• 2 5
Quando tinha 20 anos, em algum momento da década de 30 do século
XIX, foi agarrado em uma pilhagem de Gobir e vendido para o sul, em
direção a Lagos. Semelhante era o caso de Mohammadu de Katsina, capturado
pelos apresadores Fulani enquanto trabalhava em suas terras. Ele
logo foi levado a Gobir e vendido a um comerciante de Damagaram, antes
de ser enviado para o sul, em direção a Rabba, Ilorin, e finalmente para o
litoral, provavelmente para Lagos.46
O Sargento Frazer, que em 1821 servia no Segundo Regimento das
Índias Ocidentais em Serra Leoa, havia nascido na Hauçalândia “e por lá
residiu muito tempo, [antes de ser] aprisionado em Goingia [Gonja] e trazido
à Costa de Ouro, onde foi vendido”. Frazer havia sido um comerciante
que chegara a negociar em Borno.47 Ali Eisami foi agarrado durante a
jihad em Borno, transportado através do Califado de Sokoto e vendido em
Katunga (o nome Hauçá da capital de Oyo), mas seu senhor o revendeu à
costa em 1817, pois temia que seu escravo pudesse estar envolvido na insurreição
de escravos muçulmanos contra Oyo, naquele ano.48 Um dos
informantes de De Castelnau era Boué [Bawa?], vindo de Zaria, talvez na
década de 30 do século XIX ou mesmo nos anos 40. Ele logo foi levado ao
país Achanti, onde foi vendido a traficantes “europeus” (provavelmente portugueses).
De Castelnau relata que a maioria dos cativos Hauçás alcançaram
o litoral em Lagos, e não na Costa do Ouro, o que sugere que Boué
encontrou seu caminho de volta através de Whydah ou de outro porto da
Baía de Benin.49
Os seis escravos entrevistados por Menezes de Drumond, em 1819,
tinham vindo de Nupe ou da Hauçalândia, mas todos haviam sido aprisionados
durante a jihad e chegaram à costa em Lagos (“Ico”). François era de
Kano; Mathieu de Daura; Joseph de Tabarau, em Nupe; Bernard de Gobir;
Benoit de Gaya [Ghuiah]; e Boniface de Kebbi.50 A época da deportação
indica que eles eram prisioneiros da jihad e, embora nem todos pudessem
ser muçulmanos, é provável que o fossem, ao menos superficialmente.
Como Clapperton informou de Wawa (Borgu) em 1826,
os escravos vendidos à costa são geralmente prisioneiros de guerra ou cativos
domésticos rebeldes e intratáveis. Nyffé é, no momento, o lugar que
produz a maioria destes escravos, devido à guerra civil que devasta o país.
2 6 • TO P O I
A guerra era a jihad, que redundava na derrocada da velha aristocracia
local e no estabelecimento de um governo islâmico sob controle do Califado
de Sokoto.51 Abali, que nasceu em Kanem, foi capturado durante uma
invasão de Borno a Kano, onde foi vendido para o sul (Lagos) em 1844.52
Outro escravo, nascido em Kano, foi capturado em uma pilhagem em
Gobir, “onde foi adquirido por traficantes e imediatamente levado para a
costa através de Kadzina [Katsina], Zalia [Zaria], Nupe, Ilori [Ilorin], Dsebu
[Ijebu], e Eko [Lagos]”, também em 1844.53 Do mesmo modo, Mohammadu
(Jacob Brown) foi seqüestrado enquanto arava suas terras e logo
vendido a Damagaram para, ao final, alcançar a costa através de Rabba e
Ilorin, chegando em Serra Leoa em 1844.54
Se minhas estimativas do volume, idade e composição sexual da população
escrava exportada forem razoavelmente precisas, talvez se possa
concluir que o número de escravos adultos de sexo masculino disponíveis
no Califado de Sokoto girava ao redor de 3 mil a 4 mil por ano durante a
década de 20 do século XIX (não incluindo aí os Iorubas). A minoria destes
ficava ali retida para emprego doméstico, mas a maioria era vendida para
o sul e sudoeste. Alguns dos homens adultos exportados escaparam, morreram
ou foram vendidos ao longo da rota, e outros foram mantidos no
país Achanti, no Daomé e em estados Iorubas meridionais. Igualmente,
foram retidas algumas mulheres e crianças exportadas também para o sul.
A filiação religiosa da população deportada
Os nomes constantes da amostragem que venho analisando oferecem
uma indicação inicial acerca da filiação religiosa dos homens centro-sudaneses
exportados. Dos 117 escravos, 41 ou bem possuíam nomes muçulmanos
ou é quase certo que o fossem (cf. tabela 3). Doze cativos seguramente
eram islâmicos, e quatro talvez, conclusão a que se chega através das
declarações de naturalidade. Trinta e sete cativos eram chamados por nomes
cristãos e africanos, e não apresentavam indicação de serem, ou terem
sido, muçulmanos. Apenas cinco tinham nomes cristãos, e três eram nomeados
a partir de designações certamente africanas e não islâmicas.
• 2 7
Tabela 3:
Identificação religiosa dos escravos exportados do Sudão
Central para a Costa da Guiné, 1805-1850
NOMES DOS ESCRAVOS NÚMERO PORCENTAGEM
Muçulmanos 41 40
Seguramente muçulmanos 12 12
Talvez muçulmanos 4 4
Cristãos e africanos não-muçulmanos 37 36
Somente africanos 3 3
Somente cristãos 5 5
Sub-total 102 100
Sem indicação 15
Total 117
Fonte: Apêndice.
Embora não se saiba, dentre os escravos com nomes africanos nãomuçulmanos,
quantos de fato eram islâmicos; nem quantos, entre detentores
de nomes africanos e cristãos, também o fossem, é razoável concluir
que pelo menos 56% dos centro-sudaneses eram islamizados. É possível
que tal porcentagem fosse ainda mais alta.
