Este hadith indica que se soubéssemos tanto quanto o Profeta صلى الله عليه وسلم
sabia sobre o Poder de Allah, e a Sua retribuição para quem o desobedece,
então o nosso choro e mágoa e temor pelo que nos espera duraria
bastante. Talvez nem sorríssemos novamente.
‘A’isha ( ضي لله عن(ا ') relatou que sempre que o vento mudava e tempestades
vinham, o aspecto do Profeta صلى الله عليه وسلم mudava e ele caminharia de um
lado para o outro em agitação, saindo e entrando novamente. Tudo isto
era por medo do castigo de Allah.101
Abdullah Ibn ash-Shukhair relatou que sempre que o Mensageiro
de Allah صلى الله عليه وسلم começava a orar, um som como um caldeirão a ferver era
ouvido vindo do seu peito.102
Se considerar o estado dos companheiros do Profeta صلى الله عليه وسلم, e os
homens virtuosos desta ummah que os sucedeu ( ضي لله عن(م ') chegará à
conclusão de que eles estavam completamente envolvidos em fazer as
melhores ações enquanto, ao mesmo tempo, cheios de temor a Allah.
Nós, por outro lado, fazemos coisas muito menores do que este exemplo
e, no entanto, sentimo-nos bem seguros.
Abu Bakr as-Siddiq (! ضي لله عن ') disse “Eu desejava ser não mais
do que um pêlo no lado de um servo crente”. Sempre que ele se levantava
para a oração, ele tremia como uma folha por temor a Allah.
‘Umar Ibn Al-Khattab (! ضي لله عن ') estava uma vez a ler a Surat at-
Tur e quando ele se deparou com o verso:
“Por certo, o castigo de teu Senhor sobrevirá.”
[52:7]
…ele chorou tão intensamente que ele ficou doente, e as pessoas iam
visitá-lo para ver como ele estava.
Quando ele estava no leito da morte, ele disse ao seu filho “Põe a
minha face na terra para que Allah me perdoe”. Depois ele disse “Eu estou
condenado se Ele não me perdoar”. Ele repetiu as mesmas palavras
três vezes e em seguida faleceu.
101 Al-Bukhari, Kitab Bad’Al-Khalq, 6/300; Muslim, Kitab Al-Istisqa’, 6/196.
102 Sahih, at-Tirmidhi, Kitab ash-Shama’il, p.337; an-Nisa’i, Kitab as-Sahw, 3/13; Abu
Dawud, Kitab as-Salah, 3/172.
98
Quando ele costumava recitar o Qur’an à noite e lia um verso que
o enchia de temor, ele ficava em casa por dias a fio e as pessoas vinham
visitá-lo, pensando que ele estava doente. O seu choro frequente
deixou duas linhas escuras na sua cara.
Ibn ‘Abbas disse-lhe uma vez “Allah trouxe muitos países para a
Ummah Muçulmana através de ti, e através de ti, muitas vitórias foram
ganhas.” ‘Umar respondeu “Tudo o que eu quero é ser salvo. Não desejo
nem recompensa, nem castigo.”
‘Uthman Ibn ‘Affan (! ضي لله عن ') costumava chorar até a sua barba
estar encharcada cada vez que ele ficava perante uma sepultura. Ele
costumava dizer “Se eu estivesse entre o Jardim e o Fogo, não sabendo
em qual chegaria a entrar, eu preferiria ser transformado em cinzas antes
de saber o meu destino.”
Abu’d-Darda’ costumava dizer “Se soubesses o que irias encontrar
depois da tua morte, nunca comerias com qualquer apetite, nem beberias
com sede, nem entrarias em casas para abrigo, mas sairias em
espaços abertos batendo no teu peito e chorarias sem parar. Eu desejaria
ser uma árvore a ser cortada e destruída.”103
A pele por baixo dos olhos de Ibn ‘Abbas parecia couro de sandália,
por causa do seu choro frequente.
‘Ali Ibn Abi Talib (! ضي لله عن ') ficou uma vez dominado por tristeza
depois de acabar a oração da alvorada; ele disse “Nunca antes tinha
visto algo como os companheiros do Mensageiro de Allah صلى الله عليه وسلم. Os seus
cabelos eram despenteados, e o espaço entre os seus olhos eram
como os joelhos de cabras. Eles passavam a noite em oração e recitação
do Qur’an, de pé ou em prostração. Quando a alvorada chegava,
eles passá-la-iam com lembrança de Allah, bamboleando como árvores
num dia tempestuoso, com lágrimas fluindo dos seus olhos até que as
suas roupas ficavam encharcadas. Por Allah, parece-me que as pessoas
que estão ao meu redor passaram a noite a dormir profundamente”. Depois
ele levantou-se e não foi visto a rir novamente, até ele ser apunhalado
até à morte por Ibn Muljim.
103 Da’if; Este hadith não ésóatribuído a Abu’d-Darda’, mas também gravado por as-
Suyuti, Al-Jami’as-Saghir, 3/318, como um hadith relatado por Ibn ‘Asakir. Al-Hakim
gravou um hadith semelhante mas com palavras diferentes em Al-Mustadrak, 4/579,
e atribui-o a Abu’d-Darda’.
99
Mussa Ibn Mas’ud disse “Sempre que nos sentávamos na companhia
de Suffian, nós sentíamos como se o Fogo nos tivesse cercado
por causa do medo e pânico que víamos nos seus olhos.”
Al-Hasan foi descrito uma vez como o seguinte: “Sempre que ele
se aproximava de nós, parecia como se ele tivesse acabado de vir do funeral
do seu melhor amigo; sempre que ele se sentava com companhia,
ele parecia um prisioneiro que tinha acabado de ser sentenciado à morte
por decapitação; e sempre que o Fogo era mencionado, era como se
este tivesse sido especialmente criado só para ele.”
Foi relatado que Zurarah Ibn Abu Awfa liderou algumas pessoas
na oração da alvorada e recitou a Surat Al-Mudathir do Qur’an. Quando
ele alcançou as palavras:
“Então, quando se tocar a Corneta, esse dia será
um difícil dia…” [74:8-9]
…ele ofegou e caiu morto.104
Abdullah Ibn Amr Ibn Al-As foi relatado como tendo dito “Chorem,
e se não puderem chorar, então finjam que choram! Eu juro por Aquele
em Cuja Mão está a minha vida, se qualquer um de vós realmente soubesse,
imploraria até que a sua voz desaparecesse, e rezaria até que as
suas costas se quebrassem.”105
104 Ad-Dhahabi, Kitab Al-‘Ibar, 1/109.
105 Sahih, Al-Hakim, Kitab Al-Ahwal, 4/578.
100
VINTE
A VIDA DESTE MUNDO
A desaprovação deste mundo que aparece no Livro e nos Ahadith
não é direcionada ao aspecto do seu tempo, que é a alternação da noite
e do dia até ao Dia do Juízo. Allah ( سبحان! .تعالى ) concedeu isso para que
as pessoas que quisessem, invocassem o Seu Nome e fossem agradecidas
durante estes.
