O faraó estava zangado. Seu reino de temor foi construído pela opressão do povo e mantendo seus corações e mentes cativos. Todo o povo do Egito, desde os ministros e mágicos até os servos e escravos mais baixos temiam o poder e raiva do faraó, mas Moisés tinha exposto um ponto fraco. O faraó estava preocupado que seu reino estivesse prestes a se acabar; entretanto, estava cercado por bajuladores e parasitas que o incentivaram a uma tirania maior.
Os oficiais de segurança e inteligência do faraó começaram a espalhar rumores. Disseram que Moisés e alguns mágicos tinham combinado secretamente que Moisés ganharia a competição. Os corpos sem vida dos mágicos assassinados estavam pendurados em lugares públicos para aterrorizarem ainda mais as pessoas. Devido à sua associação com Moisés, os filhos de Israel se tornaram bodes expiatórios. Reclamaram com Moisés que eram maltratados quando ele nasceu e que agora ele tinha feito com que fossem oprimidos novamente.
O faraó ordenou mais matança, pilhagem e estupros. Aprisionava qualquer um que reclamasse dessa opressão e Moisés estava impotente. Não podia interferir. Aconselhava paciência e observava em silêncio. Os filhos de Israel reclamavam com Moisés e ele ficou em uma situação muito difícil. Enquanto combatia os estratagemas e planos do faraó, seu povo estava se voltando contra ele e um dos seus trabalhava com os detentores de poder egípcios.
Carun era um homem dos filhos de Israel abençoado com fortuna e status, enquanto todos ao seu redor eram pobres e destituídos. Não reconhecia as bênçãos de Deus e tratava os pobres com desprezo. Quando Moisés o lembrou de que era seu dever, como alguém que adorava o Deus único, pagar o tributo dos pobres, ele recusou e começou a espalhar o rumor de que Moisés tinha inventado o tributo para ficar rico. A ira de Deus recaiu sobre Carun e a terra se abriu e o engoliu, como se ele nunca tivesse existido.
“Em verdade, Carun era do povo de Moisés e o envergonhou. Havíamos-lhe concedido tantos tesouros, que as suas chaves constituíam uma carga para um grupo de homens robustos... Respondeu: Isto me foi concedido, devido a certo conhecimento que possuo! Porém, ignorava que Deus já havia exterminado tantas gerações, mais vigorosas e mais opulentas do que ele... Então se apresentou seu povo, com toda a sua pompa... E fizemo-lo ser tragado, juntamente com sua casa, pela terra...” (Alcorão 28: 76-82)
O faraó convocou Moisés ao palácio. Ibn Kathir narra que o faraó queria Moisés morto e que era apoiado por todos os seus ministros e oficiais, exceto um. Esse homem, que se acredita que seja um parente do faraó, era um crente na unicidade de Deus, embora até esse momento tivesse mantido essa crença em segredo.
“E um homem crente, da família do Faraó, que ocultava a sua fé, disse: Mataríeis um homem tão-somente porque diz: Meu Senhor é Deus, não obstante Ter-vos apresentado as evidências do vosso Senhor? Além do mais se for um impostor, a sua mentira recairá sobre ele; por outra, se for veraz, açoitar-vos-á algo daquilo com que ele vos ameaça.” (Alcorão 40:28)
O homem crente falou de maneira eloquente; alertou seu povo de que sofreriam um desastre como os que tinham afligido povos do passado. Relembrou-lhes que Deus tinha enviado sinais claros com Moisés, mas suas palavras não foram ouvidas. O faraó e muitos de seus ministros ameaçaram matar o crente, mas Deus o manteve a salvo, sob Sua proteção.
“E eis que Deus o preservou das conspirações que lhe haviam urdido, e o povo do Faraó sofreu o mais severo dos castigos!” (Alcorão 40:45)
Deus ordenou a Moisés que alertasse o faraó de que ele e os egípcios sofreriam uma punição severa, se os filhos de Israel não fossem libertados. Se a tortura, opressão e assédio não parassem, os sinais da ira de Deus recairiam sobre eles. A resposta do faraó foi chamar todo o povo do Egito, inclusive os filhos de Israel, para uma grande reunião. Informou-os de que ele era seu Senhor e destacou que Moisés não era nada além de um servo vil sem poder ou força. A força de Moisés, entretanto, vinha diretamente de Deus. Mas as pessoas acreditaram e obedeceram ao faraó: os sinais do poder de Deus começaram a descer.