Apesar desta análise de filiação religiosa de escravos e libertos centrosudaneses
ser apenas preliminar, parece que o processo de conversão no
Sudão Central, resultante da jihad, tinha continuidade na Bahia. Nomes
muçulmanos eram adscritos a escravos de origem não-muçulmana, como
“Keuta” [Kyauta], “So-Allah” [Filho de Alá] e “Meidassara” [Mai Nasara],
indicando que alguns cativos haviam recebido rudimentos doutrinários
islâmicos, normalmente oferecidos por ocasião da captura e venda. Os
nomes africanos não islâmicos na origem incluíam escravos que claramente
eram de origem Ioruba ou Nupe, sendo plausível que alguns deles fossem
muçulmanos.
Entre os escravos e libertos arrolados por seu envolvimento na revolta
Malê estavam vários clérigos muçulmanos (Hauçá: malam). Antônio, por
exemplo, de origem Hauçá, freqüentara uma escola corânica antes de ser
2 8 • TO P O I
capturado.55 Reis realizou o estudo mais completo acerca destes religiosos,
e Nina Rodrigues coletou informações sobre o imam que parece ter encabeçado
a revolta. Samuel Crowther, que estava em Badagri em 1845, conheceu
dois ex-escravos Hauçás do Brasil. Um deles, Mohama, era um
malam, e travou com Crowther uma longa discussão teológica.56 O cônsul
francês em Salvador, Castelnau, entrevistou um velho Fulani na Bahia, em
1848, que certamente era um malam:
Este velho homem, Mohammed-Abdullad, Filani, que esteve na Bahia por
cerca de trinta anos, obteve a liberdade através de seu próprio trabalho, e é
hoje um carpinteiro. É educado e não apenas sabe ler e escrever em sua língua,
mas também em português. Além disso, é muito intolerante, extremamente
fanático, e quer converter-me por todos os meios. Embora eu o tratasse
muito bem, dando-lhe dinheiro etc, ele recusou-se a ir à minha casa,
dizendo para outro negro que não gostaria de adentrar a casa de um cão cristão.
Ele aparentava ter setenta anos, era um marabout e tinha feito a peregrinação
a Meca.... Fazia muitas piadas sobre Hauçás, dizendo que eles cultivam
cavanhaque para parecerem homens. Originário de Kano, foi capturado
em Katchina [Katsina] por Hauçás, contra quem os Filanis estavam em
guerra naquele momento. Veio para a costa através da rota de [Lagos].... Os
negros Hauçás da minha casa parecem ter muito respeito por este homem e,
seguindo o seu exemplo, começam a sussurrar os versos do Alcorão.57
Dentre os amuletos, textos árabes e outros documentos capturados
depois da revolta de 1835, incluíam-se rascunhos de estudantes e também
trechos mais sofisticados do Alcorão.58 A presença de mesquitas e escolas
corânicas foi assinalada na ocasião por autoridades, e posteriormente analisadas
por numerosos pesquisadores. Como as atividades de clérigos muçulmanos
deixavam claro, a resistência através de formas religiosas foi diretamente
transferida da África para a Bahia na primeira metade do século
XIX. Nina Rodrigues concluiu, em 1900, que a violência centrada na ideologia
da jihad foi a base da resistência na Bahia.59
Jihad e Resistência na Bahia
O estudo das insurreições baianas entre 1807 e 1835 demonstra a
complexidade dos problemas relativos ao controle social dos escravos. A
• 2 9
resistência era inerente ao cativeiro, conforme reconheceu Eugene Genovese;
60 mas um modelo explicativo calcado somente na experiência da
Europa e da América do Norte por certo ensejará problemas. Como observou
Jack Goody, o caso da Bahia não se ajusta aos modelos de Genovese
sobre a resistência escrava nas Américas.61 As contradições internas ao cativeiro
permitiram aos escravos estabelecer as suas próprias comunidades,
mantendo um sentido de identidade como agentes culturais para, desse
modo, resistir às incursões da cultura senhorial em suas vidas. Fatores africanos
eram essenciais nesta busca de autonomia. Como afirmou John
Thornton, até mesmo as práticas cristãs que, de maneira sincrética, emergiram
na África, podiam ajudar a modelar as comunidades escravas das
Américas.62
O contexto histórico no qual grupos específicos de escravos foram
trazidos para as Américas tem que ser levado em consideração por qualquer
tentativa de compreender a evolução da cultura e da sociedade escravistas.
Dado ser geralmente difícil identificar as origens étnicas, religiosas
e culturais dos cativos, os historiadores de escravidão americana têm tido
dificuldades em avaliar o peso relativo da bagagem cultural que os escravos
trouxeram da África para o desenvolvimento de sua cultura. Em alguns
casos, porém, esta herança emerge com maior nitidez, como para a Bahia
do início do século XIX.
A evolução da identidade Malê refletia a influência da luta ideológica
e política na sociedade Hauçá em fins do século XVIII e inícios do seguinte.
Os Hauçás encontraram-se escravizados nas Américas como resultado
da convulsão política que precedeu a jihad no Sudão Central; e novos desembarques
depois da erupção da Guerra Santa, em 1804, reforçaram a
ligação entre a evolução da África e a da diáspora, não só no Brasil como
também em Serra Leoa. A identidade muçulmana emergiu como um laço
predominante a unir os Hauçás e, por extensão, os escravos vizinhos originários
de Borno e de Nupe. Pessoas de outras origens étnicas no Sudão
Central parecem ter sido absorvidas pela comunidade muçulmana, não
importando se eram ou não islamizados antes de deixar a África.