Foi dito uma vez “A noite e o dia são como duas arcas de tesouro,
então tem cuidado com o que fazes neles.”
Mujahid disse “Nenhum dia passa sem dizer ‘Ó filho de Adão, eu
vim até ti hoje e eu nunca voltarei, então tem cuidado com o que fazes
durante a minha estadia’. Quando o dia passa, este é dobrado e selado,
nunca sendo reaberto por ninguém até Allah o reabrir no Dia do Juízo.”
Há um poema que menciona:
A vida não é mais do que uma estrada
que leva ao Jardim,
ou ao Fogo.
As suas noites são a oficina do Homem,
e os seus dias são o seu mercado.
Então o tempo é a capital do servo.
O Profeta صلى الله عليه وسلم disse “Quem disser ‘Exaltado seja Allah e d’Ele são as Bênçãos’,
terá uma palmeira plantada para ele no Jardim.”106
Considere quantas palmeiras um desperdiçador de tempo perde
a oportunidade de plantar.
Um homem virtuoso costumava dizer às suas visitas que ficavam
demasiado tempo “Não querem sair? O anjo do sol nunca se cansa de o
puxar.”
Um homem uma vez disse a um ‘alim “Pare, para que eu fale consigo!”.
O ‘alim respondeu “Primeiro pare o sol!”
106 Sahih, at-Tirmidhi.
101
A desaprovação deste mundo que aparece no Livro e nos Ahadith
também não é direcionada ao seu aspecto de espaço, que é a terra e
todas as suas montanhas, e mares, e rios, e os tesouros neles. Tudo
isto são as bênçãos de Allah para os Seus servos, para que eles possam
pô-las em uso, e contemplá-las e assim reconhecer a Unicidade e
Grandeza do seu Criador ( .(سبحان! .تعالى
A desaprovação é direcionada às ações dos filhos de Adão neste
mundo, a maioria das quais não têm quaisquer boas consequências;
pois como o Glorioso e Exalto diz:
“Sabei que a vida terrena é, apenas, diversão e entretenimento
e ornamento e vanglória, entre vós, e
ostentação acerca das riquezas e dos filhos. Ela é
como chuva: as plantas nascidas, com esta, causam
admiração aos cultivadores; em seguida, ressecam,
e tu as vês amarelecidas; depois, tornam-se pulvéreas.
E, na Derradeira Vida, haverá veemente
castigo, e perdão de Allah, e agrado. E a vida terrena
não é senão gozo falaz.” [57:20]
Nesta vida, os filhos de Adão estão divididos em dois tipos:
O primeiro tipo, nega a existência de uma morada que espera os
servos de Allah depois desta vida acabar, onde recompensa e castigo
serão experienciados. Estes sobre quem Allah diz:
“Por certo, os que não esperam Nosso deparar e se
agradam da vida terrena e, nela se tranqüilizam, e
os que estão desatentos a Nossos sinais. Desses, a
morada será o Fogo, pelo que cometiam.” [10:7-8]
Tais pessoas só têm uma preocupação, que é desfrutar da vida e
perseguir todos os seus prazeres - e o Exalto diz:
“E os que renegam a Fé gozam, nesta vida, e
comem como comem os rebanhos; e o Fogo lhes
será moradia.” [47:12]
102
O segundo tipo são aqueles que aceitam que há uma morada depois
da morte, onde há recompensa e castigo. Estes são os que seguem
os mensageiros. Eles estão numa de três categorias: aqueles que
são injustos consigo mesmos, aqueles que são maus consigo mesmos,
e aqueles que são rápidos em fazer boas ações, pela permissão de Allah.
Primeiro, aqueles que são injustos consigo mesmos são a maioria.
A maior parte deles estão contentes com as flores desta vida e os
seus prazeres, servindo-se e usando-os de maneiras que Allah não ordenou.
O mundo, para eles, parece ser a sua maior preocupação, e
com este eles estão satisfeitos; eles só amam e detestam pela sua
causa.
Estas são as pessoas que brincam e tagarelam e são desviadas
pelas atrações deste mundo. Embora elas possam acreditar na próxima
vida de maneira geral, elas não descobriram o propósito da vida, nem
estão cientes de que esta é apenas uma paragem, onde provisões para
a jornada final podem ser adquiridas.
Segundo, aqueles que são maus consigo mesmos são aqueles
que tiram o que é permitido deste mundo e cumprem os seus deveres
nele, mas depois perseguem o que está para além destes deveres para
seu próprio prazer e para desfrutar das delícias deste mundo.
Tais pessoas não serão castigadas por fazê-lo, mas a sua procura
por prazer resultará na diminuição do seu nível.
‘Umar Ibn Al-Khattab (! ضي لله عن ') disse “Se não fosse pelo facto
de que o meu nível no Jardim pudesse diminuir, eu ter-vos-ia imitado na
vossa vida de facilidades; mas Allah avisou algumas pessoas dizendo:
‘Fizestes irem-se vossas boas cousas, em vossa vida
terrena, e, com elas, vos deliciastes.’ [46:20]”
Terceiro, aqueles que são rápidos em fazer boas ações são os
que entendem o propósito deste mundo, e agem de acordo. Eles sabem
que Allah só pôs os Seus servos neste mundo para ver quais deles
fazem as melhores ações:
“Por certo, fizemos do que há sobre a terra ornamento
para ela, a fim de pôr à prova qual deles é
melhor em obras.” [18:7]
103
Isto significa que Allah colocou o que está nesta terra para nos
testar, para ver quem é que evitará os prazeres deste mundo e procurar
pelo sucesso no próximo, pois:
“E, por certo, faremos do que há sobre ela superfície
árida.” [18:8]
Aqueles que competem ao fazer boas ações só levam deste
mundo quaisquer provisões que sejam necessárias para a viagem.
O Mensageiro de Allah صلى الله عليه وسلم disse “O que tenho eu a ver com este
mundo? Quanto a este mundo, eu sou como um viajante que descansa
debaixo da sombra de uma árvore, e depois continua a sua viagem e
deixa-a.”107
O Profeta صلى الله عليه وسلم também disse a ‘Umar “Sê nesta vida como se fosses
um estranho ou um viajante.”108
Sempre que a intenção por trás de desfrutar do que é halal é a
obediência e adoração a Allah, então o desfrutar de tais prazeres é visto
como um acto de obediência pelo qual o servo é recompensado. Como
Mu’adh Ibn Jabal (! ضي لله عن ') disse “Eu aguardo pela recompensa de Allah
pelo tempo que passei a dormir, tal como aguardo por esta pelo
tempo que passei acordado.”109
Sa’id Ibn Jubair disse “As provisões da arrogância e orgulho são o
que te distraem da próxima vida. As provisões que não te distraem são
as de que necessitas - para alcançar o que é melhor do que as próprias
provisões.”