Deus afligiu o Egito com uma grande seca. Até os vales do suntuoso, verde e fértil Nilo começaram a secar e morrer. As plantações morreram e o povo começou a sofrer, mas o faraó continuou arrogante e, portanto, Deus enviou uma enorme inundação para devastar a terra. As pessoas, inclusive os ministros-chefes, apelaram a Moisés.
“Ó Moisés, implora por nós, de teu Senhor, o que te prometeu; pois, se nos livrares do castigo, creremos em ti e deixaremos partir contigo os israelitas.” (Alcorão 7:134)
A terra voltou ao normal e as plantações começaram a crescer novamente, mas os filhos de Israel continuaram escravizados. Deus enviou uma praga de gafanhotos que devastou tudo em seu caminho. As pessoas correram para Moisés implorando sua ajuda. Os gafanhotos partiram, mas os filhos de Israel continuaram escravizados. Em seguida veio uma praga de piolhos, espalhando doença entre as pessoas, seguida de uma praga de sapos que assustavam e aterrorizavam as pessoas em suas casas e camas. Cada vez que as punições de Deus desciam, o povo implorava a Moisés que suplicasse a Deus por alívio e, a cada vez, prometiam libertar os filhos de Israel escravizados. Entretanto, não mantinham a promessa.
O sinal final da ira de Deus foi revelado e a água do rio Nilo se transformou em sangue. Para os filhos de Israel a água permaneceu pura e clara, mas para todos os outros parecia sangue espesso e vermelho. Mesmo após essa série de sinais devastadores do desagrado de Deus, os filhos de Israel continuaram escravizados.
“Já havíamos castigado o povo do Faraó com os anos (de seca) e a diminuição dos frutos, para que meditassem.
Porém, quando lhes chegava a prosperidade, diziam: Isto é por nós! Por outra, quando lhes ocorria uma desgraça, atribuíram-na ao mau augúrio de Moisés e daqueles que com ele estavam. Qual! Em verdade, o seu mau augúrio está com Deus. Porém, a sua maioria o ignora.
Disseram-lhe: Seja qual for o sinal que nos apresentares para fascinar-nos, jamais em ti creremos.
Então lhes enviamos as inundações, os gafanhotos, as lêndeas, os sapos e o sangue, como sinais evidentes; porém, ensoberbeceram-se, porque eram pecadores.
Mas quando vos açoitou o castigo, disseram: Ó Moisés, implora por nós, de teu Senhor, o que te prometeu; pois, se nos livrares do castigo, creremos em ti e deixaremos partir contigo os israelitas.
Porém, quando os livramos do castigo, adiando-o para o término prefixado, eis que perjuram!
Então, punimo-los, e os afogamos no mar por haverem desmentido e negligenciado os Nossos versículos.” (Alcorão 7:130-136)
O faraó e a maioria das pessoas do Egito se recusam a acreditar nos sinais. Repetidamente Deus enviou Suas punições e o povo apelou a Moisés, prometendo adorar somente a Deus e libertar os filhos de Israel, ma seguidamente quebraram suas promessas. Finalmente Deus retirou Sua misericórdia e deu ordem a Moisés para liderar seu povo para fora do Egito.
“Porém, quando os livramos do castigo, adiando-o para o término prefixado, eis que perjuram! Então, punimo-los, e os afogamos no mar por haverem desmentido e negligenciado os Nossos versículos.” (Alcorão 7:130-136)
Os espiões do faraó sabiam imediatamente que algo importante estava acontecendo e o faraó marcou uma reunião com seus conselheiros mais confiáveis. Decidiram reunir um exército inteiro para perseguir os escravos fugidos. Reunir o exército levou a noite toda e o exército do faraó não deixou os confins da cidade até a alvorada.
Marcharam para o deserto. Logo os filhos de Israel puderam olhar para trás e ver ao longe a poeira levantada pelo exército que se aproximava. E logo os que estavam nas primeiras fileiras dos filhos de Israel alcançaram o limite com o Mar Vermelho.
