a medida do


tempo, a utilidade da observação dos movimentos da Lua (Capítulo 10, Versículo


5, citado no início deste capítulo).


Muitas vezes, criticou-se esse sistema de cálculo como arcaico, não prático,


anticientífi co, em relação ao nosso sistema, fundado sobre a rotação da Terra


em torno do Sol, que se expressa, em nossa época, no calendário Juliano.


Esta crítica provoca duas observações:


a) O Alcorão se endereçava, há perto de catorze séculos, aos habitantes


da Península Arábica, que tinham em uso o cálculo lunar do tempo. Era conveniente


lhes assegurar a única linguagem que eles podiam compreender e de


não os perturbar em seus hábitos, na tomada de referências espaciais que, em


suma, eram plenamente efi cazes. Sabemos que os homens do deserto são afeitos


a observações do céu, à orientação de acordo com as estrelas e à marcação do


tempo de acordo com as fases da Lua, meios mais simples e mais seguros para


eles.


b) Postos à parte os especialistas destas questões, ignora-se, geralmente,


a perfeita correspondência que existe entre o calendário Juliano e o calendário


lunar: 235 meses lunares correspondem exatamente a 19 anos Julianos de 365


dias e um quarto; a duração dos nossos anos de 365 dias não é perfeita porque


tem a necessidade de ser corrigida a cada quatro anos (anos bissextos). Com o


calendário lunar, os mesmos fenômenos se repetem a cada 19 anos Julianos: é o


ciclo de Méton, astrônomo grego, que fez, no século V A.C., a descoberta da


concordância exata dos tempos solar e lunar.


2 - NO QUE CONCERNE AO SOL


A existência de uma órbita é mais difi cilmente concebível, habituados


como estamos a considerar que nosso sistema solar está organizado em torno


dele. Para compreender o versículo Alcorânico, é preciso considerar a situação


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do Sol em nossa galáxia e fazer apelo, por consequência, às noções da ciência


moderna.


Nossa galáxia compreende um número considerável de estrelas repartidas


segundo um disco - mais espesso em seu centro que na periferia. O Sol


ocupa ali uma posição distanciada do centro do disco. Como a galáxia gira


sobre si mesma, tendo como eixo seu centro, resulta que o Sol gira em torno


desse mesmo centro seguindo uma órbita circular. A astronomia moderna


calculou-lhe os elementos. O Sol foi considerado por Shapley, em 1917, distando


do centro da galáxia em 10 Kiloparsecs, ou seja, em quilômetros, aproximadamente


o número 3 seguido de 17 zeros. Para girarem completamente sobre si


mesmos, a galáxia e o Sol levam mais ou menos 250 milhões de anos e, nesse


movimento, o Sol se desloca a uma velocidade aproximada de 250 quilômetros


por segundo.


Este é o movimento orbital do Sol anunciado pelo Alcorão, há perto


de catorze séculos, cuja demonstração da existência e coordenadas são uma


aquisição da astronomia moderna.


A ALUSÃO AO DESLOCAMENTO DA LUA E DO SOL


NO ESPAÇO COM UM MOVIMENTO PRÓPRIO


Esta noção não aparece nas traduções do Alcorão feitas por homens


letrados, que, ignorantes da astronomia, traduziram a palavra árabe, exprimindo


esse deslocamento por um dos seus sentidos que é “nadar”. Isto ocorre tanto


nas traduções francesas como na tradução inglesa, aliás, tão notável, de Yusuf


Ali.


A palavra árabe que faz alusão a um deslocamento com movimento


próprio é o verbo sabaha (yasba huna no texto dos dois versículos). Todos os


sentidos do verbo implicam um deslocamento, associado a um movimento próprio


do corpo que se desloca. E “nadar”, se o deslocamento tem lugar na água;


é se “deslocar” por movimento de suas próprias pernas, se o deslocamento é


terrestre. Para um deslocamento no espaço, não se vê bem como ter a ideia


implicada por esta palavra, a não ser empregada no sentido primitivo. Desta


maneira, não parece que um contrassenso foi cometido, pelas razões seguintes:


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- A Lua faz seu movimento de rotação sobre si mesma ao mesmo tempo


em que completa uma evolução em torno da Terra, isto é, em 29 dias e meio


aproximadamente, de forma que ela apresenta sempre a mesma face aos nossos


olhos;


- O Sol gira sobre si mesmo em 25 dias aproximados. Existem algumas


particularidades de rotação para o Equador e para os Polos, sobre os quais não


se insistirá aqui, mas o astro é ativo por um movimento de rotação em qualquer


circunstância.


Parece, portanto, que uma “nuance” verbal faz alusão no Alcorão aos movimentos


próprios do Sol e da Lua. Esses movimentos dos dois corpos celestes


são confi rmados pelos dados da ciência moderna e não se concebe que um


homem do século VII de nossa era - por mais sábio que fosse em sua época, o


que não era o caso de Muhammad - pudesse imaginá-los.


Costuma-se às vezes, opor a este ponto de vista certos exemplos de


grandes pensadores da Antiguidade, que incontestavelmente anunciaram certos


fatos que a ciência moderna reconheceu como exatos. Eles não podiam, aliás,


se apoiar de modo algum na dedução científi ca e procederam mais por raciocínio


fi losófi co. Apresenta-se assim constantemente o caso dos pitagóricos que


defendiam, no século VI A.C., a teoria da rotação da Terra sobre si mesma e o


movimento dos Planetas em redor do Sol, teoria que a ciência moderna confi rmará.


