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Quando ele voltou, carregava um livro grosso em uma capa brilhante.  Segurava-o gentilmente, protegido em suas mãos.  Disse-me que não era uma tradução, mas uma explicação dos significados do Nobre Alcorão[1]em inglês.  Aquilo me confundiu e reiterei que queria uma tradução.  Ele disse que era uma tradução, mas nenhuma tradução era o mesmo que o original, razão pela qual era chamada de "uma explicação do significado". 





Sem entender realmente sua linha de raciocínio, aceitei.  Passou pela minha cabeça que era melhor que nada.  Ele parecia saber o que se passava em minha mente.  Então, sendo o bom psicólogo que era, começou a passá-lo para mim, mas recuou quando estendi a mão para pegá-lo.





"Existem três - não, quatro - condições que você tem que aceitar antes que eu o dê a você", disse ele.





"Que condições?" Perguntei nervosamente.





"Primeiro, por favor não o coloque no chão ou nem mesmo em uma cadeira. Você pode acidentalmente pisar ou sentar em cima, o que é desrespeitoso com o livro sagrado." Bem, podia entender aquela condição.





"Segundo, sei que é o hábito de algumas pessoas lerem enquanto estão no banheiro." Ele estava correto.  Eu mesmo fazia isso às vezes. 





"Por quê?" Perguntei. 





"Não faça isso com o Alcorão. O lugar onde faz suas necessidades não é o lugar para lê-lo. Não deve levá-lo para o banheiro com você." Bem, podia ver onde ele estava chegando, embora achasse um pouco minucioso.  Mas estava disposto a seguir aquela condição também; qualquer coisa para consegui-lo, pensei. 





"Terceiro, sempre que parar de lê-lo, coloque-o em uma prateleira, ao invés de deixá-lo de fora. Demonstra cuidado." Sem problemas, pensei.  Mostra que os muçulmanos se preocupavam e respeitavam muito o Alcorão.





"Quarto, tente não colocar o Alcorão aberto e virado para baixo para marcar o lugar." Isso era muito estranho, pensei.





"Por quê?" Perguntei.  A pergunta estava ficando repetitiva.





"A palavra de Allah não deve ficar virada para baixo. Deve ficar para cima. Se precisar marcar o lugar, existe um marcador de fita preso a ele que você pode usar." Bem, claro! Pensei.  Deve ser pela mesma razão que a Bíblia também tem um!





"Aceito essas condições", disse em voz alta.





Ele me pediu para vir e dizer a ele como estava indo, algo a que não dei muita atenção na época e me apressei com meu prêmio.  Não podia esperar para chegar a casa e me jogar de cabeça naquele mesmo dia, especialmente porque no dia seguinte seria quarta-feira, meu último dia livre antes do final de semana saudita, que era quinta e sexta-feira.





O Catalista





Durante a semana seguinte, li o Alcorão.  Comecei do começo e li direto até o segundo capítulo.  De alguma forma esperava que o livro fosse um relato da vida do profeta dos muçulmanos, algo como o Evangelho ou os livros de Moisés na Bíblia.  Mas não era o que estava lendo. 





Desde o início, me cativou por aparentemente falar diretamente para mim.  Não havia "Deus disse "isso e aquilo" ou "O profeta disse "isso e aquilo"", como se fosse relatado por outros em referência ao que um profeta tinha dito sobre Deus ou o que um profeta tinha relatado das palavras de Deus. Na verdade, senti como se estivesse recebendo a revelação direto do próprio Deus. Ele falava direto comigo e Suas palavras impactavam diretamente meu coração.





Logo me vi chorando, à medida que me reconhecia, e a membros de minha família, nas descrições do povo do livro e de suas crenças (equivocadas) e posições obstinadas.  Até algumas das atitudes e crenças dos descrentes, hipócritas e politeístas ecoavam algumas de minhas atitudes e as atitudes das pessoas que conhecia no Ocidente.  Meu coração doía de preocupação com o destino possível de meus parentes e tremia de medo com o meu, agora incontestável, destino se continuasse no caminho que estava trilhando.





Depois de ler os primeiros capítulos grandes, Al-Baqarah[2], Ali-'Imran[3], An-Nisa[4], Al-Ma'idah[5] e Al-An'am[6], pulei parte do livro, buscando os capítulos mais curtos.  Mas mesmo os capítulos mais curtos, em torno de 60 versículos ecoavam os cinco grandes.  Entretanto, quando cheguei à parte final, os capítulos repentinamente não tinham mais que duas ou três páginas, alguns apenas uma página e meia.  E os tópicos eram agora mais restritos.





Então os capítulos cabiam em uma página ou menos que uma página, até que houvesse mais que um capítulo em cada página.  Naquele ponto um daqueles pequenos capítulos repentinamente se iluminou.