Yahya Ibn Mu’adh disse “Como posso não amar este mundo no
qual fui abençoado com sustento que me dá vida, quando eu uso esta
vida para adoração por meio da qual posso ganhar a recompensa do
Jardim?”
Abu Safwan ar-Ra’ini foi questionado uma vez “Qual é a vida deste
mundo que é criticada no Qur’an, e a qual aqueles que são prudentes
devem evitar?”. Ele respondeu “Tudo o que fazes neste mundo com a intenção
de obter lucro neste mundo é censurável, e tudo o que fazes
107 Sahih, at-Tirmidhi, Kitab az-Zuhud, 7/48; Al-Hakim, Kitab ar-Riqaq, 4/310; pela autoridade
de Abdullah Ibn Mas’ud e de ‘Umar ( .('ضي لله عن(م
108 Sahih, Al-Bukhari.
109 Sahih, Muslim, Kitab Al-Imara, 12/207; e atribuído a Mu’adh.
104
para obter lucro no próximo mundo não tem nada a ver com este
mundo.”
Al-Hasan disse “Quão doce e boa a vida deste mundo é para o
mu’min - pois sem ter de se esforçar muito, ele obtém provisão deste
para o Jardim; e quão horrível é a vida deste mundo para o kafir e o munafiq
- pois eles desperdiçam as suas noites e obtêm provisão desta
para o Fogo!”
Abu Mussa relatou que o Profeta صلى الله عليه وسلم disse “Quem estiver apaixonado
pela sua vida neste mundo prejudica a sua vida no próximo, e
quem estiver apaixonado pela sua vida no próximo mundo prejudica a
sua vida neste mundo - e vocês devem preferir o que dura para sempre
em detrimento do que está destinado a desaparecer.”110
Awn Ibn Abdullah disse “Esta vida e a próxima penduram no equilíbrio
do coração como se estivessem em balanças. Aquela que predominar
torna a outra mais leve e menos significativa.”
Wahab disse “Esta vida e a próxima são como um homem com
duas esposas. Se ele agrada a uma, ele incorre a ira da outra.”
Abu’d-Darda’ disse “Se me jurarem que um certo homem é o
mais temente a Allah entre vós, eu jurar-vos-ei que ele é o melhor entre
vós.”
Abdullah Ibn Mas’ud dirigiu-se a algumas pessoas dizendo “Vocês
realizaram mais boas ações que os companheiros do Mensageiro de Allah
صلى الله عليه وسلم alguma vez realizaram, mas eles ainda são melhores que vocês,
porque eles evitaram os prazeres e ganhos mundanos”.111
110 Da’if, Ahmad Ibn Hanbal, Al-Musnad, 4/412; Al-Hakim, Kitab ar-Riqaq, 4/308; é
classificado como sahih, mas adh-Dhahabi refeitou-o devido a uma quebra no seu isnad.
111 Abu Nu’aym, Al-Hilya, 1/136.
105
O Dano do Amor a este Mundo
O Imam Ahmad escreveu, pela autoridade de Suffian, que Jesus,
filho de Maria ( عل 5(م سلم ) costumava dizer “Amor por este mundo é a raiz
de todo o mal, e ter dinheiro é uma doença séria”. Foi-lhe perguntado
“Que maus efeitos têm?” Ele respondeu “Quem o tem nunca está seguro
contra orgulho e auto-ilusão”. Eles disseram “E se alguém não tiver estes
defeitos?” Ele disse “A sua preocupação com fazer o bem distraí-lo-á da
lembrança de Allah ( 112 ”.(سبحان! .تعالى
Amor por este mundo é o que enche o Fogo, enquanto passar
sem os prazeres deste mundo é o que enche o Jardim. Estar intoxicado
com amor por este mundo é mais desastroso do que estar intoxicado
por álcool, porque uma pessoa bêbeda com este mundo só cai finalmente
em si na escuridão da sua sepultura.
Yahya Ibn Mu’adh disse “A vida deste mundo é o vinho do
shaytan, e quem fica intoxicado por ele só acorda assim que está nas
hordas dos mortos, lamentando entre os perdedores.”
O menor dos seus males é que este distrai o Homem da lembrança
e amor a Allah. Quem é distraído pela sua riqueza é um perdedor.
Se o coração é distraído da lembrança de Allah, então shaytan habita-
o e direciona-o para o que ele desejar. Quando shaytan faz um coração
familiarizar-se com os caminhos do mal, ele incita-o a fazer algumas
boas ações para iludir o seu dono a pensar que ele é, em geral, um
benfeitor.
Ibn Mas’ud disse “Cada pessoa neste mundo é como um visitante
e a sua riqueza é só empréstimo. O visitante sai e o empréstimo é eventualmente
pago.”113
Foi dito que amor pela vida deste mundo é a raiz de todos os males,
pois este arruina a fé das pessoas de tantas formas:
112 Da’if, veja Majmu’at Al-Fatawa, 18/123.
113 Um verso de poesia com o mesmo significado menciona:
A tua riqueza e a tua família
sóestão contigo em confiança,
e tudo o que épor confiança
deve, inevitavelmente, ser devolvido.
106
Primeiro, o amor por este mundo leva a demasiada ênfase sobre
a sua importância - quando este é insignificante para Allah. É uma das
piores más ações, dar importância ao que Allah considera trivial.
Segundo, Allah condenou-o. Ele repugna e desaprova-o, excepto
pelo que ele contém que é de direito d’Ele. Quem ama o que Allah condena,
repugna e desaprova, deixou-se vulnerável à confusão e tentação,
tal como a Sua desaprovação e ira.