O afluxo de grandes quantidades de Iorubas muçulmanos desembarcados
juntamente com Iorubas não-islamizados, resultou em uma “ioru3
0 • TO P O I
bização” da comunidade islâmica. Ao contrário da íntima associação estabelecida
entre a identidade Hauçá e o islamismo, a correlação entre os
Iorubas e o Islã nunca foi total. Ao que parece, escravos e libertos Iorubas
às vezes se comportavam tendo por base o fundamento étnico propriamente
dito; em outras, respondiam como muçulmanos. Os mais ortodoxos tenderam
a ultrapassar a etnicidade, mas a adoração aos orixás permanecia forte,
com o culto ogboni sendo especialmente vigoroso. Embora muitos Iorubas
fossem muçulmanos, outros tantos não o eram, havendo ainda, em determinados
contextos, a possibilidade de estabelecerem-se laços de solidariedade
que tinham por base a identidade Ioruba e, portanto, a coalizão entre
os Iorubas islamizados e não-islamizados. Disto resultavam duas tradições
de revolta na Bahia — uma muçulmana e outra fundada nos orixás; a primeira
transétnica e a segunda étnica.63
O senhores baianos tiveram que contar com uma população cativa
(muçulmana ou não) importada da Baía de Benin, propensa à revolta e à
ação militar. Muitos destes escravos trouxeram consigo uma tradição militar
fundada na solidariedade religiosa e num compromisso com a Guerra
Santa. Outros, originários da mesma região, haviam sofrido, por um lado,
os efeitos do Islã militante e, por outro, os que derivavam do fracasso da
ação de não-muçulmanos e mesmo de islâmicos que se opunham à jihad.
Os escravos e alforriados engajados nas conspirações e insurreições, que
marcaram a escravidão baiana entre 1807 e 1835, procuravam forjar estratégias
de resistência capazes de permitir um retorno seguro à África, ou a
formação de comunidades autônomas no Brasil, ou ainda a própria superação
do regime escravista. Em 1835, tendo o Islã por base, eles se aproximaram
visando a destruição do sistema.
Na historiografia da escravidão, raramente foi possível correlacionar
as trajetórias das sociedades de onde se originavam os cativos com os regimes
escravistas americanos. No caso da Baía de Benin e da Bahia do século
XIX, é possível rastrear numerosos escravos, desde a sua captura na África
até a rebelião nas Américas; o caminho percorrido desde o Sudão Central
e a Iorubalândia até a Baía de Benin, e dali, através do Atlântico, até a Bahia,
onde suas ocupações, culturas e práticas religiosas são razoavelmente bem
conhecidas. Quando a herança da população escrava baiana é examinada
• 3 1
deste modo, as razões para a revolta e a habilidade para organizar a resistência
à escravidão tornam-se mais claras.
Os perfis étnicos, etários e de gênero da população exportada da Baía
de Benin ajudam a iluminar o debate sobre o papel da religião e da etnicidade
nas várias conspirações e insurreições da Bahia entre 1807 e 1835.64
Tais revoltas seguiram um padrão que sugere fortes semelhanças com a jihad
que se alastrava pelo Sudão Central no mesmo período. Em 1835 havia
uma bandeira, o uso de amuletos e de roupões muçulmanos brancos, a
identificação através de nomes também islâmicos e orações grupais conduzidas
por um imam. Fugas para os quilombos que rodeavam a cidade de
Salvador também devem ser observadas; elas são congruentes com a hijra,
embora não haja evidências de que os rebeldes percebiam os quilombos
desta maneira.65
A congruência entre fatores próprios da esfera da demanda e da oferta
criou uma situação explosiva: a demanda por homens adultos em idade
produtiva, aptos ao uso em duras tarefas foi satisfeita, mas a oferta de adultos
nestas condições, geralmente prisioneiros de guerra, freqüentemente
com treinamento e experiência militar, era perigosa, em especial quando
eles se encontravam unidos ao redor de uma ideologia baseada na militância
islâmica. Funcionários de governo e donos de escravos na Bahia debateram
as políticas mediante as quais melhor poderiam prevenir outra revolução
como a de Saint Domingue, sem reconhecer que a insurreição militar
de soldados escravos em Ilorin (em 1817), e o contínuo envolvimento
destes escravos na vida política de Oyo (na década de 1820) fornecia modelos
de ação muito mais factíveis do que o gerado em Saint Domingue. A
concentração de numerosos homens adultos levou a sociedade escravista
baiana ao limite da revolta, e o Islã ofereceu aos cativos meios de superar as
divisões étnicas. A jihad e as guerras a ela relacionadas constituíram uma
experiência histórica compartilhada pela maioria dos escravos centro-sudaneses
enviados para a Bahia, com a marcha forçada para a costa e a dura
travessia oceânica em direção a solo baiano servindo para unir pessoas que,
antes, poderiam até mesmo ter sido inimigas. O Islã alimentou a unidade
destes escravos, como aliás Nina Rodrigues já reconhecia em 1900.66
Em comparação com outras fontes de escravos no Golfo de Benin e
áreas adjacentes da costa da Guiné, o número total de escravos provenien3
2 • TO P O I
tes do interior e exportados através do Atlântico era relativamente pequeno.