"Dize: Ele é Allah, o Único. , Deus! O Absoluto!





Não gerou e nem foi gerado.  , E ninguém é comparável a Ele!"





Esse era o coração do Alcorão o que entendi como sua Verdadeira mensagem[7].  Soava tão correto para mim.  Era assim que me sentia sobre Deus em minha própria religião inventada, apesar do que as igrejas de minha religião ensinavam sobre a divindade de Jesus e o conceito de Trindade.





A Gota d’Água





Será que os muçulmanos acreditavam em um Criador, Único, Base e Impulsionador do universo? É realmente verdade que esse Deus repudia qualquer possibilidade de procriação, de Si mesmo ou de ter sido procriado a partir de outro?  Essa religião realmente confirma o que acho que é verdadeiro? E, se sim, isso não significa que tenho um dever que negligenciei todo esse tempo?





Esses pensamentos e questões ficaram em minha mente.  Tinha que verificar com os únicos muçulmanos com quem tinha mais que um ligeiro conhecimento, dois colegas na universidade.





Parei-os nas escadas que levam ao portão principal do prédio principal.  Estavam cientes de que eu estava lendo o Alcorão e prontamente pararam, felizes por serem capazes de responder a uma pergunta que eu pudesse ter.  Desculpei-me por tomar o tempo deles e fui direto para essa maravilhosa descoberta que tinha feito.





"Estou lendo seu Livro", disse, "e encontrei um versículo que parece resumi-lo."





"Que versículo é esse?" Perguntou Isma’il Rostron, o convertido.





"Aqui. Logo no final. Diz: , "Dize: Ele é Allah, o Único.





Deus! O Absoluto!  , Não gerou e nem foi gerado.





E ninguém é comparável a Ele!"   ,"Sim, está certo", disse Islam





É tudo para o qual o livro direciona!"





"Engraçado que você diga isso", disse Jamal.  Era britânico de origens paquistanesas e muçulmano de nascimento. 





"Há uma história sobre um dos companheiros do profeta [8], transmitida até nós através das tradições do profeta, que Allah o louve." 





"Qual história?" Encorajei.





"Havia um homem, um comandante de jihad, que costumava liderar seus companheiros em oração com uma recitação. Ao concluir a parte do Alcorão depois de recitar A Abertura, ele completava com a recitação "Dize: Ele é Allah, o Único." Quando retornaram, mencionaram isso ao profeta, que Allah o louve, e ele disse "Perguntem por que ele faz isso!". As pessoas foram e perguntaram a ele e o comandante disse "Porque essa é a descrição de Allah e eu amo recitá-la." Então, quando as pessoas relataram isso a ele, o profeta, que Allah o louve, disse "Informem a ele que Allah, o Altíssimo, o ama.""





"Sério?" Perguntei, sentindo-me um pouco aturdido por essa confirmação.





"Sim," disse Jamal.  "E existe outra que diz exatamente o quanto da mensagem do Alcorão está nesse capítulo." [9]





Estava ansioso.





"Um homem ouviu outro recitando: "Dize: Ele é Allah, o Único" de novo e de novo até as primeiras horas da noite. Então, quando a manhã chegou, o homem foi para o profeta, que Allah o louve, e mencionou isso a ele como se estivesse menosprezando. O profeta, que Allah o louve, disse: "Por Aquele em Cujas Mãos está minha alma, verdadeiramente o capítulo e sua mensagem equivalem a um terço do Alcorão."





"Então, vê? Você está certo. É para o que a maior parte do Alcorão direciona", continuou ele.





Estava convencido.  Os muçulmanos realmente acreditavam nesse princípio, sem condições ou exceções e não era permitido nenhuma aproximação com a trindade ou mediadores.  Esse era O Deus com O qual podia me identificar.





"E sobre os outros terços?" Perguntei.





"Um terço consiste das histórias dos profetas e lições que aprendemos com seus exemplos."





"O que você quer dizer?"





"O que os profetas fizeram e disseram, como proclamaram a mensagem a seus povos e como interagiram com suas famílias e comunidades."





"Entendo. E a última parte?"





"São os comandos de Allah referentes a como vivemos individualmente e como comunidade", disse ele.  "Coisas como estatutos legais referentes a casamento, divórcio, educação dos filhos; purificação, oração, jejum e peregrinação; o lícito e o proibido na alimentação e interação social; lei e punição."





Decidi que precisava ir e refletir sobre as implicações.





Três condições





Acabei pensando sobre a dor no coração que sentia por minha família e decidi aguardar até que três coisas estivessem claras, antes de abraçar o Islã.