Terceiro, uma pessoa que ama este mundo, faz dos prazeres e
sucessos desta vida o seu objectivo. Para os adquirir, ela utilizará as
mesmas maneiras e caminhos que, de facto, Allah concedeu para a orientar
na direção d’Ele e da próxima vida. Tal pessoa rebela-se contra o
que Allah pretende para ela se esforçar e alcançar: ela torna os meios
um fim por si só, e usa os meios que devem levar à próxima vida, para
adquirir os prazeres deste mundo. Isto é uma completa perversão do
propósito destes meios, o que indica um coração muito perverso. Allah
سبحان! .تعالى) ) diz:
“Quem deseja a vida terrena e seus ornamentos,
Nós, nela, compensar-lhes-emos as obras e, nela,
em nada eles serão subtraídos. Esses são os que
não terão, na Derradeira Vida, senão o Fogo, e anular-
se-á o que engenharam nela, na vida terrena,
e derrogar-se-á o que faziam.” [11:15-16]
Há muitos ahadith sobre isto. Um deles foi transmitido por Abu
Huraira que disse “Eu ouvi o Mensageiro de Allah صلى الله عليه وسلم dizer ‘O primeiro
dos homens a ser julgado no Dia do Juízo será um homem que morreu
como mártir. Ele será trazido e Allah pedir-lhe-à para ele recontar as Suas
bênçãos, e então ele reconta-las-à. Allah dirá ‘O que costumavas fazer?’.
O homem dirá ‘Eu lutei por Ti até morrer como mártir’. Allah dirá ‘Disseste
uma mentira. Tu lutaste para seres referido como um guerreiro corajoso,
e assim foste referido’. Ordens serão dadas contra ele e ele será arrastado
pelo rosto e atirado no Fogo. Depois um homem que adquiriu conhecimento
e o transmitiu e recitava o Qur’an será trazido. Ele será trazido
perante Allah e Ele pedir-lhe-à para recontar as Sua bênçãos, e então
ele reconta-las-à. E então Allah perguntará ‘O que costumavas fazer?’.
Ele dirá ‘Eu adquiri conhecimento e transmiti-o e recitei o Qur’an,
procurando pelo Teu agrado’. Allah dirá ‘Disseste uma mentira. Adquiriste
conhecimento para que pudesses ser chamado de estudioso, e recitavas
o Qur’an para que pudesse ser dito que eras um qari, e assim foste
referido’. E então ordens serão dadas contra ele e ele será arrastado pelo
rosto e atirado no Fogo. Depois um homem será trazido, a quem Allah
107
fez abundantemente rico e a quem Ele concedeu todo o tipo de riqueza.
Ele será trazido perante Allah e Ele pedir-lhe-à para recontar as Sua bênçãos,
e então ele reconta-las-à. E então Allah perguntará ‘O que costumavas
fazer?’. Ele dirá ‘Eu gastei dinheiro de todas as formas que Tu desejavas
que este fosse gasto’. Allah dirá “Estás a mentir. Tu fizeste isso
para que pudesse ser dito que eras um homem generoso, e assim foste
referido’. E então Allah dará a ordem e ele será arrastado pelo rosto e atirado
no Fogo.’”114
Neste hadith nós podemos ver como foi o amor pela vida deste
mundo que impediu estas três pessoas da recompensa e rendeu as
suas ações como inúteis, fazendo delas as primeiras a entrar no Fogo.
Quarto, o amor pela vida deste mundo também faz o servo ficar
preocupado com ele e impede-o de realizar ações que poderiam beneficiá-
lo no próximo mundo. Há muitos tipos de pessoas nesta categoria:
há aquelas cuja preocupação com esta vida distrai-as do Islam e as
suas leis completamente; aquelas que estão distraídas de muitos dos
seus deveres religiosos; aqueles que são distraídas de qualquer dever
que entrave os seus planos e esquemas para o adquirir; aquelas que
são distraídas de cumprir as suas obrigações religiosas nos tempos e
maneiras certos, assim desperdiçando o seu tempo e negligenciando os
seus deveres; aquelas cujos corações estão demasiado preocupados
com esta vida para serem capazes de dar atenção total à sua adoração
quando elas cumprem os seus deveres religiosos; e aquelas cujos corações
não são devotos a Allah, e assim o cumprimentos destes deveres
é só uma exibição exterior sem qualquer sinceridade interior - e estas
são o tipo menos comum dentre os amantes desta vida.
Uma forma menos extrema de amor pela vida deste mundo é o
que apenas distrai o servo da sua verdadeira fonte de felicidade: que é
dedicar o seu coração ao amor pelo seu Senhor, e a sua língua à lembrança
d’Ele. Amor e obsessão pela vida deste mundo limitam, inevitavelmente,
as oportunidades de um servo no próximo mundo, da mesma
maneira que amor pelo próximo mundo limita a sua vida neste mundo.
Quinto, o amor pela vida deste mundo fá-lo a primeira preocupação
do servo. Anas Ibn Malik (! ضي لله عن ') relatou que o Mensageiro de
Allah صلى الله عليه وسلم disse “Quem estiver preocupado com a próxima vida, Allah colocará
riqueza dentro do seu coração, e reunirá as pessoas a seu redor,
e assim a vida virá e oferecer-se-à para ele. Quem estiver preocupado
com esta vida, Allah fará a pobreza aparente nos seus olhos, e afastará
114 Muslim, Kitab Al-Jihad, 13/50.
108
as pessoas do seu redor, e só o que foi decretado para ele neste
mundo, virá até ele.”115
Sexto, aquele que mais ama a vida deste mundo é aquele que
mais sofre nesta. O seu sofrimento é de três tipos: o sofrimento nesta
mesma vida como resultado do seu esforço em alcançar ganhos mundanos
e a sua competição com outras pessoas sobre eles; o seu sofrimento
no barzakh porque ele perdeu nesta vida e arrepende-se das
suas oportunidades perdidas - pois agora ele está no seu caminho para
encontrar Allah em tal estado que ele deseja nunca encontrá-Lo; e o seu
sofrimento porque ele não teve êxito em encontrar um substituto para Ele
nesta vida. Tal homem sofre o tormento mais severo na sua sepultura.
Amargura, depressão e arrependimento, tudo isso devora a sua alma, da
mesma forma que os vermes devoram o seu corpo.
Resumindo, aquele que ama a vida deste mundo sofre neste
mundo, na sua sepultura e no Dia em que ele encontrar o seu Senhor.
Allah ( سبحان! .تعالى ) diz:
“Então, não te admires de suas riquezas e de seus
filhos. Apenas, Allah não deseja, com isso, senão
castigá-los na vida terrena, e que morram, enquanto
renegadores da Fé.” [9:55]
Um dos nossos antecessores virtuosos disse sobre este verso
“‘Allah não deseja, com isso, senão castigá-los’ através do seu esforço
em adquirir este mundo; ‘e que morram’ como resultado do seu amor
por este; ‘enquanto renegadores da Fé’ porque eles negaram os direitos
devidos a Allah neste.”
Sétimo, aquele que ama a vida deste mundo e prefere-a em detrimento
da próxima vida é o mais baixo da criação e o menos inteligente:
ele prefere ilusão em vez de realidade, sonhar em vez de estar acordado,
a sombra de vida curta em vez de felicidade eterna, e o abrigo
temporário em vez da morada duradoura. Ele troca a sua vida na akhira
pela que não é mais do que uma ilusão. Uma vida que não é mais do
que uma sombra passageira não pode enganar nenhum muçulmano
que tenha intelecto.