Fazendo-se uma aproximação com o caso dos pitagóricos, é fácil levantar


a hipótese de que Muhammad, pensador genial, teria pessoalmente imaginado o


que a ciência moderna descobriria séculos depois dele. Fazendo-se assim, esquece-


se simplesmente de citar os outros aspectos da produção intelectual desses


gênios do raciocínio fi losófi co, e de mencionar os erros de grande porte que


emanam de suas obras. É assim que não devemos esquecer que os pitagóricos


defendiam também a teoria da fi xidez do Sol no espaço, do qual eles faziam o


centro do mundo, não concebendo a organização celeste, senão em torno dele.


É comum encontrar nos grandes fi lósofos antigos uma mistura de ideias justas


e de ideias falsas sobre o universo.


A importância que conferem a tais obras humanas as concepções avançadas


que puderam conter não deve fazer esquecer os conceitos errôneos que


elas igualmente nos legaram. É exatamente isso, sob o ponto de vista da ciência,


o que os separa do Alcorão, no qual os múltiplos assuntos são colocados em


relação aos conhecimentos modernos, sem que uma única afi rmação possa ser


encontrada em contradição com o que a ciência de nossa época estabeleceu.


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A SUCESSÃO DOS DIAS E DAS NOITES


Numa época em que se considerava que a Terra era o centro do mundo


e que o Sol era móvel em relação a ela, que ser humano não teria evocado o


movimento do Sol a propósito da sucessão dos dias e das noites?


Ora, uma tal consideração não aparece no Alcorão, que trata desse assunto,


como segue:


Capítulo 7, Versículo 54:


“(Deus) ensombrece o dia com a noite, que o sucede incessantemente.”


Capítulo 36, Versículo 37:


“E também é sinal, para eles, a noite, da qual retiramos o dia, e ei-los mergulhados nas


trevas!”


Capítulo 31, Versículo 29:


“Não tens reparado, acaso, em que Deus insere a noite no dia e o dia na noite, e que


submeteu o sol e a lua, e que cada um (destes) gira em sua órbita até um término prefi xado,


e que Deus está inteirado de tudo quanto fazeis?”


- Capítulo 39, Versículo 5:


“Enrola a noite com o dia e enrola a noite com o dia e enrola o dia com a noite.”


O primeiro versículo dispensa comentários. O segundo quer dar simplesmente


uma imagem.


São principalmente o terceiro e o quarto versículos que podem apresentar


um interesse no que concerne ao processo de penetração e, sobretudo, de


enrolamento da noite sobre o dia, e do dia sobre a noite (Capítulo 39, Versículo


5).


Enrolar (Em francês, corresponde ao verbo enrouler (N.T.)) parece ser,


como na tradução de R. Blachère, a melhor maneira de traduzir em português o


verbo árabe Kawwara. A signifi cação primitiva desse verbo é enrolar em espiral


um turbante sobre a cabeça; em todos os outros sentidos, a noção de enrolamento


é conservada.


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Ora, o que se passa, na realidade, no espaço? Como os astronautas


americanos viram muito bem e fotografaram de seus veículos espaciais, em


particular a grande distância da Terra, desde a Lua, por exemplo, o Sol clareia


permanentemente (eclipses excetuados) a semiesfera terrestre colocada em face


dele enquanto a outro semiesfera permanece na obscuridade. Como a Terra gira


sobre si mesma, ao passo que a claridade fi ca fi xa, uma área iluminada em forma


de semiesfera faz, vinte e quatro horas, sua rotação em torno do Sol, enquanto


a semiesfera permanecia na obscuridade completa, durante o mesmo tempo,


o mesmo périplo. Essa ronda incessante do dia e da noite está perfeitamente


descrita pelo Alcorão. Ela é facilmente acessível em nossos dias à compreensão


humana, pois que temos a noção da fi xação (relativa) do Sol e da rotação da


Terra.


Esse processo de rolamento permanente com penetração contínua de


um setor a outro é expresso no Alcorão, como se, naquela época, já se tivesse


concebido o conhecimento da redondeza da Terra, o que evidentemente não é


o caso.


É preciso acrescentar a essas considerações sobre a sucessão dos dias


e das noites, as evocações, em alguns versos alcorânicos, sobre a pluricidade


dos orientes e dos ocidentes, cujo interesse é apenas descritivo, porque esses


fenômenos podem ser constatados pela observação mais banal. Eles são mencionados


aqui, no intuito de reproduzir, o mais completamente possível, o que


o Alcorão contém a esse respeito, por exemplo:


- No Capítulo 70, Versículo 40, a expressão: “Senhor dos Orientes e dos


Ocidentes”;


- No Capítulo 55, Versículo 17, este: “Senhor dos dois Orientes e dos


dois Ocidentes”;


- No Capítulo 43, Versículo 38, a evocação da “distância dos dois Orientes”,


imagem para expressar a imensidade de uma distância entre dois pontos.


O observador dos nascentes e dos poentes do Sol sabe bem que o Sol


se levanta em pontos diferentes do Oriente e se deita em pontos diferentes do


Ocidente, segundo as estações. As marcas tomadas a cada um dos horizontes,


defi nindo os pontos extremos, marcam dois Orientes e dois Ocidentes, entre


os quais se colocam, ao longo dos anos, os pontos intermediários. O fenômeno


descrito aqui, é, por assim dizer, banal. Mas, o que merece principalmente


chamar a atenção é o que se relaciona com os outros assuntos tratados nesse


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capítulo, em que a descrição dos fenômenos astronômicos, evocados no Alcorão,


aparece conforme as noções modernas.


