Um dos aspectos de grandeza e perfeição da civilização islâmica é que ela não ignorou o fator estético como um valor importante na vida do homem. Ela o tratou partindo do conceito de que a sentir a beleza e se inclinar a ela é uma disposição inata enraizada nas profundezas da alma humana saudável. Tal alma que ama a beleza e se encanta com tudo que é belo e se afasta de tudo que é feio.
Sem dúvida, esta criatividade estética é uma dimensão fundamental na civilização humana. Qualquer civilização sem o elemento de beleza e e sem maneiras de expressar a beleza é uma civilização que não responder aos sentimentos humanos naturais e não satisfaz os desejos psicológicos, que se atraem por tudo que é belo.
Apresentaremos parte dos aspectos da beleza na civilização islâmica – os aspectos que formaram o quadro geral no qual se formou esta civilização, tingindo-a com perfeição e glória, bem como com a natureza humana.
As Artes Islâmicas
As artes em geral são consideradas um aspecto fundamental da cultura dominante na sociedade. E a arte islâmica, em específico, é considerada uma das mais puras e precisas formas de expressão da civilização islâmica, e também, um espelho brilhante da civilização humana, porque a arte islâmica é uma das maiores artes produzidas pelas civilizações do mundo nos tempos antigos e modernos. No entanto, ela não recebeu a pesquisa e o estudo que realmente merece. E muitos dos escritos sobre a arte islâmica não foram efetivamente baseados nos critérios intelectuais e culturais sobre os quais a arte islâmica se constituiu, mas sim, baseados em outros critérios ocidentais.
Várias formas e tipos destas artes se estilizaram com o estilo islâmico e distinguiu a civilização islâmica das outras civilizações.
A Arte da Arquitetura Islâmica
A arquitetura islâmica tem uma identidade e estilo especiais e destacados, observados pelos olhos imediatamente, seja por causa de sua reprodução geral, dos elementos arquitetônicos destacados ou das ornamentações utilizadas. O engenheiro muçulmano se destacou nos trabalhos arquitetônicos ao definir os desenhos e detalhes minuciosos, bem como os modelos sólidos necessários para a execução, lado a lado com as medições iniciais. Sem dúvida, isto exigiu dele o aprofundamento nas ciências da matemática, engenharia e mecânica, tais ciências em que os muçulmanos se destacaram como já ilustrado em artigos anteriores.
Técnicas de arquitetura islâmica
E a seguir a apresentação de algumas técnicas da arquitetura islâmica, para conhecermos sobre a sua importância e as contribuições dos muçulmanos em sua inovação e desenvolvimento[1].
(1) As Cúpulas (Al Qibab): Os muçulmanos foram excelentes construtores de abóbadas enormes e tiveram sucesso na realização de seus cálculos complexos, que são baseados nos métodos de análise de conchas. Tais estruturas complexas e sofisticadas, como Qubat Al Sakhra (Domo da Rocha), em Jerusalém, e as cúpulas das mesquitas de Astana, Cairo e Andaluzia – se baseiam completamente em cálculos matemáticos complexos. Estes domos transformam as mesquitas em peças de beleza. Basta observar a Mesquita do Sultão Ahmed, em Istambul, como exemplo desta beleza, para perceber a grandeza da civilização islâmica.
As cúpulas, além de outras produções, marcam a evolução da civilização islâmica no domínio da arquitetura. A técnica das cúpulas se desenvolveu muito e, em todo o seu curso de desenvolvimento tomou várias formas geométricas. Por exemplo: a cúpula de Al-Masjid Al-Jami em Qairawan; mesquita Al-Zaitunah, na Tunísia; e Al-Masjid Al-Jami, em Córdoba. As influências dessa evolução foram, posteriormente, visíveis na arquitetura européia nos séculos 11 e 12 dC[2].
(2) As Colunas (Al A’midah): As colunas são parte importante da arte islâmica, com os seus capitéis, arcos e laços de madeira, a ponto de surgir um ramo da arquitetura denominado de ciência dos arcos estruturais. Os arcos em forma de ferradura se tornoram um sinal distintivo da arquitetura islâmica. Mesmo havendo arcos antes disso, porém os muçulmanos mudaram sua forma.
(3) As Abóbodas (Al Muqarnasat): Elas são uma das principais características da arquitetura islâmica e são as partes que descem do teto. Existem dois tipos de abóbadas: internas, que são normalmente construídas nos oratórios (mihrab, nichos de oração) e nos tetos. E externas, construídas em minaretes, nas portas e varandas dos palácios.