Alguns dos nossos antecessores costumavam citar estes versos
de poesia:
115 Sahih, at-Tirmidhi, Kitab az-Zuhud, 6/165; Ibn Ma’jah, Kitab az-Zuhud, 2/1375.
109
Ó povo que encontra prazer
num mundo que desaparecerá,
apaixonar-se por uma sombra que se desvanece
é pura estupidez!
Yunus Ibn Abdal-‘Ala disse “Para mim, a vida deste mundo pode
ser comparada com um homem que adormece, e num sonho ele vê
tudo o que ele gosta e tudo o que ele não gosta, e enquanto ele está
neste estado, ele de repente acorda!”
Uma das coisas que pode facilmente ser comparada a esta vida é
a sombra: parece ser permanente, mas na realidade é um estado constante
de encurtar e ampliar, e quando se tenta persegui-la e agarrá-la -
não é possível! Também pode ser comparada a uma miragem no deserto
que:
“…o sedento crerá ser água e, quando se aproximar
dela, não encontrará coisa alguma. Porém,
verá ante ele Allah, que lhe pedirá contas, porque
Allah é Expedito no cômputo.” [24:39]
A vida deste mundo pode também ser comparada com uma mulher
velha, deformada e repulsiva, que é falsa e enganadora para quem
se propõem a ela. Ela veste-se com todos os adornos e vestimentas bonitas
para esconder a sua feiúra e inconstância. Os seus pretendentes,
enganados pela sua aparência exterior, eventualmente se propõem. Ela
diz-lhes “Não quero qualquer dote de ti - excepto que desistam da próxima
vida: Eu e a próxima vida somos inimigas mortais, e não somos
nem permitidas, nem autorizadas a encontrarmo-nos uma com a outra”.
Os pretendentes, completamente hipnotizados pelas suas palavras, respondem
“Não há culpa para aqueles que devem ser unidos com quem
amam”. Quando, no entanto, eles levantam o véu dela, e o seu disfarce
é revelado, eles encontram-se em todo o tipo de dificuldades. Alguns
deles divorciam-se dela e libertam-se do fardo, enquanto outros, por outro
lado, decidem permanecer com ela - só para acabar, na manhã depois
do casamento, tristes e deprimidos.
Por Allah! O seu convite convida todo o mundo a apressar-se e
alcançar não o sucesso, mas o fracasso - e, no entanto, os seus admiradores
procuram por união com ela, noite e dia. Eles apressam-se para
se encontrarem com ela na escuridão, para se encontrarem, na manhã
seguinte, desmoralizados e com as suas esperanças destruídas. Eles
caem bem na armadilha dela, e ela consigna-os ao seu destino.
110
VINTE E UM
ARREPENDIMENTO
Desviar-se de más ações voltando para o Ocultador de falhas e o
Conhecedor de todos os segredos é o princípio daqueles que viajam
para Ele, o investimento inicial daqueles que finalmente obtêm lucro, o
primeiro passo na busca pelo Seu Rosto, a chave para corrigir o que
não está correto, e o primeiro nível na seleção daqueles que Lhe serão
aproximados.
A estação de se voltar em arrependimento está no início, no meio
e no fim. O servo que O procura nunca a abandona. Ele permanece nela
até à sua morte. Se ele se move para outra estação, ele leva-a com ele
e chega com ele. Voltar-se em arrependimento é o começo do servo e o
seu fim. Allah ( سبحان! .تعالى ) diz:
“Ó crentes, voltai-vos todos, arrependidos, a Allah,
a fim de que vos salveis!” [24:31]
Este verso está numa surah de Madinah na qual Allah Se dirige às pessoas
de iman e aqueles que foram honrados dentre a Sua criação. Ele
disse-lhes para se Lhe voltarem em arrependimento depois de já terem
acreditado, feito hijrah, e lutado em jihad. Então Ele fez o sucesso condicional
ao arrependimento, usando a expressão “a fim de” para tornar os
crentes cientes de que eles só podem esperar por sucesso se se voltarem
para Ele em arrependimento. Que Allah nos faça segui-los. Allah diz:
“E aqueles que não se arrependem serão os
iníquos.” [49:11]
Ele distingue entre servos arrependidos e os iníquos, e não faz qualquer
outra distinção. Ele chama aqueles que não se voltam arrependidos, iníquos
e malfeitores, e diz que ninguém é mais malfeitor do que tal pessoa,
por causa da sua ignorância quanto ao seu Senhor e dos direitos
que Lhe são devidos, e por causa das suas próprias falhas e o dano das
suas ações.
O Profeta صلى الله عليه وسلم disse “Ó povo, voltem-se arrependidos a Allah! Eu
juro por Allah que eu me volto arrependido para Ele mais de setenta vezes
por dia.”116
116 Sahih, Al-Bukhari, Kitab ad-Da’awat, 11/101.
111
O arrependimento é o voltar do servo para Allah e o seu desvio da
companhia daqueles que se desviam da senda reta e aqueles que convidam
a ira de Allah.
Há três condições para o arrependimento ser válido se a má ação
tem a ver com o que é devido a Allah ( سبحان! .تعالى ): sentir remorso, abandonar
a má ação, e resolver nunca mais repeti-la.
O arrependimento é inválido sem remorso porque se não existe
remorso por ter feito algo errado, então isso implica de que isso é considerado
aceitável, também como sendo aceitável fazê-lo de novo. O Profeta
صلى الله عليه وسلم disse “Sentir remorso é parte do arrependimento.”117
Abandonar a má ação é crucial, porque o arrependimento é insignificativo
se a má ação continua a ser feita.
A terceira condição, resolver nunca mais repetir a má ação, depende
em essência da sinceridade desta decisão e da sua honestidade.
Alguns ‘ulama disseram que repetir a má ação invalida o arrependimento,
argumentando que se alguém que se arrependeu volta para a má ação,
sempre que esta ocorre, então isto mostra que o seu arrependimento foi
falso e então inválido. A maioria, no entanto, conclui que não é necessariamente
uma condição.
Se a má ação foi cometida contra um ser humano, então aquele
que se arrepende deve corrigir qualquer dano que tenha causado ou fazer
as pazes com a pessoa cujos direitos ele infringiu. O Profeta صلى الله عليه وسلم
disse “Qualquer um de vós que esteja em dívida para com o seu irmão
no Islam deve pagar a sua dívida hoje, antes do tempo chegar em que
não haverá dinheiro, e só as boas ações e más ações contarão.”118
Este tipo de má ação é uma transgressão contra dois partidos,
cada um tendo os seus próprios direitos particulares. O malfeitor mostra
arrependimento, pagando ao outro ser humano o que lhe é devido, e
pagando o que é devido a Allah, sentindo remorso interiormente pela sua
má ação. Este remorso é um assunto privado, entre ele e o seu Criador.