D - A EVOLUÇÃO DO MUNDO CELESTE


Lembrando as ideias modernas sobre a formação do universo, é mostrada


aqui a evolução que se produziu desde a nebulosa inicial até a formação das


galáxias, das estrelas e, para o sistema solar, até o aparecimento das plantas a


partir do Sol em um certo estágio de evolução. Os dados modernos permitem


pensar que, no sistema solar e no universo mais geralmente, a evolução prossegue


ainda.


Quando temos conhecimento dessas noções, como não fazer uma aproximação


com certas afi rmações que encontramos no Alcorão, quando invocadas


as manifestações do Todo-Poderoso divino?


Em várias retomadas, o Alcorão lembra que “(Deus) submeteu o Sol e a Lua;


cada um se move até um termo fi xado”.


Encontra-se essa frase no Capítulo 13, Versículo 2; Capítulo 31, Versículo


29; Capítulo 35, Versículo 13; Capítulo 39, Versículo 5.


Mas, além disso, a ideia do termo fi xado é associada a uma ideia de lugar


de destino:


- Capítulo 36, Versículo 38:


“E o sol, que segue o seu curso até um local determinado. Tal é o decreto do Onisciente,


Poderosíssimo.”


Lugar fi xo é a tradução da palavra mustaqarr. Não há dúvida de que a


ideia de lugar preciso está ligada a essa palavra.


Como se apresenta a confrontação dessas afi rmações com os dados


estabelecidos pela ciência moderna?


O Alcorão dá ao Sol um termo evolutivo e um lugar de destino. À Lua,


ele designa também um termo. É preciso, para compreendei o sentido possível


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dessas afi rmações, lembrar os conhecimentos modernos sobre a evolução das


estrelas em geral, do Sol em particular e, por via de consequência, as formações


celestes que seguem necessariamente seu movimento no espaço, e das quais a


Lua faz parte.


O Sol é uma estrela cuja idade é estimada em aproximadamente 4 bilhões


e meio de anos pelos astrofísicos. Como para todas as estrelas, pode-se


defi nir para ele um estágio evolutivo. O Sol está atualmente, num primeiro


estágio, caracterizado pela transformação dos átomos de hidrogênio em átomos


de hélio: este estágio atual deverá, teoricamente, durar ainda 5 bilhões e meio


de anos, segundo cálculos efetuados que dão a esse primeiro estágio, para uma


estrela do tipo do Sol, uma duração total de 10 bilhões de anos. A este estágio


segue-se, como se observou para outras estrelas do mesmo tipo, um segundo


período caracterizado pelo término da transformação do hidrogênio em hélio,


tendo, por consequência, a dilatação das camadas extremas e o esfriamento do


Sol. No estágio fi nal, a luminosidade é consideravelmente diminuída e a densidade


consideravelmente elevada: é o que se observa no tipo de estrelas às quais


se deu o nome de anãs brancas.


De tudo isto o que é preciso guardar não são as datas, que não são interessantes


a não ser para dar uma estimativa aproximada do fator tempo, mas


o que ressalta, sobretudo, é a noção de uma evolução. Os dados modernos permitem


predizer que, em alguns bilhões de anos, as condições do sistema solar


não serão as de nossos dias. Como para outras estrelas das quais se registraram


as transformações até o estágio último, pode-se prever um fi m para o Sol.


O segundo versículo citado aqui (Capítulo 36, Versículo 38) evocou o


Sol, vagando para um lugar que lhe pertence.


A astronomia moderna o situa perfeitamente (e até lhe deu o nome de


Ápex solar): o sistema solar evolui, com efeito, no espaço, em direção a um ponto


situado na constelação de Hércules, na vizinhança da estrela Vega (a Lyrae),


cujas coordenadas estão bem estabelecidas; o movimento tem uma velocidade


que foi fi xada e que é da ordem de 19 quilômetros por segundo.


Todos esses dados da astronomia mereciam ser relatados a propósito


de dois versículos alcorânicos, dos quais se pode dizer que parecem concordar


perfeitamente com os dados científi cos modernos.


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A EXPANSÃO DO UNIVERSO


A expansão do universo é o fenômeno mais grandioso descoberto pela


ciência moderna. E uma noção hoje bem estabelecida; as únicas discussões versam


sobre o modelo segundo o qual ele se efetua.


Sugerida a partir da teoria da relatividade geral, a expansão do universo


tem um suporte físico nos exames do espectro das galáxias; o deslocamento


sistemático para o vermelho de seu espectro se explicaria por uma separação


das galáxias umas das outras. Assim, a extensão do universo será, sem cessar,


crescente e esta expansão será tanto mais importante quanto se distancia de


nós. As velocidades em que os corpos celestes se deslocaram nessa expansão


contínua poderiam ir de frações de velocidade da luz a valores superiores a esta.


O Versículo seguinte do Alcorão (Capítulo 51, Versículo 47), onde Deus


fala, pode ser confrontado com essas noções modernas?


“E construímos o fi rmamento (céu) com poder e perícia, e Nós o expandimos”


O céu, tradução da palavra samaa não é precisamente o mundo fora da


Terra da qual se trata?


O que foi traduzido por «nós o alargamos» é o particípio presente do


plural muusieuuna do verbo ausa’a, que signifi ca: alargar, estender, tornar mais


vasto, mais espaçoso, quando se trata de objetos.