Os filhos de Israel estavam encurralados. À frente deles o Mar Vermelho e às suas costas um exército vingativo. Temor e pânico começaram a se espalhar entre eles. Apelaram a Moisés. Moisés estava caminhando na retaguarda de seu povo e podia ver o exército se aproximando cada vez mais. Abriu caminho entre as fileiras até o mar. Caminhou entre seu povo amenizando seus temores e lembrando-os de manter a fé e continuar a confiar que Deus não os abandonaria.
Moisés parou no limite do Mar Vermelho e olhou em direção ao horizonte. Ibn Kathir narra que Josué se voltou para Moisés e disse: “À nossa frente está uma barreira intransponível, o mar, e atrás de nós o inimigo. Não temos como escapar da morte!” Moisés não entrou em pânico; ficou de pé em silêncio e aguardou que Deus mantivesse Sua promessa de libertar os filhos de Israel.
Naquele momento, como o pânico tomava conta dos filhos de Israel, Deus inspirou Moisés a bater no mar com seu cajado. Ele fez o que lhe foi ordenado. Um forte vento começou a soprar, o mar começou a entrar em redemoinho e girar e, repentinamente, se partiu para revelar uma passagem; o fundo do mar ficou seco o suficiente para as pessoas caminharem através dele, cruzando-o.
Moisés começou a orientar o povo através do corredor seco no meio do mar. Aguardou até que a última pessoa começasse a cruzar o mar antes de se voltar para olhar o exército que se aproximava e, então, seguiu seu povo através do leito do mar. Quando alcançaram o outro lado, o pânico e o temor começaram a tomar conta dos filhos de Israel. Mais uma vez começaram a implorar a Moisés que fechasse o corredor. Moisés se recusou, com o plano de Deus já em andamento, e estava confiante de que os filhos de Israel se safariam mesmo que o exército do faraó os seguissem pelo corredor seco formado no leito do mar.
“E fizemos atravessar o mar os israelitas; porém o Faraó e seu exército perseguiram-no iníqua e hostilmente até que, estando a ponto de afogar-se, o Faraó disse: Creio agora que não há mais divindade além de Deus em que crêem os israelitas, e sou um dos submissos!
(E foi-lhe dito): Agora crês, ao passo que antes te havias rebelado e eras um dos corruptores! Porém, hoje salvamos apenas o teu corpo, para que sirvas de exemplo à tua posteridade. Em verdade, há muitos humanos que estão negligenciando os Nossos versículos.” (Alcorão 10:90-92)
Ibn Kathir descreve a morte do faraó: “A cortina caiu sobre a tirania do faraó e as ondas jogaram seu corpo na direção da costa ocidental. Os egípcios o viram e souberam que o deus a quem adoraram e obedeceram era um mero homem que não pode livrar seu pescoço da morte. Quando o faraó tinha poder, fortuna, boa saúde e força, eles se recusaram a reconhecer Deus, mas quando ele viu a morte se aproximando suplicou a Deus com temor e horror. Se a humanidade se lembra de Deus em tempos de facilidade, Deus lembrará até do mais vil dos seres humanos em tempos de aflição.
Gerações de opressão tinham deixado uma marca indelével sobre os filhos de Israel. Anos de humilhação e medo constante os tinham deixado ignorantes e obstinados. A maioria deles tinha sido privada de confortos e luxos por todas as suas vidas. Ansiavam por qualquer coisa que fosse um sinal de fortuna ou materialismo. Os filhos de Israel acreditavam em Deus, tinham acabado de testemunhar os milagres e sinais mais surpreendentes do poder de Deus, mas ainda assim cobiçavam um ídolo que viram em sua jornada para fora do Egito.
“Fizemos os israelitas atravessar o mar, e eis que encontrando (depois) um povo devotado a alguns de seus ídolos, disseram: Ó Moisés, faze-nos um deus como os seus deuses! Respondeu-lhes: Sois um povo de insipientes!
Porque em verdade, tudo quanto eles adorarem aniquilá-los-á, e em vão será tudo quanto fizerem. Disse: Como poderia apresentar-nos outra divindade além de Deus, uma vez que vos preferiu aos vossos contemporâneos?