117 Sahih, Ahmad Ibn Hanbal, Al-Musnad, 1/376, pela autoridade de Ibn Mas’ud.
Sheikh Shakir diz que o seu isnad ésahih. Também relatado por Al-Hakim, Al-Mustadrak,
4/243.
118 Al-Bukhari, Kitab Al-Mashalim, 5/101 e Kitab Ar-Riqaq, 11/395, pela autoridade de
Abu Huraira.
112
Há vários tipos particulares de arrependimento, dos quais mencionamos
os seguintes:
Primeiro, o arrependimento por falar pelas costas e calúnia, onde
a questão surge sobre se a pessoa que foi difamada na sua ausência
deve ser informada do arrependimento do malfeitor, e consequentemente
vir a saber sobre um mal que ele poderia ter permanecido ignorante
sobre.
Ambas as madhahib do Imam Abu Hanifa e do Imam Malik fazem
informar a pessoa que foi difamada uma pré-condição para a validade
do arrependimento. Eles argumentam a favor disto devido ao hadith
mencionado acima.
A outra opinião, que é a de Ibn Taymiyya, não considera isto
como necessário. Pelo contrário, ele julga que é suficiente para o malfeitor
arrepender-se em privado a Allah, e falar da pessoa caluniada na
mesma companhia em que ele lhe tinha previamente difamado, mas
desta vez em termos opostos àqueles que originalmente causaram o
problema; e ele deve também pedir a Allah por perdão.
O seu argumento é que se alguém contar à pessoa que esta foi
difamada, então isto traz o mal à sua atenção, e só causa mais problemas
sem alcançar qualquer bem. Allah não faz a precipitação de tais assuntos
permissível, quanto mais fazê-la como obrigatória ou ordenar-nos
a agir como tal.
Segundo, o arrependimento por roubo de dinheiro deve incluir a
devolução desse dinheiro aos seus devidos donos. Se o arrependido
não sabe a quem o dinheiro pertence, ou se não é possível devolver o
dinheiro por qualquer outra razão, então ele deve dar o equivalente em
caridade pela pessoa que foi roubada.
No Dia do Juízo, eles terão a escolha de aprovar a sua ação - em
cujo caso a recompensa pela caridade vai para eles - ou desaprová-la e
ter o que for devido a eles da sua recompensa - em cujo caso a recompensa
da caridade vai para o que se arrependeu, pois Allah nunca anula
a recompensa por caridade.
Foi relatado que Ibn Mas’ud (! ضي لله عن ') uma vez comprou uma
escrava de um homem. Quando ele foi pagar, o homem tinha desaparecido.
Ibn Mas’ud esperou em vão que o homem voltasse, e eventualmente
deu o dinheiro em caridade, dizendo “Ó Allah, esta sadaqa é em
113
nome daquele homem. Se ele aprovar esta sadaqah, então a sua recompensa
será dele, e se ele não aprovar, então a recompensa será minha
e ele recebe uma recompensa igual à minha recompensa.”
Terceiro, qual é a posição de alguém que recebe pagamento por
fazer algo haram, tal como vender álcool, cantar, ou dar falso testemunho,
e depois se arrepende enquanto o dinheiro ainda está em sua
posse?
Um grupo de ‘ulama diz que ele deve devolver o dinheiro a quem
o deu, visto que isto ainda pertence ao que fez o pagamento porque a
transação não foi halal e não resultou em nenhuma recompensa halal de
Allah. Outro grupo de ‘ulama diz - e este julgamento é o mais correto -
que o seu arrependimento só pode ser válido se ele der o dinheiro em
caridade, pois como pode ele devolver o dinheiro que foi gasto na desobediência
a Allah?
O mesmo princípio aplica-se a alguém cujo dinheiro halal e haram
se tornam tão misturados que ele não consegue mais distinguir entre os
dois: ele deve dar em caridade qualquer quantia que ele ache ser de lucro
haram, e purificar o que resta. Allah sabe mais.
Outra questão é esta:
Quando um servo se volta em arrependimento por uma má ação,
ele volta ao nível na qual ele estava antes de cometer essa má ação?
Um grupo de ‘ulama diz que ele volta para o mesmo nível que ele
estava antes de cometer essa má ação, porque o arrependimento apaga
a má ação completamente, e é como se a ação nunca tivesse acontecido.
Outro grupo diz que ele não volta ao mesmo nível, argumentando
que visto que ele estava a avançar antes de cometer essa má ação, e
visto que cometê-la fê-lo andar para trás, então quando ele se arrepende,
ele perde o equivalente da distância que ele poderia ter feito então,
se ele não tivesse cometido a má ação!
Ibn Taymiyya disse “O julgamento correto é que alguns dos que
se arrependem não voltam ao seu nível anterior, enquanto que outros
avançam para um nível ainda mais alto e tornam-se melhores do que
eram antes de cometer a má ação.”
114
Por exemplo, o Profeta Dawud ( عل 5! سلم ) estava num nível melhor
depois de se arrepender do que ele estava antes de ter cometido a má
ação.
Aqui está uma metáfora para esclarecer mais o assunto:
Um viajante estava a avançar, sentindo-se confiante e seguro, caminhando
um pouco e depois correndo um pouco, e depois descansando
e dormindo. Ele deparou-se com um sítio com sombra, com água
fresca em abundância e um jardim com flores, e decidiu descansar por
um momento. Enquanto ele relaxava, ele foi atacado por um inimigo que
o agarrou e amarrou. Ele viu destruição iminente e pensou que o seu fim
tinha chegado, que ele poderia tornar-se presa para leões e nunca chegar
ao seu destino. Enquanto ele estava neste estado, preocupado com
pensamentos de desespero, o seu pai misericordioso e carinhoso apareceu
de repente perante ele. Ele desamarrou-o e disse-lhe para continuar
e para ter cuidado com o inimigo que se escondia em emboscada
ao longo da estrada. Ele assegurou-o de que desde que ele permanecesse
alerta e vigilante, que ele não seria dominado, mas se ele fosse
negligente, ele seria mais uma vez capturado. O seu pai disse que ele
continuaria mais adiante e orientá-lo-ia ao seu destino. Se o viajante permanecesse
alerta e mantivesse a sua mente no presente e permanecesse
preparado para o seu inimigo, então a sua viagem seria melhor do
que tinha sido antes, e ele poderia chegar mais rapidamente. Se, por
outro lado, ele se esquecesse sobre o seu inimigo e voltasse ao seu estado
anterior de desatenção e esquecimento, indiferente ao perigo e só
ciente do jardim agradável, então ele mai uma vez tornar-se-ia um alvo
fácil.