Alguns tradutores, incapazes de compreender o sentido dessa última


palavra, dão signifi cações, que me parecem errôneas, como: “Nós somos plenos


de largueza” (R. Blachère). Outros autores adivinham a signifi cação mas não


ousam se pronunciar: Hamidullah, na tradução do Alcorão, fala do alargamento


do céu, do espaço, mas com um ponto de interrogação. E há, enfi m, aqueles que,


cercando seus comentários de opiniões científi cas autorizadas, dão a signifi cação


apontada aqui. Tal é o caso dos comentários do Muntakhab, editado pelo


Conselho Superior dos Negócios Islâmicos do Cairo; eles evocam, sem a menor


ambiguidade, a expansão do universo.


E - A CONQUISTA DO ESPAÇO


Três versículos do Alcorão merecem, deste ponto de vista, reter toda a


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nossa atenção. Um deles expressa de maneira ambígua o que caberá aos homens


realizar nesse domínio, e que eles realizarão. Nos dois outros versículos,


Deus evoca, em relação aos infi éis de Meca, a perplexidade que seria a deles, se


pudessem elevar-se ao céu, fazendo alusão a uma hipótese de que ela não será


seguida de efeito para estes últimos.


1. O primeiro versículo é o Versículo 33, do Capítulo 55:


“Ó assembleia de gênios e humanos, se sois capazes de atravessar os limites dos céus e da


terra, fazei-o! Porém, não podereis fazê-lo, sem autoridade.”


A tradução dada aqui requer alguns comentários explicativos:


a) A palavra portuguesa «se» exprime, em nossa língua, uma condição


que implica tanto uma eventualidade quanto uma hipótese realizável ou uma


hipótese não realizável. A língua árabe é capaz de graduar a condição de maneira


muito mais explícita. Há uma palavra para exprimir eventualidade (idhaa),


uma outra para exprimir hipótese realizável (in) e uma terceira para introduzir


hipótese não realizável (law). O versículo considerado trata de uma hipótese


realizável expressa por in. O Alcorão evoca, portanto, aqui, a possibilidade material


da realização concreta. Essa distinção linguística elimina de modo formal


a interpretação puramente mística que alguns quiseram dar, erradamente, a esse


versículo.


b) Deus se dirige aos espíritos (Jinn) e aos seres humanos (lns) e não a


fi guras alegóricas, essencialmente.


c) “Passar ao oposto” é a tradução do verbo nafadha, seguido da preposição


min que, segundo o dicionário de Kasimirski, signifi ca penetrar, atravessar


de ponta a ponta e sair do outro lado de um corpo (diz-se do tiro que sai pela


culatra, por exemplo).


Evoca, portanto, a penetração profunda e a saída em uma outra extremidade


das regiões consideradas.


d) O poder (sultan) que terão os homens de realizar esta empresa parece


ser um poder emanado do Todo Poderoso (Este versículo é seguido de um


convite ao reconhecimento das benfeitorias de Deus; é o assunto de todo o


capítulo.).


Não é duvidoso que esse versículo indica a possibilidade que terão os


homens, um dia, de efetuar o que nós chamamos, atualmente, talvez muito


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impropriamente, de conquista do espaço? E preciso considerar que o texto


alcorânico encara não somente a penetração através das regiões dos céus, mas


também através das regiões da Terra, isto é, a exploração das profundezas.


2. Os dois outros versículos são extraídos do Capítulo 15 (Versículos 14-


15). Deus fala aos infi éis de Meca, como o contexto dessa passagem do capítulo


indica:


“E se abríssemos uma porta para o céu, pela qual eles ascendesse, Diriam: Nossos olhos


foram ofuscados ou fomos mistifi cados!”


É a expressão de espanto diante de um espetáculo inesperado, diferente


daquele que o homem poderia imaginar.


A frase condicional é introduzida aqui pela palavra law, que exprime uma


hipótese, que não será jamais seguida de realização, para aqueles a quem essa


passagem se refere.


Nós nos encontramos, portanto, a propósito da conquista do espaço,


em presença de duas passagens do texto alcorânico do qual uma faz alusão ao


que se realizará um dia graças aos poderes que Deus dará à inteligência e ao


engenho humano e a outra evoca um acontecimento do qual não participarão


os infi éis de Meca, donde o caráter de condição que não será realizada. Mas o


acontecimento será vivido por


outros, como o primeiro versículo citado o deixe supor. Ele dá a descrição das


reações humanas, diante do espetáculo inesperado que será oferecido aos viajantes


do espaço, vistas perturbadas, impressão de estar enfeitiçado...


É exatamente assim que os astronautas viveram essa prodigiosa aventura


em 1961, data do primeiro voo humano em torno da Terra. Sabe-se, com efeito,


que, quando nos encontramos além da atmosfera terrestre, o céu não aparece


absolutamente com sua imagem de azul, oferecida aos terrestres, que é o resultado


dos fenômenos da absorção da luz solar pelas camadas da atmosfera. O


observador humano, colocado no espaço além da atmosfera terrestre, vê o céu


negro e a Terra lhe aparece envolvida em um halo de cor azulada, devido aos


mesmos fenômenos de absorção da luminosidade pela atmosfera terrestre, ao


passo que a Lua, que não tem atmosfera, aparece com suas cores próprias sobre


o fundo negro do céu. É, portanto, um espetáculo inteiramente novo que se


apresenta para o homem no espaço; espetáculo cujas fotografi as se tornaram


clássicas para os homens de nosso tempo.