Recordai-vos de quando vos livramos do povo do Faraó que vos infligia os piores castigos, sacrificando os vossos filhos e deixando com vida as vossas mulheres; naquilo tivestes uma grande prova do vosso Senhor!” (Alcorão 7: 138-141)
Deus tinha favorecido os filhos de Israel. Foram liderados em segurança para fora do Egito e testemunharam o afogamento de seu cruel governante, o faraó. Quando precisaram de água
Deus ordenou Moisés a bater em uma rocha, que jorrou doze fontes de água para as doze diferentes tribos, de modo que não houvesse disputa. Deus também enviou nuvens para protegê-los do sol escaldante e para aliviar sua fome, Ele enviou um alimento especial delicioso chamado maná e codornizes. Infelizmente, apesar da generosidade de Deus muitos dos filhos de Israel reclamavam e queriam o alimento que costumavam comer no Egito: cebolas, alho, feijões e lentilhas.
Moisés alertou seu povo e lembrou-os de que tinham acabado de deixar uma vida de degradação e humilhação. Perguntou por que lamentavam pelas piores dádivas quando Deus os estava provendo com o melhor. Moisés disse: “Quereis trocar o melhor pelo pior? Pois bem: Voltai para o Egito, onde tereis o que implorais!” (Alcorão 2:61) Deus estava provendo dádivas e facilitando a vida para os filhos de Israel, enquanto se dirigiam para a terra prometida, mas eram um povo subjugado, incapaz de se afastarem de pecado e corrupção.
Partiram sob a escuridão da noite e carregando seus escassos bens, cruzaram o deserto em direção ao Mar Vermelho. Quando alcançaram o mar, o exército do faraó os perseguia de perto e o povo de Moisés podia ver a poeira levantada pelo exército que se aproximava. Olharam para o mar à frente e se sentiram encurralados. Pela vontade e permissão de Deus, Moisés bateu no mar com seu cajado e o mar se partiu, revelando um caminho. Os filhos de Israel cruzaram o leito do mar. Quando a última pessoa tinha cruzado a salvo, o mar voltou ao seu lugar e afogou o exército do Egito, incluindo o tirânico faraó.
Os filhos de Israel foram um povo oprimido e humilhado por um longo período. Várias gerações tinham vivido sob o jugo do faraó. Tinham se tornado um povo beligerante. Sempre esperavam o pior. Sempre ansiando por uma fatia das coisas boas desse mundo. Seus sensos de honra e autoconfiança tinham se erodido. Durante sua jornada para fora do Egito até a terra prometida, houve grande oportunidade para suas falhas de caráter se tornarem óbvias. Os filhos de Israel eram ingratos a Deus, apesar de Seu cuidado e atenção com eles. Eram incapazes de se comportar de forma submissa e aceitar a vontade de Deus.
Quando os filhos de Israel encontraram um povo que adorava ídolos, sua ânsia em ser como aquele povo que parecia feliz se manifestou e pediram a Moisés permissão para terem um ídolo, esquecendo completamente os milagres de Deus que tinham acabado de testemunhar. Quando Deus os proveu com alimento delicioso que até então era desconhecido para eles, reclamaram, querendo o alimento inferior ao qual estavam acostumados. Quando Moisés os orientou a marcharem para uma cidade e derrubarem os cananitas eles se recusaram, em maior parte por medo e, assim, desobedeceram ao comando de Deus. Ibn Kathir narra que Moisés foi capaz de encontrar somente dois homens dispostos a lutar.
“(Moisés) disse: Ó Senhor meu, somente posso ter controle sobre mim e sobre o meu irmão. Separa-nos, pois, dos depravados. Então (Deus) lhe disse: Está-lhes-á proibida a entrada (na terra Sagrada). Durante quarenta anos andarão errantes, pela terra. Não te mortifiques pela gente depravada.” (Alcorão 5:25-26)
Os “dias de perambulação” começaram. Cada dia era como o dia anterior. As pessoas viajavam sem nenhum destino em mente. Finalmente entraram no Sinai; Moisés o reconheceu como o lugar onde tinha falado com Deus antes de sua grande jornada no Egito ter começado. Deus ordenou a Moisés jejuar, como purificação, por quarenta dias e então acrescentou mais dez dias. Depois de o jejum ter sido concluído, Moisés estava pronto mais uma vez para se comunicar com Deus.