Mas como esses escravos do Sudão Central eram em sua maioria jovens
do sexo masculino, alcançavam altos preços. Considerando o grande
encarecimento dos homens levados do interior para os mercados costeiros,
o tráfico deve ter sido muito lucrativo, o que sugere que pode ter havido
boas oportunidades para a obtenção de lucros adicionais.67 Tais ganhos
podiam realizar-se porque os “produtores” de escravos, a aristocracia
do Sudão Central, transformavam os cativos — obtidos por meio de incursões
e coleta de tributos, portanto, com custos atribuídos a outros objetivos
de natureza política — em mercadoria de primeira, com preço significativamente
mais alto na costa da Guiné do que no próprio Sudão
Central. Na verdade, muitos adultos do sexo masculino eram mortos durante
as incursões em vez de serem poupados para serem escravizados, uma
indicação de que o valor, no campo de batalha, dos cativos adultos do sexo
masculino era não apenas reduzido em relação ao preço local de jovens
mulheres, mas em muitos casos era muito baixo, ou pelo menos mais baixo
do que o custo adicional de preservar suas vidas.68
Por outro lado, os custos relativamente baixos dos homens adultos no
Sudão Central sugerem que a sua oferta excedia a demanda. O tráfico para
as Américas criou uma via de escoamento para este excedente de homens,
os quais, do contrário, poderiam ter sido executados. A alta proporção de
homens entre a população exportada do Sudão Central para o sul sugere
que os comerciantes do interior respondiam à demanda dos traficantes
europeus por cativos do sexo masculino. Este diferencial de preço era, por
certo, claramente compreendido no Sudão Central.69
A alta proporção de homens entre os escravos exportados do Sudão
Central para as Américas é ainda rara em vários sentidos. Ela é um traço
diferencial quando comparada ao tráfico transatlântico em geral. De uma
perspectiva centro-sudânica, a preferência dos entrepostos litorâneos do
Atlântico por homens contrasta fortemente com o comércio transaariano
de cativos, no qual as mulheres eram mais demandadas do que os homens,
exceção feita aos eunucos. O Sudão Central exportou tipos distintos de
escravos, homens adultos para o comércio atlântico e mulheres adultas e
castrati para o comércio transaariano. Ao menos no caso do Sudão CenJ
I H A D E A E S C R A V I D Ã O • 3 3
tral, parece que as demandas americana e norte-africana determinaram as
taxas de masculinidade da população exportada. Também está claro que os
comerciantes e funcionários centro-sudaneses, especialmente no Califado
de Sokoto, tomavam decisões que pesavam no direcionamento de mulheres
para o Norte da África, e de homens para as Américas. Neste caso, autoridades
políticas dos Estados Nupes, Oyo e Hauçá no século XVIII, e do
Califado de Sokoto no seguinte, procuraram deportar cativos masculinos
capturados nas guerras, os quais, do contrário, poderiam ter sido executados.
Por isso, por toda a costa da Baía de Benin podia-se encontrar escravos
homens de boa qualidade fundamentalmente em função do comércio
de reexportação do Sudão Central. O padrão de comércio demonstra uma
clara divisão sexual no seio da população exportada. É evidente, pois, que
os comerciantes no interior estavam extremamente atentos às diferentes
demandas dos mercados externos das Américas e da África do Norte. O
comércio de exportação de escravos do Sudão Central é um bom exemplo
de um comércio determinado pela demanda, e não pela oferta.
Uma vez que se dissocie os dados relativos ao Sudão Central dos números
de exportados através da Baía de Benin, observar-se-á que os vendedores
de escravos daquela parte do litoral não foram capazes (ou não quiseram)
prover o mercado americano com homens de origem local, ao menos
na escala demandada pelas Américas. Escravos masculinos adultos centrosudaneses
eram facilmente vendidos, mas nunca em quantidades suficientes
para satisfazer os compradores europeus da costa e, por conseguinte,
como notou Inikori, “os comerciantes europeus foram compelidos, através
da competição entre eles, a comprar mais mulheres do que desejaram”,
apesar “da forte preferência por escravos masculinos”.70 Contudo, a população
centro-sudanesa exportada para as Américas conformava o setor que
mais se destacava na preferência dos compradores americanos. Os comerciantes
litorâneos e os funcionários aparentemente utilizavam a reexportação
do Sudão Central como meio de aumentar o componente masculino
dos escravos que eles possuíam para a venda. Eles vendiam mulheres e crianças
quando não havia homens suficientes, e estas mulheres e crianças quase
sempre eram Iorubas.
3 4 • TO P O I
Apêndice:
Padrões gerais dos escravos exportados do Sudão Central,
1805-1850
• 3 5
3 6 • TO P O I
Fontes:
(1) DRUMOND, Menezes de. “Lettres sur l’Afrique ancienne et moderne”. In:
Journal des Voyages, 32, 1826, pp. 205-16.
(2) CASTELNAU, Francis de. Renseignements sur l’Afrique centrale et sur une
nation d’hommes a queue qui s’y trouverait, d’apres le rapport des negres du
Soudan, esclaves a Bahia. Paris: P. Bertrand, 1851.
• 3 7
(3) KOELLE, Sigismund Wilhelm. Polyglotta Africana. Graz: Akademische Drucku.
Verlagsanstalt 1963, pp. 8-18.
(4) LANDER, Richard. Records of Captain Clapperton’s Last Expedition to
Africa. London: Colburn and Bentley, 1830, vol. I, pp. 204, 206.
(5) MISRAH, Muhammad. “Narrative of a Journey from Egypt to the Western Coast
of Africa, by Mahomed Misrah. Communicated by an Officer serving in Sierra Leone”.
In: The Quarterly Journal, October 1822, 6, pp. 15-16.
(6) ALLEN, William e THOMSON, T. R. H. A Narrative of the Expedition sent
by Her Majesty’s Government to the River Niger in 1841, under the Command
of Captain H.D. Trotter, R.N. London: Bentley, 1848, vol. I, pp. 79, 252 e 330; e
vol. II, pp. 117-18 e 184.
(7) DUNCAN, John. Travels in Western Africa, in 1845 and 1846. London:Bentley,
1847, vol. II, p. 175.
(8) VERGER, Pierre. Trade Relations between the Bight of Benin and Bahia from
the 17th to the 19th Century. Ibadan: University of Ibadan Press, 1976, p. 434.