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Aí, também, quando confrontamos o texto alcorânico com os dados


modernos, como não fi carmos impressionados com as exatidões encontradas?


Exatidões as quais não podemos supor que tenham sido emanadas do pensamento


de um homem que viveu há cerca de catorze séculos.


A TERRA


Como nos assuntos até aqui tratados, os versículos alcorânicos que se


relacionam com a terra estão dispersos em todo o Livro. Sua classifi cação é


difícil; esta apresentada aqui é toda Pessoal.


Para clareza da exposição, pode-se destacar, primeiramente, um certo


número de versículos que, tratando sempre de vários assuntos, têm, sobretudo,


uma conotação geral, constituindo-se igualmente como convites endereçados


aos homens para refl etir sobre a benefi cência divina com a ajuda de exemplos


apresentados.


Outros grupos de versículos podem ser isolados, referentes a assuntos


mais particulares:


- o ciclo da água e os mares;


- o relevo terrestre;


- a atmosfera terrestre.


A - VERSICULOS DE CONOTAÇÃO GERAL


Ao mesmo tempo em que oferecem argumentos que devem conduzir os


homens a meditar sobre as benfeitorias de Deus para suas criaturas, esses versículos


contêm aqui e acolá afi rmações que são interessantes para se confrontar


com os dados da ciência moderna. Mas, sob esse ponto de vista, eles são, quem


sabe, mais interessantes em vista do fato de que eles não expressam todos os


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tipos de crenças, relativos a certos fenômenos naturais que estavam em reputação


entre os homens da época da Revelação Alcorânica, crenças diversas das


quais o conhecimento científi co vai demonstrar mais tarde o caráter errôneo.


Esses versículos exprimem, de um lado, ideias simples, facilmente acessíveis


à compreensão daqueles a quem o Alcorão se dirigiu de início por razões


geográfi cas os habitantes de Meca e de Medina, os Beduínos da Península


Arábica - e, de outro lado, refl exões de ordem geral, das quais um público mais


culto, em todo os países e em todos os tempos, pode retirar ensinamentos,


desde que assuma o trabalho de refl etir; e isso é a marca da universalidade do


Alcorão.


Nenhuma classifi cação desses versículos se apresenta no Alcorão; eles


são apresentados aqui na ordem numérica dos capítulos.


- Capítulo 2, Versículo 22:


“Ele fez-vos da terra um leito, e do céu um teto, e envia do céu a água, com a qual faz


brotar os frutos para o vosso sustento. Não atribuais rivais a Deus, conscientemente.”


- Capítulo 2, Versículo 164:


“Na criação dos céus e da terra; na alteração do dia e da noite; nos navios que singram o


mar para o benefício do homem; na água que Deus envia do céu, com a qual vivifi ca a terra,


depois de haver sido árida e onde disseminou toda a espécie animal; na mudança dos ventos;


nas nuvens submetidas entre o céus e a terra, (nisso tudo) há sinais para os sensatos.”


- Capítulo 13, Versículo 3:


“Ele foi Quem dilatou a terra, na qual dispôs sólidas montanhas e rios, assim como estabeleceu


dois gêneros de todos os frutos. É Ele Quem faz o dia suceder à noite. Nisso há


sinais para aqueles que refl etem.”


- Capítulo 15, Versículos 19-21, Deus fala:


“E dilatamos a terra, em que fi xamos fi rmes montanhas, fazendo germinar tudo, comedidamente.


E nela vos proporcionamos meios de subsistência, tanto para vós como para aqueles


por cujo sustento sois responsáveis. E não existe coisa alguma cujos tesouros não estejam


em Nosso poder, e não vo-la enviamos, senão proporcionalmente.”


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- Capítulo 20, Versículos 53-54:


“Foi Ele Quem vos destinou a terra por leito, traçou-vos caminhos por ela, e envia água do


céu, com a qual faz germinar distintos pares de plantas. Comei e apascentai o vosso gado!


Em verdade, nisto há sinais para os sensatos.”


- Capítulo 27, Versículo 61:


“Ou quem fez a terra fi rme para se viver, dispôs em sua superfície rios, dotou-a de


montanhas imóveis e pôs entre as duas massas de água uma barreira? Poderá haver outra


divindade em parceria com Deus? Qual! Porém, a sua maioria é insipiente.”


Aqui Ele faz alusão à estabilidade geral da crosta terrestre. Sabemos que,


nas primeiras idades da terra, sua camada superfi cial era instável, antes de seu


esfriamento. A estabilidade da crosta terrestre não é, todavia, rigorosamente


absoluta, porque há zonas onde os tremores de terra se produzem por intermitência.


Quanto à barreira entre os dois mares, é uma imagem para marcar a


ausência de mistura das águas dos rios e das águas do mar ao nível de certos


estuários, como se verá um pouco mais adiante.


- Capítulo 67, Versículo 15:


“Ele foi Quem vos fez a terra manejável. Percorrei-a pois, por todos os seus quadrantes e


desfrutai das Suas mercês; a Ele será o retorno!”


- Capítulo 79, Versículos 30-33:


“E depois disso dilatou a terra, Da qual fez brotar a água e os pastos; E fi xou, fi rmemente,


as montanhas, Para o proveito vosso e do vosso gado.”


Em muitos desses versículos, a importância da água e a consequência


prática de sua presença sobre o solo da terra, a fertilidade do solo, é sublinhada.