1.    Minha esposa aceitar a religião, como eu tinha feito.





2.    Concordar em deixar o emprego e vir morar comigo na Arábia Saudita.





3.    Um problema (pessoal) que houve entre nós ser superado.





Em outras palavras, prometi esperar até que todas as condições fossem ótimas e não me tornaria oficialmente um muçulmano até então.





Comecei a conversar com minha esposa sobre o que tinha descoberto.  Embora estivesse tentando não soar exagerado, meu assombro com o que tinha descoberto e meu endosso devem ter sido esmagadores.  Escrevia um e-mail atrás do outro e batíamos longos papos no msn.  Lia de maneira constante e ampla qualquer coisa sobre Islã na internet, especialmente debates de muçulmanos usando o suporte bíblico para a religião.  Meu entusiasmo pela descoberta de que o Islã era apenas uma extensão de nossa religião purificada, pode-se dizer, de seus erros, deve tê-la afetado profundamente a ponto de ela ficar desiludida e finalmente ser levada a comentar: "parece que você se converteu."





Isso me fez parar, porque percebi que já tinha dado o passo em meu coração, se não oralmente, e minha resposta refletia isso.





"De fato, sim."





Daquele momento em diante minha esposa passou a me criticar por não consultá-la antes de tomar tamanha decisão.  Minha defesa constante era de que não tinha me convertido oficialmente ainda, embora o tivesse em meu coração.  Esse argumento atrapalharam meus esforços de convertê-la e levaram a uma coabitação tensa e dolorosa nas férias que tirei naquele Natal e nos três verões seguintes.  Mas isso é outra história.





A mesquita e os órfãos





Enquanto isso, tive minha primeira experiência de orar com os muçulmanos.  Um final de semana estava caminhando de volta do centro da cidade à noite, depois de uma tarde de compras.  Tinha comprado algumas roupas "nativas" e queria experimentá-las.  De fato, estava vestindo um dos "thobes" que parecem vestidos que tinha acabado de comprar e carregando outro com minhas roupas "ocidentais" em uma mala de viagem.  O sol estava se pondo quando comecei a voltar para casa e se pôs quando estava na metade do caminho.  Soou o chamado para a oração de uma pequena mesquita da qual estava me aproximando e foi ecoado por centenas de mesquitas próximas e distantes pela cidade.  Venezianas se fechavam e bens nas ruas estavam sendo cobertos com plásticos e lonas.  Os homens começaram a fluir das lojas e casas para as mesquitas.  Era impressionante! Um chamado do minarete respondido em um instante.  Decidi que queria ver como era a oração islâmica.





Segui os retardatários quando a oração começou e observei-os se alinhar atrás de duas linhas já formadas.  Levantaram suas mãos enquanto se juntavam à linha e então as colocaram sobre seus peitos, uma sobre a outra.  Parecia bem fácil e fiquei no fim da linha.  Várias crianças se juntaram à linha depois de mim, formando um tipo de adendo interminável.  Enquanto os homens ao meu lado se curvavam e prostravam, copiei seus movimentos da melhor maneira que pude, olhando para os lados pelos cantos dos meus olhos.  Estavam indiferentes a mim, cada um concentrado em algum ponto diretamente à frente, com os olhos baixos.  A comunicação deles com Deus era palpável e tentei compartilhar do canal que tinham estabelecido, apesar de não ter as mesmas palavras para fazê-lo.





"Ó Deus! Ajude-me a cumprir meu voto e persuadir minha esposa. Guie-me a Ti e guie minha família. Acredito em Ti, o Deus único, e não em seres humanos como deuses."





Repeti a oração várias vezes, como um mantra.  Não acho que alcancei o mesmo nível de comunhão que meus companheiros, mas meu coração se sentiu melhor quando a oração acabou.  Enquanto pegava meus sapatos e meias, duas das crianças que tinham se alinhado ao meu lado se aproximaram.





"Anta Muslim? Limada tusalli? ‘adam wa’dha al yedduka al yameen ala shimal."





As crianças tinha detectado que era um completo aprendiz e tinham sérias dúvidas se eu realmente pertencia ao grupo.  Mostraram como eu devia ter posicionado minhas mãos, como devia ter me prostrado e curvado, como devia ter colocado meus pés e assim por diante.  Claro, não sabia uma palavra em árabe e apenas estava ciente de que pensaram que eu precisava de muita instrução se quisesse me passar por um membro bem intencionado da congregação.  Sinalizaram que devia segui-los para que me levassem para suas casas e me transferiram para o irmão mais velho.





Estava um pouco cauteloso de entrar, no caso de terem querido dizer para eu esperar do lado de fora, mas uma das crianças voltou quando não as segui.  Fez o sinal de "venha" novamente e então sinalizou que devia ir logo assim que entraram e cruzar uma tela de contas que estava pendurada.  Dentro estava uma sala com típicas almofadas árabes no chão.  Um adolescente, talvez 15 ou 16 anos, levantou-se de sua posição confortável para me saudar.