Notas
1 Cf., por exemplo, dentre os trabalhos de Pierre Verger, especialmente Trade Relations
between the Bight of Benin and Bahia from the 17th to the 19th Century. Ibadan: University
of Ibadan Press, 1976; REIS, João. Slave Rebellion in Brazil: The Muslim Uprising of 1835
in Bahia. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1993; SCHWARTZ, Stuart. Sugar
Plantations in the Formation of Brazilian Society: Bahia, 1550-1835. Cambridge:
Cambridge University Press, 1985; MATTOSO, Kátia de Queirós. Bahia Século XIX: Uma
Província no Império Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1992; OLIVEIRA, Maria Inês Côrtes
de. Retrouver une identité: Jeux sociaux des Africains de Bahia: (vers 1750 — vers 1890).
Tese de doutorado, Université de Paris-Sorbonne (Paris IV), 1992; NISHIDA, Mieko.
“Manumission and Ethnicity in Urban Slavery: Salvador, Brazil, 1808-1888”. In: Hispanic
American Historical Review, 73:3, 1993, pp. 361-91.
2 Cf., dentre meus estudos anteriores, “Background to Rebellion: The Origins of Muslim
Slaves in Bahia”. In: Slavery and Abolition, 15, 2, 1994, pp. 151-82; e “The Central Sudan
and the Atlantic Slave Trade”. In: HARMS, Robert W. et al. Paths toward the Past: African
Historical Essays in Honor of Jan Vansina. Atlanta: African Studies Association Press, 1994,
pp. 345-70. A amostragem preliminar foi completada com outros dez casos; todavia, na
amostra anterior um indivíduo foi contado duas vezes, e este erro, alertado por Robin
Law, foi corrigido. Observe-se ainda que a presente amostragem será completada com
biografias adicionais, baseadas em fontes brasileiras, especialmente baianas. Uma pesquisa
inicial dos registros judiciais gerados pela insurreição de 1835 na Bahia oferece maior
detalhamento sobre as origens dos indivíduos, embora se espere que levantamentos
arquivísticos adicionais esclareçam melhor a questão. Sou grato a Marcia Smith pelo exame
dos registros judiciários publicados (veja-se “The Male Uprising in Bahia, 1835: Mini3
8 • TO P O I
Biographies of Leaders and Others Accused”, 1998 (paper inédito, seminário na York
University).
3 No caso das pessoas que acabaram em Serra Leoa, suas biografias derivam de entrevistas
feitas por d’Andrada, um antigo ministro do governo brasileiro, autor de um ensaio sobre
a geografia de Portugal (1819), conforme o que foi reportado por Menezes de Drumond
(7 casos); do material coletado pelos membros da Expedição ao Níger em 1841 (6 casos);
as narrativas de escravos coletadas por Francis de Castelnau, cônsul francês na Bahia, em
fins da década de 1840 (23 casos); o inventário linguístico realizado por Sigismund Wilhelm
Koelle em 1850, com ex-escravos (66 casos); além do material derivado de diversas outras
fontes (15 casos). Cf. as indicações de fontes no apêndice em anexo.
4 LOVEJOY, Paul E. “The Clapperton-Bello Exchange: The Sokoto Jihad and the Trans-
Atlantic Slave Trade, 1804-1837”. In: WILLEY, A. Elizabeth e WISE, Christopher (eds.).
The Desert Shore: Literatures of the African Sahel. Boulder Col.: Lynn Reiner, 2000. Cf. tb.
FISHER, Humphrey. “A Muslim Wilberforce? The Sokoto Jihad as Anti-Slavery Crusade:
An Enquiry into Historical Causes”. In: DAGET, S. (ed.). De la traite à l’esclavage du Ve
au XIXeme siecle. Nantes:Centre de Recherche sur l’Histoire du Monde Atlantique, 1985,
vol. II, pp. 537-55.
5 LOVEJOY, ““The Central Sudan...”, op. cit., pp. 351-55. Cf. tb. ELTIS, David;
RICHARDSON, David; BEHRENDT, Steven e KLEIN, Herbert. The Atlantic Slave
Trade: A Database in CD-Rom. Cambridge:Cambridge University Press, 1999.
6 KOLAPO, James Femi. Military Turbulence, Population Displacement and Commerce on
a Trading Frontier of the Sokoto Caliphate: Nupe c. 1810-1857. Tese de doutorado, York
University, 1999.
7 Patrick Manning, usando um método distinto, chegou a uma estimativa ao menos comparável,
concluindo que 93 mil escravos Hauçás e Nupes foram exportados da Baía de
Benin nos séculos XVIII e XIX. De acordo com suas projeções, tal movimento incluía 22
mil escravos Nupes entre a década de 1740 e a de 1860, e 70.800 Hauçás entre a década
de 1780s e a de 1860. Cf. o seu Slavery, Colonialism and Economic Growth in Dahomey,
1640-1960. Cambridge: Cambridge University Press, 1982, Apêndice 2. Observe-se que
Manning oferece totais ligeiramente menores para as exportações de Hauçás e Nupes na
página 31. Dado o não refinamento dos números e o fato de Manning não incluir escravos
não-Hauçás e não-Nupes, suas estimativas são bastantes próximas às minhas.
8 MANNING, Patrick. “The Slave Trade in the Bight of Benin, 1640-1890”. In:
GEMERY, Henry e HOGENDORN, Jan (eds.). The Uncommon Market: Essays in the
Economic History of the Atlantic Slave Trade. New York:Academic Press, 1979, p. 127.
9 LAW, Robin. The Oyo Empire c. 1600-c.1836. Oxford:Oxford University Press, 1977,
p. 217; e, do mesmo autor, “Slave-raiders and Middlemen, Monopolists and Free-traders:
the Supply of Slaves for the Atlantic Trade in Dahomey, c. 1715-1850”. In: Journal of
African History, 30, 1989, pp. 45-68.