A água é, certamente, nos países desérticos, o elemento número um que


condiciona a sobrevivência do homem. Mas a evocação pelo Alcorão ultrapassa


esta particularidade geográfi ca. O caráter de planeta rico em água, único no


sistema solar, segundo os melhores dados estabelecidos pelos conhecimentos


modernos, é posto em relevo. Sem água, a terra seria um astro morto como a


lua. O Alcorão dá à água o primeiro lugar na evocação dos fenômenos naturais


da terra. O ciclo da água é aí descrito com acentuada exatidão.


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B - O CICLO DA ÁGUA E DOS MARES


Quando, em nossos dias, lemos, um após outro, os versículos alcorânicos


relativos ao papel das águas na vida do homem, tudo nos parece exprimir-ideias


absolutamente evidentes. A. razão é simples: em nossa época, todos nós conhecemos,


com aproximada precisão, qual é o ciclo da água na natureza. Mas, se


levamos em consideração o que eram os diversos conceitos antigos sobre esse


assunto, percebemos que os dados alcorânicos não comportam elementos de


conceitos místicos vigentes, em cuja elaboração a especulação fi losófi ca tinha


uma parte maior que os dados da observação. Se, de uma maneira empírica65,


conseguira-se adquirir conhecimentos práticos, úteis, em escala restrita, para


melhorar a irrigação dos solos, havia, por outro lado, sobre o ciclo da água em


geral, conceitos que seriam pouco aceitáveis em nossos dias.


Dessa maneira, teria sido simples imaginar que as águas subterrâneas


pudessem provir da infi ltração das precipitações do solo. Mas citam como uma


exceção, no tempo antigo, a concepção de um certo Vitrúvio que, em Roma, no


século I.A.C., havia sustentado essa ideia. Assim, durante longos séculos, entre


os quais se situa a época da Revelação Alcorânica, os homens tinham concepções


absolutamente erradas sobre o regime das águas.


Esse seu artigo “Hidrogeologia” da Encyclopedía Universalis, dois especialistas


desses problemas, G. Gastany e B. Blavoux, fazem da questão o histórico


edifi cante que segue:


Com Thales de Milet, era, no século VII A.C., a teoria do lançamento da


água oceânica, sob o efeito dos ventos, no interior dos continentes, sua queda


sobre as terras e sua penetração no solo. Platão partilhava dessas ideias e pensava


que o retorno ao oceano se efetuava por um grande abismo, o Tártaro. Dessa


teoria, haverá numerosos adeptos até o século XVIII, com Descartes. Aristóteles


supunha que o vapor d’água do solo se condensava nas cavidades resfriadas das


montanhas e formava os lagos subterrâneos que alimentavam as fontes.


Ele será seguido por Sêneca (século I) e terá numerosos participantes


até 1877, entre os quais Volger... A primeira concepção verdadeira sobre o ciclo


d’água reaparecerá, em 1580, com Bernard Palissy, que afi rma que as águas subterrâneas


provêm das infi ltrações das águas da chuva no solo. Essa teoria será


confi rmada por E. Mariotte e por P. Perrault no século XVII.


65 - Baseado na experiência; sem caráter cien􀆡 fi co.


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Das concepções inexatas que circulavam durante a época de Muhammad,


não encontramos eco nas passagens do Alcorão que se seguem:


- Capítulo 50, Versículos 9-11:


“E66 enviamos do céu a água bendita, mediante a qual produzimos jardins e cereais para


a colheita. E também as frondosas tamareiras, cujos cachos estão carregados de frutos em


simetria, Como sustento para os servos; e fazemos reviver, com ela, (a água) uma terra


árida. Assim será a ressurreição!”


- Capítulo 23, Versículos 18-19:


“E fazemos descer, proporcionalmente, água do céu e a armazenamos na terra; mas, se


quiséssemos, poderíamos fazê-la desaparecer. E, mediante ela, criamos, para vós, jardins


de tamareiras e videiras, dos quais obtendes abundantes frutos, de que vos alimentais.”


- Capítulo 15, Versículo 22:


“E enviamos os ventos fecundantes e, então, fazemos descer água do céu, da qual vos damos


de beber e que não podeis armazenar (por muito tempo).”


Há para o último versículo duas possibilidades de interpretação. Os ventos


fecundantes podem ser considerados como fecundadores das plantas por


meio do transporte do pólen, mas pode também tratar-se de uma expressão


imaginada, evocando por analogia o papel do vento, fazendo de uma nuvem que


não dá a chuva uma nuvem liberando os aguaceiros: esse papel é frequentemente


evocado, como nos versículos seguintes:


- Capítulo 35, Versículo 9:


“E Deus é Quem envia os ventos, que movem as nuvens (que produzem chuva). Nós as


impulsionamos até a uma terra árida e, mediante elas, reavivamo-la, depois de haver sido


inerte; assim é a ressurreição!”


Notar-se-á que, na primeira parte do Versículo, o estilo é o da narração e


que, sem transição, lhe dá sequência uma declaração de Deus. Tais modifi cações


súbitas na forma do discurso são frequentes no Alcorão.


- Capítulo 30, Versículo 48:


66 - Cada vez que “Nós” aparece nos versículos do texto alcorânico citado aqui, o pronome


se aplica a Deus.


175





“Deus é Quem envia os ventos que agitam as nuvens, e as espalha no céu como Lhe apraz;


logo as fragmenta, e observas a chuva a manar delas, e quando a envia sobre quem Lhe


apraz, dentre os Seus servos, eis que se regozijam.”