“Ordenamos a Moisés trinta noites (de solidão), as quais aumentamos de outras dez, de maneira que o tempo fixado por seu Senhor foi, no total, de quarenta noites. E Moisés disse ao seu irmão Aarão: Substitui-me, ante meu povo; age de modo correto e não sigas a senda dos depravados. E quando Moisés chegou ao lugar que lhe foi designado, o seu Senhor lhe falou, orou assim: ó Senhor meu, permite-me que Te contemple! Respondeu-lhe: Nunca poderás ver-Me! Porém, olha o monte e, se ele permanecer em seu lugar, então Me verás! Porém, quando a majestade do seu Senhor resplandeceu sobre o Monte, este se reduziu a pé e Moisés caiu esvanecido. E quando voltou a si, disse: Glorificado sejas! Volto a Ti contrito, e sou o primeiro dos crentes! Disse-lhe: Ó Moisés, tenho-te preferido aos (outros) homens, revelando-te as Minhas mensagens e as Minhas palavras! Recebe, pois, o que te tenho concedido, e sê um dos agradecidos!” (Alcorão 7:142-144)
Deus deu a Moisés duas tabuletas de pedra, sobre as quais estavam os Dez Mandamentos. Esses mandamentos formam a base da lei judaica, o Torá, e são os padrões de moralidade ainda estabelecidos pelas igrejas cristãs. Ibn Kathir e os primeiros sábios do Islã afirma que os Dez Mandamentos são reiterados em dois versículos do Alcorão.
“Dize (ainda mais): Vinde, para que eu vos prescreva o que vosso Senhor vos vedou: Não Lhe atribuais parceiros; tratai com benevolência vossos pais; não sejais filicidas, por temor á miséria- Nós vos sustentaremos, tão bem quanto aos vossos filhos -; não vos aproximeis das obscenidades, tanto pública, como privadamente, e não mateis, senão legitimamente, o que Deus proibiu matar. Eis o que Ele vos prescreve, para que raciocineis. Não disponhais do patrimônio do órfão senão da melhor forma possível, até que chegue á puberdade; sede leais na medida e no peso- jamais destinamos a ninguém carga maios á que pode suportar. Quando sentenciardes, sede justos, ainda que se trate de um parente carnal, e cumpri os vossos compromissos para com Deus. Eis aqui o que Ele vos prescreve, para que mediteis.” (Alcorão 6:151-152)
Moisés tinha estado ausente para quarenta dias. Seu povo tinha se tornado impaciente e eram como crianças, reclamando e agindo de forma impulsiva. Ibn Kathir descreve sua queda no pecado imperdoável da idolatria. “As-Samiri, um homem que era inclinado ao mal, sugeriu que encontrassem um novo guia, já que Moisés tinha quebrado sua promessa.” Disse a eles: “Para encontrar orientação verdadeira, é necessário um deus e eu fornecerei um a vocês.” Então, coletou todas as joias de ouro deles e as derreteu. Durante a fundição jogou um punhado de pó, agindo como um mago para impressionar os ignorantes. Do metal fundido, ele esculpiu um bezerro de ouro. Era oco e quando o vento passava através dele, produzia um som.”
Era como se tivessem tido sucesso em fazerem um deus vivo. O irmão de Moisés, Aarão, tinha ficado com medo de enfrentar o povo, mas quando viu o ídolo percebeu que grave pecado estava sendo cometido, ele se manifestou. Lembrou ao povo para adorar somente a Deus e alertou-os das graves consequências de suas ações, tanto de Moisés em seu retorno quando do próprio Deus. Aqueles que permanecerem fiéis à crença no Deus Único se separaram dos idólatras. Quando Moisés retornou ao seu povo os viu cantando e dançando ao redor do bezerro de ouro. Estava furioso.
Moisés não pode acreditar no que via, apesar de Deus tê-lo avisado de que uma punição severa estava prestes a recair sobre seu povo por adorarem o bezerro de ouro. O coração de Moisés ficou cheio de vergonha e raiva. Seu próprio povo tinha testemunhado o poder e majestade de Deus e, ainda assim, agia beligerantemente e sem medo da punição de Deus.