O irmão mais velho era muito hospitaleiro, mas não pode me ajudar a entender as crianças e o que elas queriam.  Serviu-me café árabe em pequenas xícaras e me convidou para partilhar algumas tâmaras.  Estava curioso na razão das crianças estarem me entretendo, com o irmão mais velho sendo apenas um adolescente.  Onde estavam seus pais?





"Onde estão sua mãe e seu pai?" Perguntei.





Mas ou ele não entendeu ou não conseguiu explicar em linguagem de sinais.  Gesticulou que eu devia esperar e então imaginei que estariam em casa, logo.  Entretanto, ao invés de um homem adulto, outro jovem, recém-saído da adolescência entrou, logo antes da oração da noite.  Pareceu surpreso ao me ver na sala com seu irmão e trocaram umas poucas palavras.





"Ameriki?" , Balancei minha cabeça.  "Não. Britânico."





"Bem-vindo. Café?" , Novamente balancei minha cabeça. Tinha tomado o suficiente.





Ele se levantou e indicou que devia segui-lo.  "Tawadha," disse ele, que significa "vamos fazer ablução!" Esfregou suas mãos uma na outra.  "Lavar; ir masjid."





Ele queria que me aprontasse para ir à mesquita para a oração da noite.





"Coloque mão" disse ele, levantando minha mão direita, "sobre isso!", colocando-a sobre minha mão esquerda e então colocando ambas sobre meu peito.  Estávamos caminhando pela estrada e paramos bem no meio dela para a lição, como se os carros não existissem.  Indicou a oração levantando suas duas mãos até as orelhas.  "Faça como eu!"





Alinhei-me ao lado dele e dessa vez fiz um trabalho melhor em relação aos movimentos.





Quando voltamos para casa o jantar estava servido em um tipo de toalha de mesa, no chão.  Perguntei a ele "Sua mama?"





"Mama" parece ser um meio internacional ou universal de indicar uma mãe.  Ele balançou a cabeça e depois um gesto de dormir e um movimento para baixo da palma aberta, em direção ao chão.  "Baba wa mama fiy mout, yarhamhummullah. Irmã fez."





Então eram órfãos e esse jovem e sua irmã tinham assumido a responsabilidade da família.  O inglês dele não era dos melhores e a conversa era incoerente.  Perguntou: "Você gosta do Islã?"





Disse que sim. , "Por que não é muçulmano?"





Precisava de tempo.





Ele me ofereceu uma carona para casa.  "Você precisar de ajuda, a qualquer hora visite", disse quando me deixou. , Agradeci.





Então as palavras que ouviria milhares de vezes emergiram de sua boca.  "Algum serviço?"





A gentileza daquela família órfã nunca me deixou.  Estava realmente tocado com o cuidado que tinham demonstrado e apreciei os esforços sinceros para me orientar.  Mas a pessoas que teria o maior efeito em minha iniciação foi um homem que ainda estava por entrar em cena.  Era um iraniano com green card em busca da nacionalidade americana e que estava prestes a irromper em minha vida.





Ali Jamily foi o quarto colega muçulmano "ocidental", recém-saído dos Estados Unidos.  Tinha dirigido de Jidá porque seu primeiro ato ao chegar à Arábia Saudita foi fazer uma visita à casa de Deus e circundá-la (a peregrinação menor chamada "Umrah").  Essa foi uma das características de Ali que pude conhecer bem: sua obsessão em visitar a Casa de Deus sempre que pudesse.  Estava usando óculos escuros e parecia "legal".  Uma segunda coisa que aprendi sobre ele foi sua admiração pelas normas legais e sociais americanas, que comparava de maneira favorável em relação a sua experiência com essas normas na Arábia Saudita.  Ainda assim, aquele exterior "ocidental" era o coração de alguém que amava a Deus apaixonadamente.  Logo depois de me encontrar, me perguntou se eu conhecia o Islã e disse a ele que tinha estado lendo seu livro sagrado.  Claro que seu próximo passo foi me perguntar se eu abraçaria o Islã e contei a ele sobre minhas três condições.





"Você está louco?" disse ele.  "Você não pode impor condições a Deus." Ele usou o nome para Deus com o qual já tinha começado a me familiarizar no Alcorão.  "Prostre-se agora mesmo e implore pelo perdão Dele! Se sabe que essa é a Verdade, faça sua declaração de fé agora." "Por que não deveria estipular condições?" Perguntei.  "Quero que minha família seja muçulmana também. É pedir muito?"."



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