- Capítulo 7, Versículo 57:


“Ele é Quem envia os ventos alvissareiros, por Sua misericórdia, portadores de densas


nuvens, que impulsiona até uma comarca árida e delas faz descer a água, mediante a qual


produzimos toda a classe de frutos. Do mesmo modo ressuscitamos os mortos, para que


mediteis.”


- Capítulo 25, Versículos 48-49:


“Ele é Quem envia os ventos alvissareiros, mercê da Sua misericórdia; e enviamos do céu


água pura, para com ela reviver uma terra árida, e com ela saciar tudo quanto temos


criado: animais e humanos.”


- Capítulo 45, Versículo 5:


“E na alternação do dia e da noite, no sustento que Deus envia do céu, mediante o que


vivifi ca a terra depois de haver sido árida, é na variação dos ventos, há sinais para os que


raciocinam.”


- Capítulo 13, Versículo 17:


“Ele faz descer a água do céu, que corre pelos vales, mesuradamente; sua corrente arrasta


uma espuma fl utuante.”


- Capítulo 67, Versículo 30: Deus ordena ao Profeta:


“Dize-lhes (ainda): Que vos parece? Se a vossa água, ao amanhecer, tivesse sido toda


absorvida (pela terra), quem faria manar água potável para vós?”


- Capítulo 39, Versículo 21:


“Não reparas, acaso, em que Deus faz descer a água do céu e a transforma, em fontes, na


terra? Logo produz, com ela, plantas multicores.”


- Capítulo 36, Versículo 34:


“Nela produzimos, pomares de tamareiras e videiras, em que brotam mananciais.”


176





A importância das fontes e de sua alimentação pela água da chuva, que é


encaminhada para elas, é considerada nos três últimos versículos. O fato merece


que nos detenhamos aqui para relembrar a predominância, na Idade Média, de


concepções como as de Aristóteles, para quem as fontes eram alimentadas por


lagos subterrâneos.


Em seu artigo “Hidrologia” da Encyclopedia Universalis, M.R. Rémeniéras,


professor da Escola Nacional do Gênio Rural das Águas e Florestas, descreve


as principais etapas da hidrologia e evoca os magnífi cos trabalhos antigos de


irrigação, em particular no Oriente Médio, notando que o empirismo ali tinha


tudo presidido, que as ideias de então procediam de concepções errôneas.


Ele prossegue: “é preciso esperar a Renascença (entre 1400 e 1600, aproximadamente),


para que os conceitos puramente fi losófi cos cedam lugar às


pesquisas fundadas sobre a observação objetiva dos fenômenos hidrológicos.


Leonardo da Vinci (1452-1519) se insurgiu contra as afi rmações de Aristóteles.


Em seu Discurso Admirável na Natureza das Águas e Fontes tanto Naturais


como Artifi ciais (Paris 1570), Bernard Palissy dá uma interpretação correta


do ciclo da água e, muito especialmente, da alimentação das fontes pelas chuvas”.


Não é muito exatamente esta última menção que nós encontramos no


Versículo 21 do Capítulo 39, indicando o caminho da água das chuvas através


das nascentes da terra?


Chuva e Granizo são objetos do Versículo 43 do Capítulo 24:


“Porventura, não reparas em como Deus impulsiona as nuvens levemente? Então as junta,


e depois as acumula? Não vês a chuva manar do seio delas? E que Ele envia massas (de


nuvens) de granizo, com que atinge quem Lhe apraz, livrando dele quem quer? Pouco falta


para que o resplendor das centelhas lhes ofusque as vistas.”


A passagem seguinte merece um comentário (Capítulo 56, Versículos 68-70):


“Haveis reparado, acaso, na água que bebeis? Sois vós, ou somente somos Nós Quem a faz


descer das nuvens? Se quiséssemos, fá-la-íamos salobra. Por que, pois, não agradeceis?”


Evocar o fato de que Deus teria podido transformar salobre uma água,


que não o é naturalmente, é uma maneira de exprimir a Onipotência Divina. É


uma outra maneira de relembrar essa mesma Onipotência, lançando ao homem


o desafi o de fazer chuva da nuvem. Mas enquanto a primeira não passa de


177





simples capricho, a segunda não seria mais uma na época moderna, em que a


técnica permitiu desencadear artifi cialmente a chuva? A capacidade dos humanos


em produzir essas precipitações estaria em oposição à afi rmação alcorânica?


Não é o caso, porque parece que é preciso levar em consideração os


limites das possibilidades do homem nesse domínio. M.A. Facy, engenheiro geral


da Meteorologia Nacional escreveu, em seu artigo “Precipitações”, da Encyclopedía


Universalis: “Não faremos cair a chuva de uma nuvem que não apresente


as características de uma nuvem precipitante ou de uma nuvem que não tenha


ainda alcançado o grau de evolução conveniente”.


O homem não pode, por consequência, senão acelerar, com o auxílio dos


meios técnicos apropriados, o processo de precipitação, cujas condições naturais


já estejam completas. Se fosse diferente, a seca não existiria na prática, o que


não é evidentemente o caso. Ser o dono da chuva e do bom tempo continua


sempre um sonho.


O homem não pode romper, à sua vontade, o ciclo estabelecido que


assegura a circulação da água na natureza, ciclo que podemos resumir como se


segue, segundo os ensinamentos da hidrologia moderna.


A irradiação calorífi ca do Sol provoca a evaporação dos oceanos e de


todas as superfícies terrestres recobertas ou embebidas d’água. O vapor d’água


assim desprendido se eleva na atmosfera e, por condensação, forma as nuvens.