“Disse-lhe (Deus): Em verdade, em tua ausência, quisemos tentar o teu povo, e o samaritano logrou desviá-los. Moisés, encolerizado e penalizado, retornou ao seu povo, dizendo: Ó povo meu, acaso vosso Senhor não vos fez uma digna promessa? Porventura o tempo vos pareceu demasiado longo? Ou quisestes que vos açoitasse a abominação do vosso Senhor, e por isso quebrastes a promessa que me fizestes?” (Alcorão 20:85-86)
Moisés se voltou para seu irmão Aarão; estava zangado e o agarrou pela barba, ao mesmo tempo puxou Aarão em sua direção pela cabeça. Gritou com seu irmão exigindo que explicasse por que desobedeceram as instruções que lhe tinha dado e como tinha permitido As Samiri enganar os filhos de Israel. Aarão explicou que o povo não o ouviu e estavam prestes a matá-lo. Apelou a Moisés para não deixar os idólatras separá-los. Aarão não era tão forte e vigoroso quanto seu irmão e temeu não ser capaz de controlar os filhos de Israel e, então, esperou o retorno de seu irmão Moisés.
A promessa de Deus é verdadeira e Sua punição foi rápida. Moisés confrontou As Samiri e o enviou para o exílio.
“Vai-te, pois! Estás condenado a dizer (isso) por toda vida: Não me toqueis! E terás um destino do qual nunca poderás fugir. Olha para o teu deus, ao qual estás entregue; prontamente o incineraremos e então lançaremos as suas cinzas ao mar.” (Alcorão 20:97)
A punição imposta aos idólatras foi severa.
“E de quando Moisés disse ao seu povo: Ó povo meu, por certo que vos condenastes, ao adorardes o bezerro. Voltai, portanto, contritos, penitenciando-vos para o vosso Criador, e imolai-vos mutuamente. Isso será preferível, aos olhos do vosso Criador. Ele vos absolverá, porque é o Remissório, o Misericordioso.” (Alcorão 2:54)
Deus é misericordioso e perdoador. Depois de os filhos de Israel terem se purificado e matado os idólatras entre eles, Deus aceitou seu arrependimento. Mesmo após sua beligerância e teimosia contínua, os filhos de Israel mais uma vez sentiram o favor de Deus sobre eles.
Moisés então escolheu 70 homens dentre os anciões mais devotos dos filhos de Israel. Voltou com eles ao Monte Tur. Era uma delegação que pretendia se desculpar a Deus por seu comportamento. Ficaram para trás enquanto Moisés entrou em uma nuvem baixa para falar com Deus. Quando retornou a eles, ao invés de estarem arrependidos os anciões informaram a Moisés que não o seguiriam até que vissem Deus com seus próprios olhos.
“Ó Moisés, não creremos em ti até que vejamos Deus claramente!” (Alcorão 2:55)
O solo tremeu e os setenta homens foram atingidos por um raio. Caíram ao chão mortos. Moisés ficou atônito. Imediatamente pensou o que diria aos filhos de Israel. Aqueles setenta homens eram os melhores do povo; Moisés sentiu que agora os filhos de Israel não tinham esperança. Voltou-se para Deus.
“Ó Senhor meu, quisesses Tu, tê-los-ias exterminado antes, juntamente comigo! Porventura nos exterminarias pelo que cometeram os néscios dentre nós? Isto não é mais do que uma prova Tua, com a qual desvias quem faz isso, e encaminhas quem Te apraz; Tu és nosso Protetor. Perdoa-nos e apieda-Te de nós, porque Tu és o mais equânime dos indulgentes! Concede-nos uma graça, tanto neste mundo como no outro, porque a Ti nos voltamos contritos. Disse: Com Meu castigo açoito quem quero e Minha clemência abrange tudo, e a concederei aos tementes (a Deus) que pagam o zakat, e crêem nos Nossos versículos.” (Alcorão 7: 155-157)
Deus de fato é misericordioso e Sua misericórdia abrange todas as coisas. Quando Moisés suplicou a Deus, Ele ressuscitou os setenta anciões mortos. Por muitos anos os filhos de Israel vagaram no deserto e terras estéreis. O profeta Moisés sofreu muito em suas mãos. Suportou motim, beligerância, ignorância e idolatria e até lhe infligiram dano pessoal. Sofreram puramente para agradar a Deus. Depois de muitos anos o profeta Aarão morreu e Moisés ficou sem seu grande apoiador. Permaneceu imperturbável; ainda assim continuou no deserto sem nunca alcançar a terra prometida. Moisés morreu, ainda cercado pelos beligerantes filhos de Israel. Cercado pelo povo que se recusou a ver os milagres perante seus olhos e, ainda assim, Deus em Sua misericórdia continuou a dar-lhes chances.