115
Arrependimento Sincero
Allah ( سبحان! .تعالى ) diz:
“Ó crentes, voltai, sinceramente arrependidos, a
Allah; é possível que o vosso Senhor absolva as
vossas faltas e vos introduza em jardins, abaixo
dos quais correm os rios, no dia em que Allah não
aviltará o Profeta e aqueles que com ele crerem.”
[66:8]
Para o arrependimento ser verdadeiro e sincero, este deve estar
livre de fraude, defeitos e corrupção.
Al-Hasan Al-Basri disse “É quando o servo sente remorso pelo
que aconteceu e resolve nunca mais repeti-lo”.
Al-Kalbi disse “É quando o servo pede por perdão com a sua língua,
sente remorso com o seu coração, e restringe os seus membros.”
Sa’id Ibn Al-Musayyib disse “Arrependimento sincero é aquilo com
que se purifica as almas.”
Ibn Al-Qayyim disse “Ser sincero ao voltar-se em arrependimento
consiste em três coisas: deve incluir todas as más ações daquele que se
arrepende, não deixando nenhuma de lado; deve ser acompanhado de
completa sinceridade e determinação, para que aquele que se arrepende
não hesite ou atrase, mas invoque toda a sua vontade e determinação
e desembarque nela de coração; e deve ser livre de quaisquer impurezas
e falhas que possam manchar a sua sinceridade, para que seja
inspirada por temor a Allah, esperança pelo que Ele tem, e pavor por
qualquer castigo que Ele possa infligir - e não por qualquer desejo para
proteger as suas posses, ou a sua família, ou o seu estatuto social, ou a
sua influência, ou atrair o louvor das pessoas, ou escapar as suas incriminações,
ou evitar ser chateado por aborrecimentos, ou para satisfazer
o seu apetite por esta vida, ou por causa da sua falência financeira ou incapacidade
de lidar, ou quaisquer destas doenças que afectariam a validade
do seu arrependimento e a sua sinceridade para com Allah ( ! سبحان
.(.تعالى
116
O primeiro elemento do arrependimento sincero diz respeito à
ação pela qual o arrependimento é feito. O segundo diz respeito à própria
pessoa que se arrepende. O terceiro diz respeito Àquele perante
Quem ele se arrepende.
A sinceridade do arrependimento significa que esta é verdadeira e
inclui todas as más ações. Não há dúvida que tal arrependimento requer,
e inclui, pedir por perdão, e que este leva a todos os pecados cometidos
serem apagados. É um arrependimento excelente e perfeito.”119
O arrependimento sincero de um servo a Allah é garantido com
perdão de Allah mesmo antes deste acontecer, e com perdão d’Ele depois
deste acontecer. Noutras palavras, o servo volta-se em arrependimento
entre dois atos de perdão de Allah que asseguram a sua salvação.
O primeiro ato de perdão de Allah é uma permissão, uma inspiração,
e um meio de ajuda que leva o servo a voltar-se em arrependimento
- que então resulta em mais perdão de Allah. O segundo ato de
perdão é o de aceitação e recompensa. Allah ( سبحان! .تعالى ) diz:
“Também absolveu os três que se omitiram (na expedição
de Tabuk) quando a terra, com toda a sua
amplitude, lhes parecia estreita, e suas almas se
constrangeram, e se compenetraram de que não
tinham mais amparo senão em Deus. E Ele os absolveu,
a fim de que se arrependessem, porque
Deus é o Remissório, o Misericordiosíssimo.”
[9:118]
Aqui, Allah ( سبحان! .تعالى ) informa-nos que o Seu voltar em perdão
para eles precedeu o voltar deles em arrependimento a Ele, e foi isto que
tornou possível eles voltarem-se em arrependimento em primeiro lugar.
Ele foi a causa do arrependimento deles - o que é parte do segredo de
que Ele é chamado de “Al-Awwal wa’l Akhir” (O Primeiro e o Último). É
Ele que torna as coisas possíveis e ajuda-as a tornarem-se realidade; a
causa é d’Ele é a consequência é d’Ele.
O servo arrepende-se constantemente e Allah sempre concede o
perdão. O arrependimento do servo é o retorno ao seu Senhor depois
de se ter desviado. O perdão de Allah é de dois tipos, um é a permissão
e ajuda, e o outro é a aceitação e recompensa.
119 Ibn Al-Qayyim, Madarij as-Salikin, 1/310.
117
O arrependimento tem um início e um fim:
O seu início é voltar-se para Allah, caminhando na senda reta que
Ele ordenou os Seus servos a seguir:
“Esta é a Minha senda reta. Segui-a e não sigais
as demais, para que estas não vos desviem da
Sua.” [6:153]
O seu fim é retornar a Ele no Dia que já foi decretado, seguindo o
caminho que Ele ordenou, e o qual leva ao Seu Jardim. Quem se volta
em arrependimento a Allah nesta vida, Allah voltar-Se-à para ele e recompensá-
lo-á na Hora decretada:
“Quanto àquele que se arrepender e praticar o
bem, converter-se-á a Allah sinceramente.”
[25:71]
Os Aspectos Subtis e Ocultos do Arrependimento
Se um servo sensato comete uma má ação, há várias coisas que
ele deve considerar:
Primeiro, ele deve considerar as ordens e proibições de Allah e
concluir que esta foi uma má ação e admitir que ele a fez.
Segundo, ele deve considerar as promessas e avisos de Allah, o
que despertará temor e fá-lo-á voltar-se em arrependimento.
Terceiro, ele deve considerar o facto de que Allah lhe deu a possibilidade
e a capacidade de se voltar em arrependimento, quando Ele poderia
tê-lo impedido de cometer a má ação em primeiro lugar.
Isto lhe dá alguma compreensão da natureza de Allah- Seus Nomes,
Seus Atributos, Sua sabedoria, Sua misericórdia, Sua tolerância, e
Sua generosidade. Isto lhe dá uma qualidade de adoração a Allah que
ele nunca teria alcançado se ele permanecesse ignorante sobre estes
assuntos. O servo reconhece a relação entre a criação de Allah e as
Suas promessas e avisos e os Seus Nomes e os Seus Atributos, e vê
que esta relação requer estes Nomes e Atributos, e a sua manifestação
na criação.
118
Esta compreensão abre para o servo jardins de conhecimento, e
fé, e os segredos do decreto, e sabedoria, e o domínio das palavras é
demasiado limitado para os conter e exprimir.
