Embora encontrasse a Vida Eterna mencionada no Novo Testamento, comparada com o Alcorão Sagrado, é vaga e ambígua. Não encontrei resposta à questão da morte no Judaísmo ortodoxo, porque o Talmude prega que até a pior vida é melhor que a morte. A filosofia dos meus pais era que se devia evitar contemplar o pensamento da morte e simplesmente desfrutar, o máximo possível, os prazeres que a vida tem a oferecer no momento. De acordo com eles, o propósito da vida era diversão e prazer alcançados através da autoexpressão dos talentos, amor da família, companhia agradável dos amigos combinada com estilo de vida confortável e indulgência na variedade de distrações que a América afluente pode disponibilizar em abundância. Deliberadamente cultivaram essa abordagem superficial da vida como se tivessem a garantia de sua felicidade e boa sorte contínuas. Através de experiência amarga descobri que a autoindulgência só leva à miséria e que nada importante ou valioso é realizado sem luta através de adversidade e autossacrifício. Desde minha infância sempre quis realizar coisas importantes e significativas. Acima de tudo, antes de minha morte, queria a garantia de que não tinha desperdiçado a vida em ações pecaminosas e buscas sem sentido. Toda a minha vida tem sido intensamente pensada com seriedade. Sempre detestei frivolidades, que é a característica dominante da cultura contemporânea. Meu pai uma vez me incomodou com sua convicção inabalável de que não existe nada de valor permanente porque tudo nessa era moderna aceita as tendências presentes e nos ajustamos a elas. Eu, entretanto, estava sedenta para alcançar algo que durasse para sempre. Foi no Alcorão Sagrado que aprendi que essa aspiração era possível. Nenhuma boa ação para agradar a Deus é desperdiçada ou perdida. Mesmo se a pessoa em questão nunca receber qualquer reconhecimento mundano, sua recompensa na Vida Eterna é certa. Em contrapartida, o Alcorão nos diz que os que não são guiados por considerações morais e sim por expedientes ou conformidade social, usando a liberdade para fazer o que quiserem independente do sucesso mundano e prosperidade obtidos, ou do quão entusiasticamente são capazes de abrir mão de sua curta vida terrena, serão considerados perdedores no Dia do Juízo. O Islã nos ensina que para devotarmos nossa atenção exclusiva ao cumprimento de nossos deveres com Deus e nossos semelhantes, devemos abandonar toda a vaidade e atividades inúteis que nos distraiam dessa finalidade. Esses ensinamentos do Alcorão Sagrado, tornados ainda mais explícitos pelos hadiths, eram totalmente compatíveis com meu temperamento.
P: Qual sua opinião sobre os árabes após ter se tornado muçulmana?
R: À medida que os anos passaram, minha percepção gradual foi que não foram os árabes que tornaram o Islã importante, mas o Islã fez os árabes importantes. Se não fosse pelo profeta Muhammad, que a misericórdia e bênçãos de Deus estejam sobre ele, hoje os árabes seriam um povo obscuro. E se não fosse pelo Alcorão Sagrado, a língua árabe seria igualmente insignificante, se não estivesse extinta.
P: Você vê semelhanças entre o Judaísmo e o Islã?
R: O parentesco entre o Judaísmo e o Islã é mais forte que o do Islã e o Cristianismo. O Judaísmo e o Islã compartilham o mesmo monoteísmo intransigente, a importância crucial de obediência estrita à Lei Divina como prova de nossa submissão e amor ao Criador, a rejeição ao sacerdócio, celibato e monasticismo e a incrível semelhança entre os idiomas hebraico e árabe.
No Judaísmo a religião é tão confundida com nacionalismo, que dificilmente pode-se distinguir entre os dois. O nome “Judaísmo” é derivado de Judá – uma tribo. Um judeu é um membro da tribo de Judá. Até o nome dessa religião não conota nenhuma mensagem espiritual. Um judeu não é um judeu por conta de sua crença na unicidade de Deus, mas meramente porque aconteceu de nascer em uma família de judeus. Se ele vier a se tornar um ateu veemente, não será menos “judeu” aos olhos dos outros judeus.
Tamanha corrupção com nacionalismo empobreceu espiritualmente essa religião em todos os seus aspectos. Deus não é o Deus de toda a humanidade, mas o Deus de Israel. As escrituras não são revelações de Deus para toda a raça humana, mas, primariamente, um livro de histórias judaico. Davi e Salomão (que a misericórdia e bênçãos de Deus estejam sobre eles) não são profetas plenos de Deus, mas meramente reis judeus. Com a única exceção do Yom Kippur (o Dia da Expiação judaico), os feriados e festividades celebradas pelos judeus, como Hanukkah, Purim e Pesach, têm mais significância nacional do que religiosa.
P: Você já teve a oportunidade de falar sobre o Islã a outros judeus?