Das tradições do profeta Muhammad, que Deus o louve, vem o relato da morte do profeta Moisés. “O anjo da morte foi enviado a Moisés. Quando chegou, Moisés perfurou-o no olho. O anjo retornou ao seu Senhor e disse: ‘Tu me enviaste a um servo que não quer morrer.’ Deus disse: ‘Retorne a ele e diga para colocar a mão no lombo de um boi e para cada pelo que sair, lhe será concedido um ano de vida.’ Moisés disse: ‘Ó Senhor! O que acontecerá depois disso?’ Deus respondeu: ‘Depois, a morte.’ Moisés disse: ‘Deixe que venha agora!’ Moisés então pediu a Deus que lhe deixasse morrer perto da terra prometida, para que ficasse à distância do lance de uma pedra.
A condição humana está cheia de testes, tribulações e tremendas curvas de aprendizado. A vida é cheia de surpresas. Entretanto, lembrar-se de Deus e empenhar-se para agradá-Lo é a linha vital da humanidade. O Alcorão contém histórias inspirativas dos profetas e de homens e mulheres devotos. A vida de Moisés é discutida frequentemente e sua história nos ensina que Deus é misericordioso, confiável e generoso. Allah, o Perdoador, não nos deixou sozinhos; Ele nos proveu com Sua orientação e luz.
“Em suas histórias há um exemplo para os sensatos. É inconcebível que seja uma narrativa forjada, pois é a corroboração das anteriores, a elucidação de todas as coisas, orientação e misericórdia para os que crêem.” (Alcorão 12:111)
Através dessa série de artigos, aprendemos sobre a tremenda força de caráter de Moisés e sua habilidade de perseverar mesmo em circunstâncias terríveis. Moisés seguiu os mandamentos de Deus com valor e determinação e, além disso tudo, possuía um caráter de grande importância, o caráter de sinceridade. Moisés era sincero em todos os seus esforços. Não importa o que fizesse, agia com o propósito expresso de agradar a Deus. Quando a determinação é associada com sinceridade, o caráter de uma pessoa pode tornar-se extraordinário.
Durante os anos que os filhos de Israel vagaram pelo deserto incapazes de entrar na Terra Prometida, Moisés encontrou e passou tempo com Khidr. Um homem que a maioria dos sábios acredita que foi um profeta
Ibn Kathir narra que um dia alguém perguntou a Moisés: “Ó mensageiro de Deus, existe outro homem na terra mais erudito que tu?” Moisés respondeu: “Não!” Acreditando que como Deus tinha lhe permitido realizar milagres e lhe dado o Torá, com certeza devia ser o homem mais erudito vivo. Isso, entretanto, não era o caso. O encontro de Moisés com Khidr ensina a humanidade que nenhuma pessoa pode deter toda a informação disponível e que mesmo que pensemos que somos sábios e instruídos, a necessidade de buscar conhecimento nunca cessa. Quando Moisés soube da existência de Khidr, pediu para encontrá-lo.
Deus instruiu Moisés a pegar um peixe vivo em um contêiner. Quando o peixe desaparecesse, ele encontraria o homem que procurava. Moisés partiu em sua jornada, acompanhado por um rapaz que carregava o contêiner com o peixe. Chegaram a um lugar onde dois rios se encontravam e decidiram descansar. Instantaneamente Moisés caiu no sono. Enquanto estava dormindo, seu companheiro viu o peixe sair do recipiente para o rio e nadar para longe. Entretanto, esqueceu de avisar Moisés.