Intervém, então, a ação dos ventos para deslocar, sobre as distâncias variáveis,


as nuvens assim formadas. Elas podem, ora desaparecer sem dar a chuva, ora


juntar seu volume a outros para dar maiores condensações, ora se fragmentar


para dar nascimento à chuva num certo estágio de evolução da nuvem. Com


a chuva atingindo os mares (que formam 70% da superfície do globo terrestre),


o ciclo é logo encerrado. A chuva, atingindo as terras, pode ser em parte


absorvida pelos vegetais e participação seu crescimento; estes, por sua vez, pela


sua transpiração, devolvem uma parte da água à atmosfera. Outra parte penetra


mais ou menos no solo, de onde ela pode, dirigir-se aos oceanos pelos cursos


d’água ou se infi ltrar no solo para retornar à superfície pelas fontes e outras


nascentes.


Se compararmos esses dados da hidrografi a moderna com os que ressaltam


dos numerosos versículos alcorânicos, citados nesse parágrafo, constar-se-á


a existência de uma notável concordância entre os dois.


178





OS MARES


Se, no que concerne ao ciclo da água na natureza em geral, os versículos


alcorânicos oferecem matéria para comparação com os conhecimentos modernos,


o mesmo não se dá no que concerne aos mares. Nenhuma proposição alcorânica


referente a eles convida a uma confrontação com os dados científi cos,


propriamente ditos. De outro lado, não deixa de ser necessário acentuar que


nenhuma proposição do Alcorão sobre os mares contém referências a crenças,


mitos ou superstições da época.


Um certo número de versículos, referentes aos oceanos e à navegação,


oferecem como assuntos de refl exão indícios da Onipotência divina, que


emanam de fatos da observação comum. São eles:


- Capítulo 14, Versículo 32:


“(Deus) Submeteu, para vós, os navios que, com a Sua anuência.”


- Capítulo 16, Versículo 14:


“E foi Ele Quem submeteu, para vós, o mar para que dele comêsseis carne fresca e retirásseis


certos ornamentos com que vos enfeitais. Vedes nele os navios sulcando as águas, à


procura de algo de Sua graça; quiçá sejais agradecidos.”


- Capítulo 55, Versículo 24:


“E suas são as naves, que se elevam no mar, como montanhas.”


- Capítulo 36, Versículos 41-44:


“Também é um sinal, para eles, o fato de termos levado os seus concidadãos na arca


carregada. E lhes criamos similares a ela, para navegarem. E, se quiséssemos, tê-los-íamos


afogada, e não teriam quem ouvisse os seus gritos, nem seriam salvos, A não ser com a


nossa misericórdia, como provisão, por algum tempo.”


Trata-se evidentemente aqui no navio que leva os homens sobre o mar,


como a Arca levou outrora Noé e os ocupantes do navio, e lhes permitiu atingir


a terra fi rme.


Um outro dado de observação, concernente ao mar, pode ser tirado de


todos os versículos do Alcorão que lhe são consagrados, porque ele apresenta


179





um aspecto particular. Três versículos fazem, assim, alusão a certos caracteres


dos grandes rios, quando eles desembocam nos oceanos.


E muito conhecido o fenômeno, comumente verifi cado, da não mistura


imediata das águas salgadas nos mares e das águas doces dos grandes rios.


O Alcorão o assinala, pensa-se, a propósito da embocadura do Eufrates


e do Tigre que, por sua reunião, formam, por assim dizer, um “mar” amplo de


mais de 150 quilômetros, o Chat Al Arab. No fundo do golfo, a infl uencia das


marés produz o fenômeno do refl uxo da água doce no interior das terras, assegurando


uma irrigação satisfatória. Para a boa compreensão do texto, é preciso


saber que mar, em português, apanha o sentido geral da palavra bahr que quer


dizer grande massa d’água e se aplica tanto ao oceano como aos grandes rios:


Nilo, Tigre, Eufrates, por exemplo.


Os três versículos que evocam o fenômeno são os seguintes:


- Capítulo 25, Versículo 53:


“Ele foi Quem estabeleceu as duas massas de água; uma é doce e saborosa, e a outra é salgada


e amarga, e estabeleceu entre amas uma linha divisória e uma barreira intransponível.”


- Capítulo 35, Versículo 12:


“Jamais se equipararão as duas águas, uma doce, agradável de ser bebida, e a outra, que


é salobra e amarga; porém, tanto de uma como da outra comeis carne fresca e extraís


ornamentos com que vos embelezais - e vedes nela os navios sulcando as ondas, à procura


da Sua graça, para que, quiçá, Lhe agradeçais.”


- Capítulo 55, Versículos 19-20 e 22:


“Liberam os dois mares, para que se encontrassem. Entre ambos, há uma barreira, para que


não seja ultrapassada. De ambos saem as pérolas e os corais.”


Além da evocação do fato principal, esses versículos mencionam os


recursos tirados das águas doces e das águas salgadas: o peixe, os ornamentos


indumentários: coral, pérolas. Quanto ao fenômeno da não mistura das águas


fl uviais no mar, na embocadura, é preciso saber que ele não é específi co ao Tigre


e ao Eufrates, que não são mencionados no texto, mas aos quais, pensamos, este


se refere. Os cursos d›água com forte caudal, como o Mississipi ou Yang-Tsé,


apresentam a mesma particularidade: a mistura das águas não se opera para eles


às vezes, senão longe e em alto mar.



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