• 3 9
10 Sobre Pierre Tamata, veja-se VERGER, op. cit., pp. 186-90. Cf. tb. ADAMS, John.
Remarks on the Country extending from Cape Palmas to the River Congo. London:G. and
W.B. Whittaker, 1823, pp. 82-87.
11 Adams, que comerciou ao longo da Costa de Guiné nas décadas de 1780 e 1790, notou
nunca haver encontrado escravos Hauçá ou outros quaisquer do Sudão Central em Bonny.
Ele confiou em sua experiência para erroneamente demonstrar que o Rio de Níger não
poderia desaguar no Golfo de Guiné. De acordo com o seu raciocínio, ele deveria ter achado
escravos do interior nos portos do Delta, tal como o fez em Lagos. Cf Cf. ADAMS, Remarks,
op. cit., pp. 220-2. De modo semelhante, não tenho conhecimento de qualquer registro
de escravos do Sudão Central que tenham sido embarcados na Costa do Ouro no século 18.
12 Conde da Ponte, Governador da Bahia, despacho de 16 de junho de 1807, conforme
citado em VERGER, op. cit., p. 17.
13 De acordo com Schwartz, os Iorubas, Ewes e Hauçás constituíam um terço da população
escrava da Bahia no início do século XIX em função das por então recentes importações
— cf. Sugar Plantations, op. cit., pp. 437, 475.
14 FO 84/9 e 15, como citado por ELTIS, David. Economic Growth and the Ending of the
Transatlantic Slave Trade. New York: Cambridge University Press, 1987, p. 358.
15 REIS, op. cit., p. 140. Os cativos e ex-escravos acusados de envolvimento na rebelião de
1835 eram predominantemente Iorubas e muçulmanos, não sendo, portanto, representativos
da população escrava e liberta como um todo.
16 KOELLE, Sigismund Wilhelm. Polyglotta Africana. Graz:Akademische Druck- u.
Verlagsanstalt 1963, pp. 1-21; HAIR, P. E. H. “Koelle at Freetown: an historical
introduction,” In: KOELLE, op. cit., pp. 7-17; HAIR, P. E. H. “The enslavement of
Koelle’s informants”. In: Journal of African History, VI, 1965, pp. 193-203. Os números
entre parênteses referem-se à população mencionada para cada grupo linguístico.
17 CURTIN, Philip D. The Atlantic Slave Trade: A Census. Madison:University of Wisconsin
Press, 1969, p. 244. Curtin, que compilou os censos a partir dos Parliamentary Papers,
1849 [C.1126], inclui escravos originários de Nupe na Baía de Benin e cativos Hauçás na
Baía de Biafra, embora seja muito provável que a maioria dos Hauçás transitassem por
portos da Baía de Benin, não na Baía de Biafra.
18 CURTIN, op. cit., pp. 244-49, 289-98. Cf. tb. CURTIN, Philip D. e VANSINA, Jan.
“Sources of the nineteenth-century Atlantic slave trade”. In: Journal of African History, V,
1964, pp. 185-208. Para ex-escravos Hauçás e Nupes de Serra Leoa cf. FYFE, Christopher.
A History of Sierra Leone. London: Oxford University Press, 1962, pp. 66, 138, 170, 231,
234, 424 (Hauçás), e 170, 231, 289, 293, 320 (Nupes).
19 SHIELDS, Francine. Palm Oil and Power: Women in an Era of Economic and Social
Transition in 19th Century Yorubaland (South-western Nigeria)”. Tese de doutorado, Stirling,
1997, pp. 296-303; da mesma autora, “Those Who Remained Behind: Women Slaves in
Nineteenth-Century Yorubaland”. In: Lovejoy, Paul E. (ed.), Identity in the Shadow of
Slavery. London:Cassell Academic, 2000; e KOLAPO, op. cit.,
4 0 • TO P O I
20 O’HEAR, Ann. Power Relations in Nigeria: Ilorin Slaves and their Successors. Rochester:
University of Rochester Press, 1997.
21 GEGGUS, David. “Sex Ratio, Age and Ethnicity in the Atlantic Slave Trade: Data from
the French Shipping and Plantation Records”. In: Journal of African History, 30, 1989, p. 36.
22 Idem, Ibidem. Geggus detecta 227 escravos “Aussa” com uma razão de masculinidade
da ordem de 1.521:100; e 60 “Gambari” (o termo ioruba para Hauçá) com uma razão de
1.900:100. Recalculei seus os números para estabelecer a porcentagem de homens centro-
sudaneses como um todo.
23 “Clapperton para R. Wilmot Horton, 6 de Junho de 1825”. In: BOVILL, E. W. (ed.).
Missions to the Niger, IV. The Bornu Mission, 1822-25, Part 3. London: Cambridge
University Press, 1966, vol. IV, p. 774.
24 CASTELNAU, Francis de. Renseignements sur l’Afrique centrale et sur une nation d’hommes
a queue qui s’y trouverait, d’apres le rapport des negres du Soudan, esclaves a Bahia. Paris:P.
Bertrand, 1851, p. 9. Eles “viennent a peu pres tous par la voie d’Onim [Lagos]”.
25 RICHARDSON, James. Narrative of a Mission to Central Africa performed in the Years
1850-51. London:Chapman and Hall, 1853, vol. II, p. 203.
26 TAMBO, David Carl. “The Sokoto Caliphate Slave Trade in the Nineteenth Century”.
In: International Journal of African Historical Studies, 9, 2, 1976, pp. 204-205. Entre outras
fontes, Tambo cita a correspondência de Davies para Campbell, de 31 de janeiro de 1858
(FO 541).
27 FYFE, op. cit., p. 212.
28 LOVEJOY, Paul E. “Concubinage in the Sokoto Caliphate (1804-1903)”. In: Slavery
and Abolition, XI, 1990, pp. 158-89.