Quando Moisés acordou, continuaram sua jornada até que ficassem exaustos e com fome. Moisés pediu uma refeição. Só então seu companheiro lembrou-se de que o peixe tinha sumido. Ao ouvir isso, Moisés gritou: “Isso é exatamente o que estamos procurando!” Com pressa retraçaram seus passos até o local onde os rios se encontravam e onde o peixe tinha pulado.
Quando Moisés percebeu que tinham tomado a direção errada, imediatamente voltou. Não seguiu em frente na esperança de que pouparia tempo, mas reconheceu que seu caminho estava incorreto e mudou sua direção. Nessa vida muitos de nós escolhemos o caminho errado, mas ficamos com medo ou muito envergonhados de dar a volta e seguir em uma direção diferente. Existem grandes lições a serem tiradas das ações do profeta Moisés. Quando uma pessoa percebe que está indo na direção errada na vida, deve imediatamente dar a volta e seguir para a Senda Reta. Não deve considerar isso como uma derrota; ao contrário, é uma vitória.
Quando Moisés voltou para caminho certo, encontrou Khidr. Foi um encontro destinado a proporcionar conhecimento. Essa história momentosa do encontro de Moisés e Khidr é narrada no Alcorão no capítulo 18, A Caverna.
“E Moisés lhe disse: Posso seguir-te, para que me ensines a verdade que te foi revelada? Respondeu-lhe: Tu não serias capaz de ser paciente para estares comigo. Como poderias ser paciente em relação ao que não compreendes? Moisés disse: Se Deus quiser, achar-me-á paciente e não desobedecerei às tuas ordens. Respondeu-lhe: Então segue-me e não me perguntes nada, até que eu te faça menção disso. Então, ambos se puseram a andar, até embarcarem em um barco, que o desconhecido perfurou. Moisés lhe disse: perfuraste-o para afogar seus ocupantes? Sem dúvida que cometeste um ato insólito! Disse-lhe: Desculpa-me por me ter esquecido, mas não me imponhas uma condição demasiado difícil. E ambos se puseram a andar, até que encontraram um jovem, o qual (o companheiro de Moisés) matou. Disse-lhe então Moisés: Acabas de matar um inocente, sem que tenha causado morte a ninguém! Eis que cometeste uma ação inusitada. Retrucou-lhe: Não te disse que não poderás ser paciente comigo? Moisés lhe disse: Se da próxima vez voltar a perguntar algo, então não permitas que te acompanhe, e me desculpa. E ambos se puseram a andar, até que chegaram a uma cidade, onde pediram pousada aos seus moradores, os quais se negaram a hospedá-los. Nela, acharam um muro que estava a ponto de desmoronar e o desconhecido o restaurou. Moisés lhe disse então: Se quisesses, poderia exigir, recompensa por isso. Disse-lhe: Aqui nós nos separamos; porém, antes, inteirar-te-ei da interpretação, porque tu és demasiado impaciente para isso: Quanto ao barco, pertencia aos pobres pescadores do mar e achamos por bem avariá-lo, porque atrás dele vinha um rei que se apossava, pela força, de todas as embarcações. Quanto ao jovem, seus pais eram descrentes e temíamos que os induzisse à transgressão e à incredulidade. Quisemos que o seu Senhor os agraciasse, em troca, com outro puro e mais afetuoso. E quanto ao muro, pertencia a dois jovens órfãos da cidade, debaixo do qual havia um tesouro seu. Seu pai era virtuoso e teu Senhor tencionou que alcançassem a puberdade, para que pudessem tirar o seu tesouro. Isso é do beneplácito de teu Senhor. Não o fiz por minha própria vontade. Eis a explicação daquilo em relação ao qual não foste paciente.” (Alcorão 18: 66-82)
A história de Moisés e Khidr nos lembra que Deus é o Sapientíssimo. Porque para o frágil ser humano a vida pode conter grande alegria e gargalhadas, mas às vezes somos atingidos por tribulações, tragédias e calamidades que parecem não fazer sentido. Como crentes devemos acreditar que o que Deus decreta deriva de Sua sabedoria suprema e absoluta.