(4) As Janelas (Al Mashrabiyat): Elas são um dos elementos mais marcantes da arquitetura islâmica. É uma janela de sacada fechada com treliças de madeira talhada localizada no segundo andar de um edifício ou andar superior. Muitas vezes são revestidas com vitrais e podem ser perfuradas ou ornamentadas. Elas são chamados mashrabiyat qamariah (lunares) se forem redondas, e mashrabiyat shamsiah (solares) se não forem de forma arredondada, ou é denominada shish. Elas são feitas de madeira cortada para ser instalada como cortinas para as janelas do edifício. Um de seus benefícios é amenizar a nitidez da luz que vem de fora, a mulher também pode observar quem está do lado de fora sem ser vista. Isso se tornou uma característica básica em casas islâmicas[3].
(5) A acústica arquitetônica (Al Sautiyat Al Mi’mariyah): Acredita-se que os muçulmanos originaram a acústica e firmaram os seus princípios. Os muçulmanos empregaram as aplicações da acústica no desenvolvimento da técnica de engenharia acústica e no uso do que hoje é chamado de “acústica arquitetônica”. Eles perceberam que o som reflete em superfícies côncavas e se reúne em um único foco como a luz, que reflete em superfícies de espelhos côncavos. Os técnicos muçulmanos usaram a técnica da focalização do som em fins de construção civil e, particularmente nas grandes mesquitas congregacionais. O objetivo era transmitir e fazer a voz do orador mais forte durante os sermões às sextas-feiras e nos dias de festa (id). Exemplos da acústica arquitetônica islâmica podem ser vistos na: velha Mesquita de Isfahan, Mesquita de al-Adiliya em Halab (Aleppo), algumas mesquitas antigas em Bagdá. O teto e as paredes da mesquita costumavam ser projetados com superfícies côncavas distribuídas perfeitamente nos cantos da mesquita a fim de assegurar que o som irá atingir todos os cantos dentro da mesquita.
Essas façanhas islâmicas existentes até os dias de hoje são a melhor prova da liderança dos sábios da civilização islâmica na técnica de engenharia e arquitetura acústica, antes mesmo do conhecido cientista Wallace C. Sabine[4] começar a estudar as razões das características ruins do som de uma sala de aula na Universidade de Harvard, e antes de seu estudo do comportamento das características acústicas das salas e dos estúdios de música.[5]
Para descobrir a importância do desenvolvimento do campo da acústica arquitetônica nas mãos dos muçulmanos, basta mencionar que a focalização do som, cujos benefícios de sua aplicação foram posteriormente destacados, é usada na civilização moderna como um elemento básico de engenharia acústica arquitetônica. Teatros e salões de festa estão são equipados com paredes côncavas no fundo, a fim de repetir o som e torná-lo mais alto e mais claro.
(6) Os Arcos (Al Úqud): As referências históricas e estudos no assunto da arquitetura islâmica afirmam que o arco pneumático foi o primeiro padrão de técnicas de engenharia arquitetônica a surgir entre os muçulmanos. Este arco foi usado na Mesquita Omíada (al-Masjid al-Umawi) em Damasco, em 87 dH / 706 dC. Mais tarde, arcos pneumáticos foram utilizados em uma escala maior e tornaram-se um elemento distintivo da arquitetura islâmica, em especial nos países do oriente árabe e na Andaluzia. Em seguida, os construtores europeus assimilaram esta técnica e a utilizaram por toda a Europa na construção de suas igrejas e mosteiros.
Os muçulmanos também desenvolveram a técnica de “arcos de aberturas triangulares”, que se desenvolveu a partir de uma ideia de engenharia pura baseada na divisão aritmética. Isto foi descoberto por pesquisadores em função de um desenho em uma parede nos escombros da cidade de Al-Zahra’, na Andaluzia. E o uso deste tipo de arcos se difundiu nas igrejas da Espanha, França e Itália.
Temos também a técnica dos arcos aparados, que são arcos com suas bordas internas cortadas em forma de cadeia de semicírculos ou semelhante a um arco de semi-lobos. Embora este arco talvez tenha sido desenvolvido a partir da forma da borda de uma concha, ele tomou uma forma geométrica pura da arquitetura islâmica e se tornou de suas inovações, aparecendo inicialmente nos monumentos islâmicos no início do segundo século islâmico (século VIII cristão). As características completas dos arcos aparados ficaram claros na estrutura da cúpula da grande Mesquita de Al Qairawan (al-Masjid al-Jami) no ano 221 dH / 836 dC. E a forma geométrica deste arco foi mantida durante o curso de sua evolução, apesar da variação de seus padrões. Nos séculos posteriores, os arcos aparados se entrelaçaram e aumentaram o número de lobos, ficaram menores e foram introduzidas pequenas flores e rosas, tornando sua forma artística e atraente, e foram utilizadas no enfeite dos minaretes e oratórios.