29 ELTIS, David e ENGERMAN, Stanley. “Was the Slave Trade Dominated by Men?”.
In: Journal of Interdisciplinary History, 23, 1992, p. 255.
30 ELTIS, David. “Fluctuations in the Age and Sex Ratios of Slaves in the Nineteenth-
Century Transatlantic Slave Traffic”. In: Slavery and Abolition, 7, 1986, pp. 257-72; ELTIS
e ENGERMAN, “Was the..., op. cit., pp. 237-57; GEGGUS, op. cit., p. 28; LOVEJOY,
Paul E. “The Impact of the Atlantic Slave Trade on Africa: A Review of the Literature”,
Journal of African History, 30, 1989, p. 378.
31 ELTIS, Economic Growth, op. cit., p. 358.
32 Entre outras fontes, cf. LA TORRE, Joseph Raymond. Wealth Surpasses Everything: An
Economic History of Asante in the Nineteenth Century. Tese de doutorado, Universidade da
Califórnia, 1978. A análise de que La Torre faz dos registros de recrutamento holandeses
está calcada na associação entre “Marabu” e Hauçá — o que me parece uma suposição
razoável.
33 “B. Campbell para Clarendon, 27 de março de 1858”, como mencionado em ELTIS,
Economic Growth, op. cit., p. 358.
• 4 1
34 AGIRI, Babatunde. “Slavery in Yoruba Society in the 19th Century”. In: LOVEJOY,
Paul E. (ed.). The Ideology of Slavery in Africa. Beverly Hills:Sage Publications, 1981, pp.
141-2.
35 “Clapperton para Horton, 6 de junho de 1825”, cit. por BOVILL, op. cit., p. 774.
36 MANNING, Patrick. Slavery and African Life: Occidental, Oriental and African Slave
Trades. Cambridge: Cambridge University Press, 1990, p. 98.
37 Cf., por exemplo, MASON, Michael. “Population and ‘Slave Raiding’ — The Case of
the Middle Belt of Nigeria”. In: Journal of African History, 10, 4, 1969, pp. 551-64; e
HOGENDORN, Jan. “Slave Acquisition and Delivery in Precolonial Hausaland”. In:
DUMETT, R. e SCHWARTZ, Ben K. (eds.). West African Culture Dynamics:
Archaeological and Historical Perspectives. The Hague, 1980, pp. 477-93; cf. tb.,
BURNHAM, Philip. “Raiders and traders in Adamawa: slavery as a regional system”. In:
WATSON, James L. (ed.), Asian and African Systems of Slavery. Oxford:Oxford University
Press, 1980, pp. 43-72.
38 DUNCAN, John. Travels in Western Africa, in 1845 and 1846. London:Bentley, 1847,
vol. I, pp. 64, pp. 185-86.
39 Idem, vol. II, p. 175.
40 CLAPPERTON, Hugh. Journal of a Second Expedition into the Interior of Africa.
London:John Murray, 1829, p. 171.
41 Idem, p. 95.
42 MISRAH, Muhammad. “Narrative of a Journey from Egypt to the Western Coast of
Africa, by Mahomed Misrah. Communicated by an Officer serving in Sierra Leone”. In:
The Quarterly Journal, October 1822, 6, p. 14.
43 LANDER, Richard. Records of Captain Clapperton’s Last Expedition to Africa. London:
Colburn and Bentley, 1830, vol. I, pp. 204, 206.
44 Conforme informado por MISRAH, op. cit., p. 6.
45 KOELLE, op. cit., p. 19.
46 Idem, p. 17.
47 Conforme informado por MISRAH, op. cit., pp. 15-16.
48 Cf. a biografia Ali Eisami, que foi capturado durante a jihad em Borno, em CURTIN,
Philip D. (ed.), Africa Remembered: Narratives of West Africans from the Era of the Slave
Trade. Madison:University of Wisconsin Press, 1967, pp. 202, 211-12.
49 CASTELNAU, op. cit, p. 40.
50 DRUMOND, Menezes de. “Lettres sur l’Afrique ancienne et moderne”. In: Journal des
Voyages, 32, 1826, pp. 205-16.
51 CLAPPERTON, op. cit. p. 94.
52 KOELLE, op. cit., p.10.
53 Idem, p.17.
4 2 • TO P O I
54 Idem, Ibidem.
55 REIS, op. cit., pp. 102-103 (cf. tb. a versão ainda em formato tese, com título semelhante,
defendida na University of Minnesota em 1983, pp. 146-47).
56 Crowther, na abertura de seu diário, em 12 de junho de 1846, declara que ele e Townsend
foram para Badagri “to see the extension of Indian corn, beans, groundnuts, and cassava
belonging to the Hausa people. Since last month, I have visited many similar plantations.
All this cultivation began this year because when we arrived here [em meados de 1845]
there was no sign of cultivation anywhere in or around Badagri”; CMS, Yoruba Mission,
CA2/031(b). Cf. tb. ADAMU, Mahdi. The Hausa Factor in West African History. Zaria e
Ibadan, Ahmadu Bello University Press e Ibadan University Press, 1978, pp. 128, 132.
57 CASTELNAU, op. cit, p. 46. Cf. tb. VERGER, op. cit., p. 287.
58 Cf. GOODY, Jack. “Writing, Religion and Revolt in Bahia”. In: Visible Language, 20,
1986, pp. 318-43; MONTEIL, Vincent. “Analyse de 25 documents arabes des Males de
Bahia (1835)”. In: Bulletin de l’Institute Fondamaentale d’Afrique Noire, ser. B, 29, 1-2,
1967, pp. 88-98; e REICHERT, Rolf. “L’insurrection d’esclaves de 1835 a la lumiere des
documents arabes des archives publiques del’etat de Bahia (Bresil)”. In: Bulletin de l’Institute
Fondamaentale d’Afrique Noire, ser. B, 29, 1-2, 1967, pp. 99-104.