Algo do que pode ser dito é que o servo aprende sobre o Poder
de Allah, que é manifestado no Seu decreto - isto é, que Ele ( (سبحان! .تعالى
decreta o que Ele quer. Ele também aprende que através da perfeição
do Seu Poder, Ele decretou que o coração do servo deve inclinar-se, e
será direcionado para o que quer que Ele deseje, e que Ele vem entre o
servo e o seu próprio coração.
Ao reconhecer algumas das manifestações do Poder de Allah que
nos são aparentes através do Seu decreto, ele vê que ele é parte de
uma criação ordenada e modelada, cujo controlo está em Mãos que não
as dele. Ele só está a salvo quando Allah o protege, e ele só tem êxito
quando Allah lhe dá sucesso. Ele é banal e insignificante, nas Mãos do
Poderoso, Louvável.
Ao ganhar compreensão sobre o Poder manifestado através do
Seu decreto, o servo testemunha facto de que toda a perfeição, louvor e
poder é de Allah, e que ele mesmo é aquele com todas as deficiências e
defeitos culpáveis, cheio de falhas, imperfeições e necessidades.
Quanto mais ele percebe a sua própria insignificância e os seus defeitos
e fraquezas, mais ele testemunha o poder e riqueza de Allah, e mais fica
ciente de que só Allah é perfeito.
O servo aprende que Allah ( سبحان! .تعالى ) oculta a má ação quando
esta é cometida, mesmo quando Ele é Onividente e perfeitamente capaz,
se assim desejar, de a expor. Ao reconhecer que Allah concede um
tempo ao malfeitor - mesmo quando Ele poderia ser rápido no castigo se
assim desejasse - a indulgência de Allah é revelada àquele que se volta
em arrependimento, e ele ganha uma compreensão dos significados do
Seu Nome “Al-Halím” (O Indulgente).
O servo torna-se familiar com a dádiva do perdão de Allah. É uma
bênção d’Ele. Quando Ele julga com severidade, Ele é Justo e Louvável,
mas o Seu perdão surge da Sua misericórdia, e o servo não está intitulado
a isso como direito. Isto significa que o servo deve ser-Lhe agradecido,
e amá-Lo e voltar-se para Ele em arrependimento, reconhecendo e
confiando no Seu Nome “Al-Ghaffar” (O Perdoador Constante).
119
Allah orienta o Seu servo através das estações da humildade,
submissão, rendição e expressando a sua necessidade de ajuda - que
estão em quatro etapas: a humildade que surge por necessidade e pobreza,
que é um atributo geral de todas as criaturas; a humildade da
obediência e submissão, que só pertence aos que O obedecem; a humildade
do amor, pois o que ama é especialmente humilde, e o nível da
sua humildade está em proporção direta ao seu amor; e a humildade
que surge como resultado de desobediência e má ação que são elas
próprias uma consequência da pobreza e necessidade na qual resultam.
Quando todas as etapas são completas, humildade perante Allah
e submissão a Ele são completas e perfeitas. O servo reconhece que o
Nome de Allah “Ar-Razzaq” (O Sustentador) revela-se no que é sustentado,
e que os Seus Nomes “As-Samí’” e “Al-Basír” (Oniouvinte e Onividente),
revelam-se no que é visto e ouvido.
Da mesma forma, os Seus Nomes “Al-Ghafur”, “Al-Afu’”, “At-
Tawwab” (O Perdoador, O Apagador de Más Ações, Aquele que Compadece
e Se Volta em Perdão) revelam-se em alguém a quem Allah perdoa,
e cujas más ações são apagadas, e que é perdoado constantemente.
É impossível para o servo, ignorar as implicações e requerimentos
destes Nomes e Atributos.
Isto foi notado pelo mais sábio de toda a criação de Allah, o Seu
Mensageiro صلى الله عليه وسلم, quando ele disse “Se vocês não cometessem más
ações, Allah removê-los-ia e substitui-los-ia por um povo que cometesse
más ações, para que eles pudessem procurar pelo perdão de Allah e Ele
conceder-lhes-ia o Seu perdão.”120
Anas Ibn Malik Al-Ansari relatou que o Mensageiro de Allah صلى الله عليه وسلم disse “Allah
fica mais satisfeito com o arrependimento do Seu servo do que uma
pessoa montando um camelo num deserto sem água e perde o seu camelo
e todas as suas provisões de comida e bebida que este carrega.
Tendo abandonado toda a esperança de encontrar o camelo, ele sentase
na sombra de uma árvore que encontra. Enquanto ele descansa, ele
de repente vê o camelo parado à sua frente. Ele agarra nas suas cordas
e depois, em plena felicidade, profere abruptamente ‘Ó Senhor, Tu és o
meu Servo e eu sou o Teu senhor!’. Ele comete este erro por plena felicidade.”
121
120 Muslim, Kitab adh-Dhikr wa’d-Du’a, 17/65.
121 Al-Bukhari, Kitab ad-Da’awat, 11/102; Muslim, Kitab adh-Dhikr wa’d-Du’a, 17/63,
pela autoridade de Anas (! .('ضي لله عن
120
Vamos assumir que uma pessoa a quem você ama muito foi capturada
por um inimigo e impedida de o encontrar, e você sabe que este
inimigo infligirá todo o tipo de torturas na sua amada e destrui-la-á, e que
você é muito melhor para ela do que o seu inimigo - pois ela é alguém
que você nutriu. Depois imagine que ela escapa deste inimigo e vem até
você sem deixá-lo saber antecipadamente, e você fica surpreendido em
vê-la à sua porta, elogiando-o, e esperando pelo seu agrado, com o seu
rosto manchado com o pó da sua entrada. Quão feliz você estaria com
este retorno, vendo que você já a tinha feito sua antes, aprovando a sua
aproximação a você, e favorecendo-a acima de toda a gente?
Este é o sentimento que você experimenta - mesmo quando não
foi você que o trouxe à existência e lhe concedeu as suas bênçãos. Allah
( سبحان! .تعالى ) é Aquele que trouxe o Seu servo à existência, criou-o, e
concedeu-lhe as Suas bênçãos - e Ele gosta de completar as Suas
bênçãos nele!
O nosso desejo final é que você não se esqueça de pedir a Allah
para que nós tenhamos verdade, sinceridade, certeza, perdão, e saúde
neste mundo e no próximo. Nós pedimos a Allah para estar entre aqueles
cuja última súplica é:
Todo o louvor para Allah, Senhor dos mundos.
Tua é a Glória, nosso Senhor, e a Ti todos os louvores
pertencem.
Eu testemunho que não há divindade senão Tu, e eu
refugio-me no Teu perdão e volto-me em arrependimento
a Ti.
121