Além desses tipos de arcos, vários outros modelos de arcos surgiram na arquitetura islâmica: arcos ogivais, arcos sólidos e arcos divergentes. Seu uso se difundiu nos países do oriente e do ocidente igualmente, e existem exemplos desses tipos de arcos na arquitetura européia. Por exemplo: O arco divergente transferiu-se para a arquitetura inglesa e foi largamente aplicado no século VI, sob o nome de arco Tudor (Tudor Arch). No entanto, a arquitetura islâmica foi precursora em seu uso cinco séculos antes nas mesquitas de al-Jiyushi, al-Aqmar e al-Azhar, no Cairo[6].
(7) As represas e barragens (Al Sudud wa Al Qanatir): As características de beleza da arquitetura islâmica se estenderam para abranger também as barragens, represas e canais, com técnicas exclusivas de concepção e execução. Essas obras dão uma dimensão adicional de beleza à água que passa através dos canais e rios. E isto significa que a arquitetura islâmica e as suas formas geométricas e estéticas eram reflexos naturais das épocas de crescimento e avanço da civilização islâmica.
(8) As Paredes (Al Aswar): O arquiteto muçulmano baseava-se nos aspectos práticos da ciência da mecânica. Isso ficou evidente na estrutura das enormes mesquitas e altos minaretes, bem como nas enormes barragens e represas, como a barragem de Al-Nahrawan, a barragem de Al-Rastan, a barragem do Eufrates, e Majra al-Uyun no Cairo durante a era de Salahuddin, que transportava água da boca da baía do Golfo, no Nilo, até o castelo construído em cima da montanha de al-Muqattam. Havia uma roda d’água girada por animais para levantar a água numa altura de 10 metros, para bombá-la no canal acima da barragem e fazê-la fluir com o método de vasos comunicantes até chegar no castelo.
(9) As Fortalezas (Al Qila’): As fortalezas árabes foram um dos principais acréscimos arquitetônicos que o Ocidente assimilou da arquitetura muçulmana, de acordo com Sigrid Hunke. O Ocidente conhecia apenas o padrão circular de design de fortaleza, e desde quando os muçulmanos conquistaram a Andaluzia e, posteriormente, a Sicília, e ocorreu o contato com os muçulmanos durante as Cruzadas, desde então, os padrões de construção se alteraram para o estilo árabe, caracterizado em sua maior parte pelo seu design quadrado e equipado com guaritas e torres para fins de defesa nos cantos de suas fortalezas, e às vezes no centro.[7]
O esplendor da arquitetura sempre reflete o esplendor da civilização que a originou. Esta é uma regra histórica, como citou Ibn Khaldun: “O Estado e o reino são tão importantes para a construção como a imagem para a matéria, que é a forma de preservar a sua existência. Eles são inseparáveis e esta é uma regra da sabedoria. Um Estado sem construção é inimaginável, e a construção sem Estado é impossível. E o desequilíbrio de qualquer um deles, significa o desequilíbrio do outro, assim como a inexistência de um deles afeta a inexistência do outro”.[8]
[1] Ahmad Fuad Basha: Al Turath Al-Ilmi Al-Islami, p 39-47.
[2] Ahmad Fuad Basha: Al Turath Al-Ilmi Al-Islami, p 41.
[3] Abdul Monem Majid: Tarikh Al Hadarah Al Islamiah Fi Al Usur Al wusta (A História da Civilização Islâmica na Idade Medieval), p 268, 269.
[4] Wallace Clement Sabine: 1868-1919, físico americano a quem é atribuído ter fundado a ciência de acústica arquitetônica.
[5] Forbes S. G. e Dixtroux A. G.,A história da ciência e da tecnologia, p 68.
[6] Ahmad Fuad Basha: Al Turath Al-Ilmi Al-Islami, p 41.
[7] Sigrid Hunke: O sol dos árabes resplandesce sobre o Ocidente, p 440 em diante.
[8] Ibn Khaldun: Al Muqaddimah, 1 / 376, veja também: Adel Awadh: A cidade árabe islâmica e a cidade européia, Revista de Ciência e Tecnologia, Instituto de Desenvolvimento Árabe, Edição 27, 1992, p 32.