59.Raymundo Nina Rodrigues publicou sua análise preliminar acerca da importância do
Islam entre os escravos no Jornal do Commércio (Rio de Janeiro, 2 de Novembro de 1900);
cf. VERGER, op. cit., pp. 285-86. Para o trabalho completo cf. RODRIGUES, Raymundo
Nina. Os Africanos no Brasil. Brasília:Editora da Unb, 1988, baseado em notas coletadas
entre 1890 e o ano de sua morte (1906). Para uma crítica de Nina Rodrigues, cf. REIS,
op. cit., pp. 120-28.
60 GENOVESE, Eugene. From Rebellion to Revolution: Afro-American Slave Revolts in the
Making of the New World. Baton Rouge:Louisiana State University Press, 1979. Cf. tb.
CRATON, Michael. Testing the Chains: Resistance to Slavery in the British West Indies.
Ithaca:Cornell University Press, 1982.
61 GOODY, op. cit., p. 331.
62 THORNTON, John. Africa and Africans in the Making of the Atlantic World, 1400-
1680. Cambridge, Cambridge university Press, 1992.
63 Na década de 1820 ocorreram 10 rebeliões na Bahia e cinco em Sergipe de El-Rey, nas
quais cativos e ex-escravos Iorubas estiveram envolvidos (cf. SCHWARTZ, op. cit., pp.
486-87).
64 Cf., por exemplo, SCHWARTZ, Stuart. “Cantos e quilombos numa conspiração de
escravos hauçás — Bahia, 1814,” in REIS, João José e GOMES, Flavio dos Santos (eds.).
Liberdade por um Fio: Historia dos quilombos no Brasil. São Paulo:Companhia das Letras,
1996.
65 RODRIGUES, op. cit., passim. É difícil imaginar que os muçulmanos do Sudão Central
da época não pudessem perceber a resistência em termos de jihad, mas a questão está
longe de ser resolvida. REIS demonstra que a revolta de 1835, em particular, foi um leJ
I H A D E A E S C R A V I D Ã O • 4 3
vante muçulmano, mas sugere, por exemplo, que não se tratou de uma jihad (Cf. Slave
Rebellion, op. cit. passim). Para uma interpretação que em grande parte dissolve o fator
muçulmano cf. KENT, Raymond, “African Revolt in Bahia”. In: Journal of Social History,
3, 1970, pp. 334-56.
66 RODRIGUES, op. cit., passim; cf. tb. VERGER, op. cit.
67 Cf. LOVEJOY, Paul E. e RICHARDSON, David. “Competing Markets for Male and
Female Slaves: Slave Prices in the Interior of West Africa, 1780-1850”, In: International
Journal of African Historical Studies, 28,2, 1995, passim; MANNING, Slavery and African,
op. cit., pp. 65-6.
68 Segundo Dixon Denham, escrevendo de Borno em 26 de abril de 1822, as por então
recentes pilhagem tinham tido tanto êxito “that unable to keep all, they massacred the
men, being of the least value, and most troublesome” (cit. em BOVILL, op. cit., vol. III,
p. 553).
69 De acordo com informações recolhidas por Denham em Borno (1822), “at eight days’
distance only from Yeouri [Yauri, no Níger], large boats came to a place called Yearban
[Yoruba], but it is not on the bahr kebir. Katungah [Katunga, i.e., Oyo] is the great port,
which is at some distance: to both of these places people he called Americans came; they
were white, and Christians: they always demand gum arabic and male slaves, for which
they will pay as high as sixty to seventy dollars each”. Este relato é ainda mais valioso na
medida em que Denham não compreendia que o Níger fluía para o Golfo da Guiné e,
conseqüentemente, que havia uma rota fluvial direta do norte para o sul. Cf. DENHAM,
Dixon; CLAPPERTON, Hugh e OUDNEY, Walter. Narrative of Travels and Discoveries
in Northern and Central Africa, in the Years 1822, 1823, and 1824. London: John Murray,
1828, vol. II, pp. 91-2.
70 INIKORI, Joseph E. “Export versus domestic demand: the determinants of sex ratios
in the Transatlantic slave trade”. In: Research in Economic History, 14, 1992, p. 155.
Resumo
A CONFIGURAÇÃO ÉTNICA da população baiana modificou-se bastante de fins do século
XVIII para o século seguinte, quando povos islâmicos africanos tornaram-se comuns
entre os escravos, em especial a partir dos grandes desembarques de cativos de fala Ioruba.
As origens desses muçulmanos podem estar relacionadas ao contexto próprio das áreas
interioranas da Baía de Benin e à jihad do Xeque Usman dan Fodio, fundador do
Califado de Sokoto. Este estudo examina o material biográfico disponível, procurando
oferecer subsídios adicionais acerca da comunidade muçulmana para, assim, estabelecer
mais claramente as ligações entre os padrões de resistência à escravidão na Bahia,
que culminaram na insurreição Malê de 1835, e o movimento da jihad no interior
da Baía de Benin.
4 4 • TO P O I
Abstract
THE ORIGINS OF MUSLIM slaves in Bahia can be traced to the interior of the Bight of
Benin and the jihad of Sheikh Usman dan Fodio that established the Sokoto Caliphate.
As is well known, the ethnic configuration of the Bahian population changed
significantly in the last decades of the eighteenth century and continuing into the
nineteenth, as Hausa, Nupe, and other Muslims became more common among the
slaves, and most especially with the massive arrival of Yoruba-speaking slaves in the
nineteenth century. The present study examines available biographical material in an
attempt to shed additional light on the Muslim community and thereby establish more
clearly the links between the patterns of resistance to slavery in Bahia, culminating in
the Male uprising of 1835, with the jihad movement in the interior of the Bight of
Benin.