R: Há um incidente em particular que realmente se destaca em minha mente quando tive a oportunidade de discutir o Islã com um cavalheiro judeu. O Dr. Shoreibah, do Centro Islâmico de Nova Iorque me apresentou a um convidado muito especial. Depois de uma oração de Juma (sexta-feira), fui ao escritório dele fazer algumas perguntas sobre o Islã, mas antes que pudesse saudá-lo com “Assalamu Alaikum”, fiquei completamente atônita e surpresa ao ver sentado diante dele um judeu chassídico ultra-ortodoxo, com peiot, chapéu preto de aba larga, um caftan de seda longo e preto e uma enorme barba. Sob seu braço havia uma cópia de um jornal ídiche, “The Daily Forward”. Ele nos disse que seu nome era Samuel Kostelwitz e que trabalhava em Nova Iorque como entalhador de diamantes. A maior parte de sua família, disse ele, morava na comunidade chassídica de Williamsburg no Brooklyn, mas também tinha muitos parentes e amigos em Israel. Nascido em uma pequena cidade romena, fugiu do terror nazista com seus pais para a América, pouco antes do início da segunda guerra mundial. Perguntei a ele o que o tinha trazido à mesquita. Ele nos contou que tinha sido afligido com uma dor intolerável desde a morte de sua mãe, cinco anos atrás. Tinha tentado encontrar conforto e consolo para sua dor na sinagoga, mas não conseguiu quando descobri que muitos dos judeus, mesmo na comunidade ultra-ortodoxa de Williamsburg, eram hipócritas descarados. Sua viagem recente a Israel o tinha deixado ainda mais profundamente desiludido. Estava chocado pela falta de religiosidade que encontrou em Israel e contou-nos que quase todos os jovens sabras, ou nascidos em Israel, eram ateus militantes. Quando viu a grande quantidade de suínos em um dos kibutzim (fazendas coletivas) que visitou, só pode exclamar horrorizado: “Porcos em um estado judeu! Nunca pensei que isso fosse possível até vir aqui! Então, quando testemunhei o tratamento brutal dos árabes inocentes em Israel, soube que não havia diferença entre os israelenses e os nazistas. Nunca, nunca em nome de Deus, eu poderia justificar esses crimes terríveis!” Então procurou o Dr. Shoreibah e contou-lhe que queria tornar-se muçulmano, mas antes de adotar passos irrevocáveis até a conversão formal, precisava ter mais conhecimento sobre o Islã. Disse que tinha adquirido alguns livros sobre gramática árabe da livraria Orientalia e estava tentando aprender o árabe sozinho. Desculpou-se conosco por seu inglês: o ídiche era sua língua materna e o hebraico, sua segunda língua. Entre si, a família e amigos falam apenas ídiche. Como seu inglês para leitura era muito pobre, não tinha acesso a boa literatura islâmica. Entretanto, com o auxílio de um dicionário estava lendo com muito esforço o livro “Introdução ao Islã” de Muhammad Hamidullah e o elogiou como o melhor livro que já tinha lido. Na presença do Dr. Shoreibah passei outra hora com o sr. Kostelwitz, comparando histórias bíblicas dos patriarcas e profetas com seus equivalentes no Alcorão Sagrado. Destaquei as inconsistências e interpolações da Bíblia, ilustrando meu ponto com a alegada bebedeira de Noé, a acusação a Davi de adultério e a Salomão de idolatria (que Deus proíba) e como o Alcorão Sagrado eleva todos esses patriarcas ao status de profetas genuínos de Deus e os absolve de todos esses crimes. Também destaquei por que foi Ismael e não Isaque que Deus ordenou a Abraão oferecer em sacrifício. Na Bíblia, Deus diz a Abraão: “Toma agora o teu filho, o teu único filho, Isaque, a quem amas, e vai-te à terra de Moriá; e oferece-o ali em holocausto...” Ismael nasceu 13 anos antes de Isaque, mas os comentadores bíblicos judeus explicam menosprezando a mãe de Ismael, Agar, como uma simples concubina e não como esposa de verdade de Abraão e, assim, dizem que Isaque era o único filho legítimo. As tradições islâmicas, entretanto, elevam Agar ao status de uma esposa plena, igual a Sara em todos os aspectos. O sr. Kostelwitz expressou sua gratidão profunda a mim por despender tanto tempo explicando a ele essas verdades. Para expressar essa gratidão, insistiu em convidar o dr. Shoreibah e eu para almoçar na delicatessen judaica kosher onde sempre ia para o almoço. O sr. Kostelwitz contou-nos que desejava mais do que qualquer coisa abraçar o Islã, mas temia não poder suportar a perseguição que teria que enfrentar, vinda de sua família e amigos. Disse a ele para pedir ajuda e força a Deus e ele prometeu fazê-lo. Quando nos deixou, senti-me privilegiada por ter fala com uma pessoa tão gentil e agradável.
P: Que impacto o Islã teve em sua vida?
R: No Islã a minha busca por valores absolutos foi satisfeita. No Islã encontrei tudo que era verdade, bom e belo e que dá sentido e direção à vida (e morte) humana; enquanto que em outras religiões a Verdade é deformada, distorcida, restrita e fragmentada. Se alguém me perguntar como soube disso, só posso responder que a minha experiência pessoal foi suficiente para me convencer. A minha aderência à fé islâmica é calma, tranquila, mas com uma convicção muito intensa. Acredito que sempre fui muçulmana no coração por temperamento, mesmo antes de saber que havia algo como o Islã. Minha conversão foi uma formalidade que não envolveu qualquer mudança radical no meu coração, mas que tornou oficial o que já pensava e ansiava por muitos anos.
Fonte: The Islamic Bulletin, San Francisco, CA 94141-0186.